Após cerca de uma hora de caminhada, aproximadamente 100 pessoas – entre familiares e amigos de vítimas da Boate Kiss – chegaram à sede do Ministério Público (MP) em Santa Maria, onde fizeram um protesto na manhã desta segunda-feira para marcar o primeiro ano da tragédia que matou 242 pessoas em 27 de janeiro de 2013.

Ao chegarem ao local, porém, os manifestantes encontraram as portas fechadas, e um grande aparato policial garantindo a segurança na região. Descontentes com o andamento do processo que tramita na Justiça para apurar a responsabilidade criminal pela tragédia e a indenização às vítimas, eles consideram a atuação do MP como uma das principais causas daquilo que avaliam como impunidade aos responsáveis pelo incêndio, ocorrido há um ano.

Mesmo cansados após passar a madrugada inteira fazendo vigílias em frente à Boate Kiss, os cerca de 100 manifestantes faziam barulho desde cedo na rua dos Andradas, que foi bloqueada por agentes de trânsito. Pelo menos 12 voluntários da Cruz Vermelha davam suporte médico e psicológico às família. “A maioria dos atendimentos ocorridos durante a madrugada foi por cansaço mesmo, por puro esgotamento fístico. Tem muita família que está emendando direto, todos os últimos dias”, disse o voluntário Valério Moraes.

Com meia hora de atraso, os manifestantes saíram em marcha por volta das 8h30 desta segunda-feira e seguiram pela rua Rio Branco, onde pararam em frente à prefeitura. Os manifestantes se sentaram no chão por cerca de cinco minutos, aos gritos de “justiça!”, e tocaram tambores improvisados – feitos com galões de água. Ao longo do caminho, distribuíram balões brancos e adesivos. Uma viatura e aproximadamente seis policiais militares acompanharam a caminhada.

Durante todo o trajeto, muitos gritos foram entoados pelos presentes. “Acorda, Santa Maria!”, “E se fosse um filho teu?” estavam entre os slogans proferidos. “Somos o povo, e a Justiça nós vamos conquistar” e “aqui chega de rolo, o MP tem fatia nesse bolo” – demonstrando, novamente, revolta com o andamento do processo no Ministério Público – também estavam nas vozes dos familiares.

Parentes relatam dor da perda, um ano depois

Oclides Bairro perdeu duas sobrinhas e o marido de uma delas na tragédia de 27 de janeiro de 2013. Greicy, 18 anos, e Patrícia, 27 anos – além do marido dela, Júnior, 31 anos – estão entre os 242 mortos no incêndio há um ano. O casal deixou um filho de 6 anos, que agora é cuidado pelos avós.

“Trazer eles de volta a gente não vai conseguir, mas nós queremos, com essa manifestação, que pelo menos tenhamos justiça, que os responsáveis paguem pelo que fizeram”, disse Oclides, emocionado. Durante a marcha, ele carregava um banner com uma imagem dos três entes que perdeu.

A representante comercial Marilene Bueno não estava na manifestação, mas chorou quando a marcha passou pela loja que ela mantém em Santa Maria. “A gente fica muito sensibilizado.

Passou um ano, e a tragédia ainda está marcada na cidade. É muito doloroso”, desabafou ela, que disse ter perdido muitos amigos na tragédia.

Flávio Silva, um dos líderes do movimento Luto à Luta, que liderou a marcha, perdeu a filha Andrielly na tragédia. Para ele, “a marcha vai cumprir o seu papel”. “Nós vamos até o MP cobrar que eles façam o trabalho deles. Agora eles têm que ter um pingo de respeito e se julgar incapacitados de tocar o processo”, afirmou.

No MP, portas fechadas e promessa de novos atos

Por volta das 9h30, o grupo chegou à sede do MP, destino final da marcha. Diante das portas fechadas e do grande número de policiais posicionado nas proximidades, alguns manifestantes entoaram gritos com críticas ao Ministério Público, cobrando uma atuação mais firme contra os réus. Os líderes do movmento, porém, foram informados pelo MP de que as portas estavam fechadas porque o expediente só começaria às 12h.

“O MP é público, quem não deve não teme”, gritava uma manifestante equipada com um megafone. Imediatamente, o grupo cantou em coro: “se a Justiça demorar, o MP vamos ocupar”.

Para Flávio Silva, o reforço policial não interferiu na manifestação, “que era pacífica desde o princípio”. “Para nós, não muda nada o reforço policial, a gente entende até como uma proteção para nós”, disse o membro do grupo, que estudava a possibilidade de “dar uma passadinha na prefeitura” em seguida. Devido à exaustão dos familiares das vítimas, porém, a manifestação rapidamente foi dispersada.

No entanto, os líderes do movimento prometeram seguir com a mobilização. Nós estamos colhendo assinaturas para entregar ao Ministério Público na próxima vez que eles aceitarem nos receber. Nós vamos até o fim.”