Governo segura 65% dos recursos de 5 fundos setoriais para fazer superavit
Na “gincana” em que entrou para tentar cumprir a meta das contas públicas este ano, o governo intensificou uma antiga receita: segurar no caixa os recursos de fundos setoriais. Levantamento feito pela organização não governamental Contas Abertas a pedido do ‘Estado’ mostra em que em apenas cinco fundos, cujos recursos somam R$ 11 bilhões, R$ […]
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Na “gincana” em que entrou para tentar cumprir a meta das contas públicas este ano, o governo intensificou uma antiga receita: segurar no caixa os recursos de fundos setoriais. Levantamento feito pela organização não governamental Contas Abertas a pedido do ‘Estado’ mostra em que em apenas cinco fundos, cujos recursos somam R$ 11 bilhões, R$ 7,2 bilhões foram destinados à chamada “reserva de contingência”.
Ou seja, estão numa espécie de conta poupança que só deve ser gasta numa emergência. Assim, o mais provável é que eles, ao fim do ano, acabem engordando o superavit primário das contas públicas. O valor retido corresponde a 65% do disponível nesses fundos. No ano passado, o volume destinado à reserva de contingência nessa mesma amostra era de 44%.
“Nos anos passados essa prática já era usual, mas, este ano, a situação provavelmente se agravou pela dificuldade do governo em obter superavit primário”, disse o fundador e secretário-geral da organização, Gil Castello Branco. A inclusão desses recursos na reserva de contingência é uma demonstração do quanto esse bloqueio é rotineiro. Eles já entram no orçamento como dinheiro retido.
Na pesquisa, que levou em conta os fundos mais prejudicados, o maior volume de recursos retidos está no Fundo de Universalização dos Serviços de Comunicação (Fust), alimentado por contribuições cobradas nas contas de telefone. Ele dispõe de R$ 6,2 bilhões, mas praticamente tudo foi para a reserva de contingência.
Apenas R$ 1,7 milhão foi destinado a despesas de custeio. Ainda assim, até 26 de agosto nada havia sido empenhado. O empenho é a primeira etapa do gasto público. É uma espécie de reserva que se faz do dinheiro quando um produto ou serviço é contratado pelo governo.
O Fust é, talvez, a mais antiga vítima da prática de reter recursos para melhorar o resultado primário. Desde sua criação, em 2000, ele jamais teve os recursos totalmente liberados. É um dinheiro que, em tese, serve para levar serviços de telecomunicações às áreas mais remotas.
Outro contribuinte antigo do resultado primário é o Fundo para o Desenvolvimento Tecnológico das Telecomunicações (Funttel). Neste ano, o orçamento é de R$ 343,7 bilhões, dos quais R$ 291 milhões estão na reserva de contingência. Com isso, ações de financiamento à pesquisa e inovação na área foram comprometidos.
Consultado, o Ministério das Comunicações informou que não comentaria esses casos.
A retenção atinge fundos que financiariam ações demandadas pela sociedade, como educação no trânsito e apoio à criança e ao adolescente. Segundo os dados do Contas Abertas, o Fundo Nacional de Segurança e Educação no Trânsito dispõe de R$ 933,9 milhões este ano, mas 81,9% dos recursos estão reservados para contingência.
O levantamento da Contas Abertas mostra que, dos recursos empenhados, a maior parte – R$ 54 milhões – foi destinada ao “fortalecimento institucional do Sistema Nacional de Trânsito”. Mas ações como um projeto nacional de Educação para a Cidadania no Trânsito não tiveram nenhum centavo empenhado, assim como o fomento a pesquisas na área.
“O Departamento Nacional de Trânsito (Denatran), como todos os órgãos da administração pública federal, está sujeito ao contingenciamento”, informou o Ministério das Cidades. “Esse contingenciamento pode se dar tanto via Reserva de Contingência, quanto por meio de Decreto de Programação Orçamentária e Financeira.”
Já os R$ 33,4 milhões para o Fundo Nacional para a Criança e o Adolescente não foram retidos na reserva de contingência. Mas os números mostram que menos de 10% foram empenhados até o momento.
Nesse caso, a baixa utilização do dinheiro não tem relação com o esforço do governo de segurar gastos. Tanto que, segundo a Secretaria de Direitos Humanos, que administra o fundo, ele “jamais” contribuiu para o superavit primário.
O dinheiro continua em caixa por dificuldades típicas da administração pública. Segundo a secretaria, os recursos são liberados para financiar projetos de entidades sem fins lucrativos, prefeituras e governos estaduais. E, neste ano, foram selecionados apenas cinco projetos, ainda em fase de ajustes. Mas, por causa de restrições da lei eleitoral, os repasses só poderão começar depois de outubro.
O levantamento do Contas Abertas também abrangeu o Fundo Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico, que teve R$ 25,3 milhões na reserva de contingência, de um orçamento de R$ 3,6 bilhões.
Além do necessário. Desde que foram criados, alguns dos fundos setoriais passaram a arrecadar um volume de recursos maior do que as políticas que eles deveriam financiar. Por isso, uma parcela tão grande é destinada à reserva de contingência, segundo explicou o Ministério do Planejamento. Como exemplo, a pasta cita o desenvolvimento do setor de telecomunicações e o consequente aumento da arrecadação dos fundos vinculados a essa área.
Mesmo não sendo utilizado, o dinheiro dos fundos continua vinculado a eles. Assim, informa o Planejamento, esses recursos poderão ser gastos em outros anos. Em 2011, os cinco fundos pesquisados pelo Contas Abertas empenharam R$ 2,58 bilhões. No orçamento de 2015, entregue na quinta-feira ao Congresso, eles contam com R$ 4,37 bilhões – um aumento de 69,6%. Esse valor não contém a parcela destinada à reserva de contingência.
O Ministério do Planejamento nega que a retenção de recursos dos fundos tenha como objetivo elevar o superávit primário. “A finalidade do governo é implementar as políticas públicas setoriais nos montantes necessários para a sua consecução.”
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