Exposição acontece em a partir desta segunda (21), na UCDB

Polêmicas à parte, o programa Mais Médicos, iniciativa do governo Federal criada em 2013 para fomentar o atendimento médico nas periferias brasileiras, é mais um capítulo da história brasileira que ajuda a superar as diferenças no acesso à uma saúde pública, gratuita e de qualidade. E por mais que alguns segmentos da sociedade apontem defeitos, quem realmente necessita do serviço viu-se em meio a uma grande transformação.

Foi este também o olhar do fotógrafo paulista Araquém Alcântara, que em cerca de um ano e meio percorreu 39 municípios em 20 Estados para documentar a chegada do programa nas áreas mais remotas do país. Celebridade de primeiro escalão entre os fotógrafos brasileiros, Alcântara dedicou a carreira profissional aos registros das belezas naturais brasileiras. É dele um dos livros de fotografia mais vendidos do país, TerraBrasil, com mais de 100 mil unidades. Também foi ele quem primeiro registrou todos os parques nacionais, do Oiapoque ao Chuí. E também foi ele quem lançou olhar humanizado na documentação do Mais Médicos em obra homônima (Editora TerraBrasil, 2016) que reúne fotos impressionantes e relatos idem.

O livro será apresentado em Campo Grande em ocasião especial, durante o 12º Congresso Internacional da Rede Unida, que reúne durante esta semana mais de 5 mil pessoas de todo o país para discutirem, dentre outros assuntos, a formação dos profissionais de saúde na perspectiva de um SUS (Sistema Único de Saúde) humanizado e multidisciplinar, conforme preconiza a legislação que o criou. E o fotógrafo surgem em meio à programação também com exposição inédita com as imagens e textos do livro.

‘Mais Médicos' – o livro e a exposição – casam bem com o tema do congresso, à propósito. 'Diferença sim, desigualdade não: pluralidade na invenção da vida' engloba também a discussão sobre os rumos do programa federal de peregrinação médica. E as imagens eternizadas por Alcântara funcionam como uma espécie de diagnóstico do que tem sido realizado Brasil a fora.

 

Etnografia humanista

Assim como ocorreu nos Estados Unidos na década de 1930, quando o governo estadunidense criou o ‘Farm Security Administration', uma entidade que documentaria e problematizaria a realidade agrária de um país imerso em uma depressão econômica, o trabalho de Araquém Alcântara também ajuda a documentar, no caso, o sucesso da iniciativa criada em 2013.

“Guardadas as devidas proporções, eu acho que é isso. É uma documentação etnográfica, de quem andou pelo país registrando a própria terra. A princípio, estava apenas registrando os resultados. Mas, em pouco tempo, eu estava completamente envolvido com as premissas desse programa que mudou um paradigma da saúde. Acabei fazendo um manifesto humanista, distribuído nas 260 páginas do livro”, explica o fotógrafo.

A ideia da documentação, inclusive, foi uma resposta ao incentivo do amigo Fausto Siqueira de Melo, médico que lhe sugeriu a ideia de desbravar o país clicando uma “revolução da saúde”. “A origem do meu trabalho em si é ligada a uma questão política, à preocupação de revelar essa identidade brasileira. Mas, até então eu fazia outro tipo de documentação, mais natural, mais paisagística. Comecei a me interessar por essa coisa do governo estar, apesar de toda a polêmica em torno, levando gente para lugares onde não tinha médico. Vi que era mais um ‘Brasil' que queria revelar, para além das belezas naturais, mas também essas transformações sociais”.

O médico cubano Fael Castelo Caballero abraça a parteira Josefa / Divulgação

 

Das histórias que o programa conta

Araquém Alcântara revelou ter ficado impressionado com o alcance do programa ‘Mais Médicos' e também com as histórias peculiares com as quais deparou-se. “É mais do que levar médico aonde não tinha, é ver esse pessoal transformar realidades. É por isso que o livro é um manifesto humanista, as fotos traduzem humanismo e fraternidade”, explica.

Como a história do médico cubano Fael Castelo Caballero, que Alcântara fez questão de destacar. “Ele é adepto da Santeria Cubana, que é uma religião semelhante ao candomblé, à umbanda. Em Poço Redondo, em Sergipe, ele conheceu uma parteira chamada Josefa, da umbanda. O que ele me contou é que ambos tiveram uma identificação espiritual muito forte e que a partir dessa sinergia prepararam um esquema em que fazem palestras, passes, reuniões de esclarecimento sexual e outros serviços àquela comunidade. Eles mudaram toda a visão da comunidade em relação à saúde e a prevenção. Ela estava sozinha e de repente teve um aliado. Isso é impressionante”, relata.

Com o mesmo entusiasmo, ele narra a experiência da também cubana Aymée Pérez Isidor, médica que foi atuar no distrito de Vista Alegre, em Igreja nova, Estado do Alagoas. “Essa médica chegou à comunidade e constatou que havia muitos casos de esquistossomose lá. Observando a dinâmica deles, que basicamente trabalham num arrozal, ela entendeu que a comunidade se contaminava pela água poluída nos canais de irrigação dos arrozais. O trabalho dela vai virar uma publicação científica depois dela praticamente erradicar a contaminação. Quer dizer, se o médico ficar com a bunda na cadeira, ele jamais vai descoberto disso. Essa proatividade me fascina”, conclui.

Serviço – Exposição Mais Médicos, de Araquém Alcântara. De 21 a 24 de março, no auditório do bloco A da UCDB. Gratuito.