Os 14 indiciados pelo incêndio na Boate República de Cromañón, ocorrida em dezembro de 2004 em Buenos Aires, foram condenados em 2008. No entanto, as prisões definitivas aconteceram somente em 2012, oito anos depois do incidente, quando não havia mais recursos judiciais possíveis.

As semelhanças com a tragédia da Boate Kiss, que vitimou 242 jovens há exatamente um ano em Santa Maria (RS), são muitas. No dia 30 de dezembro de 2004, 194 jovens perderam a vida em função de um incêndio na boate portenha República Cromañón.

A tragédia argentina também foi consequência do lançamento de um equipamento pirotécnico utilizado por um dos integrantes da banda que se apresentava no local naquela noite, a Callejeros.

Ao entrar em contato com o teto composto de material inflamável, começou um incêndio que vitimou quase 200 pessoas fatalmente e deixou feridas outras 1.432. Antes da tragédia de Santa Maria, esse era o incidente em casa noturna que mais contabilizava vítimas em toda a América Latina.

Em Santa Maria, ainda não há presos, tampouco agentes públicos responsabilizados. Sobre os 16 processados, não há previsão para julgamento.

Busca por Justiça

No caso de Cromañón, somente em 2012, ou seja, oito anos depois da tragédia os primeiros condenados pela Justiça foram presos.

Foram condenados o gerente e o assistente de gerência da boate, todos os integrantes da banda – o baterista também foi condenado à prisão perpétua pelo de sua ex-mulher, Wanda Taddei- e funcionários da prefeitura de Buenos Aires responsáveis pela fiscalização dos estabelecimentos. As penas variam de dez a três anos de prisão. A condenação inédita de servidores foi uma das principais vitórias obtidas na Justiça no caso de Cromañón.

“Muitos de nós, como militantes, não acreditamos que a Justiça se faça apenas pelo julgamento dos responsáveis. O que queremos é que isso não se repita, porque, por mais que os culpados sejam presos e condenados, é impossível estar contente depois de ter um filho morto”, disse Sílvia Bignami, cujo filho, Julián Rozengardt, morreu naquele 30 de dezembro.

“Eu acredito que a justiça foi feita, mas pela metade. Não me queixo, porque foram condenados muitos dos responsáveis, por meio de um excelente trabalho feito pelos advogados. Eu digo que foi feito pela metade porque essas pessoas foram julgadas por homicídio culposo [quando não há a intenção de matar], e nós acreditamos que foi um homicídio doloso [quando existe a intenção de matar, que prevê penas maiores]”, afirmou Cristina Bernasconi, mãe de Nico Landoni, 22, uma das vítimas de Cromañón. “O mesmo está acontecendo em Santa Maria, os indiciados estão sendo julgados por homicídio doloso.”

O prefeito de Buenos Aires à época, Aníbal Ibarra, foi destituído do cargo em março de 2006 em um julgamento político motivado pelos protestos da associação “Que no se repita”. Atualmente, Ibarra ocupa um cargo de deputado na cidade de Buenos Aires.

“Nós não estávamos satisfeitos com o silêncio do prefeito de Buenos Aires na época e, por isso, demos início a um juízo político que terminou com sua destituição do cargo”, explica Cristina.

O dono da casa noturna, Rafael Levy, foi condenado, mas recorreu da sentença, e o processo ainda não foi concluído.

Nove anos para o pagamento de pensões

Somente em novembro de 2013 foi aprovada a liberação de pensões vitalícias de 2.500 sobreviventes de Cromañón e aos familiares dos 194 mortos.

Segundo a determinação judicial, o governo deverá pagar mensalmente  2.400 pesos argentinos (algo em torno de R$ 600) aos sobreviventes e 1.200 pesos (R$ 300) aos familiares de mortos. A cifra deverá sofrer reajuste conforme o IPCABA (Índice de Preços ao Consumidor) elaborado pela Direção Geral de Estatística e Censo Portenho.

Além disso, a decisão prevê a garantia de tratamento médico e medicamentos, especialmente com relação à saúde mental, já que 16 jovens sobreviventes suicidaram no decorrer desses nove anos. Deverá ser providenciado também controle pneumológico e tratamentos de oncologia aos afetados pela tragédia.

Segundo o subdefensor público geral para Assuntos Jurídicos Felipe Kirchner, que representa a Defensoria, nenhuma vítima ou familiar em Santa Maria recebeu qualquer tipo de indenização ou reparo pela tragédia até agora.