Os cerca de 1,5 mil manifestantes que foram às ruas de São Paulo na tarde deste sábado para protestar contra a Copa do Mundo no Brasil planejaram marcar posição ainda no começo do ano, na expectativa de ganhar adesões quando o Mundial de futebol se aproximar e a imprensa internacional estiver no País. A Copa está prevista para começar em 12 de junho, no Itaquerão, com a partida entre Brasil e Croácia.

O evento, convocado pelo Facebook, tinha na manhã de sábado 24 mil confirmações de presença. Ainda que o número de manifestantes não tenha chegado a 10% disso, foi visto pelos organizadores como suficiente para a primeira manifestação de 2014. No fim de 2013, poucos protestos conseguiram juntar mais de 500 pessoas. Muitos trataram a passeata como um “rolezinho” contra a Copa. Durante o trajeto, cogitaram entrar no Theatro Municipal, que estava cheio por conta das festividades do aniversário de São Paulo, no shopping Luz e nas Casas Bahia, antigo Mappin. De acordo com o balanço final da Polícia Militar, o manifesto terminou com 128 pessoas detidas.

A confusão primeira confusão aconteceu na tentativa de depredar a lanchonete McDonald’s da rua Barão de Itapetininga. Essa mesma loja foi depredada durante as manifestações de junho, no dia 13 daquele mês, no ano passado.

Apesar do policiamento reforçado durante a primeira parte do trajeto, os Black Blocs conseguiram confundir a polícia ao se dividirem quando subiam a rua Augusta. Nesse momento, um grupo maior seguiu seguiu em direção à praça Roosevelt e foi acompanhado pela polícia. Foi quando a rua Augusta ficou praticamente sem policiamento.

Um pequenos grupo de policiais que estava próximo à esquina da rua Caio Prado foi literalmente colocado para correr pelos manifestantes, que avançaram em direção a eles. Dois minutos depois, cerca de dez viaturas da Força Tática da Polícia Militar chegou e começou a disparar bombas de efeito moral para dispersá-los.

Mas minutos antes, já havia começado a depredação. Uma agência do Banco Santander, uma concessionária da Fiat e a portaria de um prédio tiveram os vidros estilhaçados por pedras.

Na correria, muitos manifestantes tentaram se refugiar na recepção do hotel Linsen, que prontamente foi invadido por policiais. Sem saber diferenciar quem era quem, cerca de 30 manifestantes e hóspedes tiveram de se deitar de bruços e com as mãos para trás, o que provocou muita gritaria. Porém, após uma ordem de silêncio, ninguém mais se manifestou. Jornalistas e fotógrafos que registravam a cena foram prontamente retirados do local.

A artesã Vânia Aparecida Folco, que participava da manifestação, foi uma das que foi retirada do local, ao tentar identificar conhecidos que foram detidos. “Foi uma confusão, mandaram todo mundo deitar e só depois começaram a identificar as pessoas”, disse ela.

Com as prisões, o hotel acabou cercado por manifestantes, que queriam exigir a liberação dos detidos. Foi quando a Polícia Militar resolveu fazer duas barreiras com escudos em um espaço de 50 metros. A partir dali, pedestres não podiam subir ou descer a Augusta, sem ter de dar a volta pelas ruas paraelas.

Nesse momento, o desempregado Hugo Souza, 22 anos, se irritou por não conseguir entrar em casa, depois de participar das comemorações do aniversário de São Paulo. Ao perceber isso, passou a fazer um discurso contra os policiais que ali estavam. “Sou trabalhador e estão impedindo que eu entre na minha casa. A gente sofre, tem família e ainda tem de aguentar isso”, queixou-se.

No meio da confusão, um prédio residencial chegou a ser invadido. Pela janela, moradores chamavam os policiais, se queixando de barulho dentro do prédio. Ali, pelo menos uma pessoa foi detida.

Enquanto isso, na rua Xavier de Toledo, próximo à igreja da Consolação, um colchão foi incendiado. Um fusca com quatro adultos e uma criança tentou passar e acabou pegando fogo.

O fotógrafo Adriano Lima, que estava no local, conta que ajudou a afastar a família do veículo. A mulher, com uma criança no colo, chorava muito. “Ela estava revoltada com aquilo que aconteceu e com o risco que toda a família correu”, disse.

Os manifestantes ainda atacaram dois carros da Guarda Civil Metropolitana, na mesma região. Um dois veículos conseguiu sair da confusão. Os guardas municipais da viatura que ficou no local foram expulsos do carro. Os manifestantes tentaram virar o veículo, mas não conseguiram.

Protestos contra tarifas mobilizam população e desafiam governos de todo o País

Mobilizados contra o aumento das tarifas de transporte público nas grandes cidades brasileiras, grupos de ativistas organizaram protestos para pedir a redução dos preços e maior qualidade dos serviços públicos prestados à população. Estes atos ganharam corpo e expressão nacional, dilatando-se gradualmente em uma onda de protestos e levando dezenas de milhares de pessoas às ruas com uma agenda de reivindicações ampla e com um significado ainda não plenamente compreendido.

A mobilização começou em Porto Alegre, quando, entre março e abril, milhares de manifestantes agruparam-se em frente à Prefeitura para protestar contra o recente aumento do preço das passagens de ônibus. A mobilização surtiu efeito e o aumento foi temporariamente revogado. Poucos meses depois, o mesmo movimento se gestou em São Paulo, onde sucessivas mobilizações atraíram milhares às ruas – o maior episódio ocorreu no dia 13 de junho, quando um imenso ato público acabou em violentos confrontos com a polícia.

A grandeza do protesto e a violência dos confrontos expandiu a pauta para todo o País. Foi assim que, no dia 17 de junho, o Brasil viveu o que foi visto como uma das maiores jornadas populares dos últimos 20 anos. Motivados contra os aumentos do preço dos transportes, mas também já inflamados por diversas outras bandeiras, tais como a realização da Copa do Mundo de 2014, a nação viveu uma noite de mobilização e confrontos em São Paulo, Rio de Janeiro, Curitiba, Salvador, Fortaleza, Porto Alegre e Brasília.

A onda de protestos mobiliza o debate do País e levanta um amálgama de questionamentos sobre objetivos, rumos, pautas e significados de um movimento popular singular na história brasileira desde a restauração do regime democrático em 1985. A revogação dos aumentos das passagens já é um dos resultados obtidos em São Paulo e outras cidades, mas o movimento não deve parar por aí. “Essas vozes precisam ser ouvidas”, disse a presidente Dilma Rousseff, ela própria e seu governo alvos de críticas.