Os médicos brasileiros contrários ao programa Mais Médicos do governo federal criaram uma página na internet para criticar os colegas estrangeiros. No Tumblr “Mais Médicos?”, os profissionais reúnem receitas supostamente escritas por médicos estrangeiros – em especial os cubanos, maiores alvos das críticas – para tentar desqualificar o programa.

As postagens mostram receituários com textos apresentando problemas de língua portuguesa, palavras não existentes na literatura médica, segundo os autores, e supostos erros nas escolhas dos medicamentos. Apesar do autor da página não se identificar, as críticas vêm acompanhadas de jargões médicos “corrigindo” os estrangeiros, chamados constantemente de “a cubanada”. O ministro da Saúde, Alexandre Padilha, também não escapa das queixas, e é classificado como “canalha” e “pseudomédico”.

De acordo com o vice-presidente do Conselho Federal de Medicina (CFM), Emmanuel Fortes, os casos serão investigados para averiguar a veracidade das receitas. “Chamou a atenção que realmente tem coisas na página que são incompatíveis com a segurança da população”, disse. “O que vimos que temos algumas prescrições de antibióticos, encaminhamentos, ou intervenções nesse blog que demonstram um desconhecimento total inclusive das ações de emergência.”

“Teríamos que averiguar essas prescrições, averiguar os prontuários, se há mesmo compatibilidade dessa informação que nos está sendo colocada em público com o que consta no prontuário de cada paciente. É assim que fazemos também com médicos brasileiros: vamos em busca do esclarecimento; se confirmado o fato, vamos abrir o procedimento para que a pessoa se explique. Sempre fizemos confronto com a informação que temos e com o que o médico diz.”

Segundo Fortes, até agora nenhum paciente foi até o CFM para registrar queixa contra algum médico cubano, e o órgão não soube afirmar se os presidentes dos conselhos regionais receberam alguma denúncia. “Se a pessoa tem dúvida quanto à prescrição, deve de fato encaminhá-la ao CRM ou tirar a dúvida com o médico de sua confiança, com um médico que esteja mais próximo”, orientou.

Em nota, o Ministério da Saúde afirmou que “as denúncias sobre supostos erros publicadas pelo referido site foram verificadas e foi constatada diferença de prescrição e não erro”. “Até o momento, não temos a constatação de consequência adversa para o paciente em nenhuma das situações ali mencionadas”, disse o ministério.

Conforme o governo, a legislação prevista para os médicos estrangeiros do programa Mais Médicos é a mesma aplicada aos demais médicos que trabalham no Brasil. Eles estão sujeitos à fiscalização do CRM, que têm a competência de fiscalizar e de apurar eventuais erros, assim como são apuradas as denúncias contra qualquer profissional de medicina que atue no País. “Todos os profissionais do Mais Médicos são acompanhados por supervisores e tutores permanentemente disponíveis ligados a universidades e escolas públicas que participam do programa e pelas secretarias estaduais e municipais de saúde. Além disso, os médicos têm acesso a todos os protocolos clínicos e de regulação do Sistema Único de Saúde (SUS) e a ferramentas de orientação à distância e que possibilitam obter, a qualquer tempo, informações científicas atualizadas”, explicou o ministério.

Críticas não são “mágoas”

O vice-presidente do CFM não acredita que as críticas aos médicos estrangeiros que atuam no País sejam fruto da “mágoa” que os profissionais carregam após verem o programa ser elogiado pela população beneficiada. “Acho que as críticas que estão sendo colocadas não são tanto de mágoa, mas tem uma base de realidade que, se for verdade o que esta posto na receitas, há uma necessidade de se reavaliar o que está sendo feito”, disse Fortes.

“Eu faria a seguinte observação: os médicos brasileiros também são alvo de ciritcas ferenhas. Quem comete algum erro está sujeito a críticas. O governo nunca fez um elogio público a um médico que tenha uma atitude heroica, nenhum profissional que foi pro interior recebeu flores, pelo contrário. Eles não valorizam os médicos que estão lá”, afirmou.

Ainda segundo o vice-presidente do CFM, o problema com as receitas estaria na formação dos médicos estrangeiros, e o ministério da Saúde não consegue contornar isso. “O ministério não qualifica, eu acredito que no curso de formação (fase do acolhimento, quandos os médicos chegam ao Brasil) eles falam sobre o sistema de saúde. Em 15 dias não dá pra passar uma quantidade enorme de coisas como essa que estamos vendo. Acredito que é da formação deles mesmo, a população precisa nos escutar, não somos contra os médicos estrangeiros, queremos que ele seja avalido”, disse.

O ministério da Saúde, por sua vez, disse lamentar “a reação contrária ao programa por parte de alguns médicos brasileiros”, mas acredita que ‘sejam reações isoladas e que não condizem com a postura da maioria dos profissionais da categoria”.