A médica cubana Ramona Rodríguez diz temer represália por ter desertado do Programa Mais Médicos na segunda-feira passada.

“Tenho medo que me aconteça algo – que alguém de Cuba me faça algo, que me sequestrem, não sei”, afirma em entrevista por telefone, em Brasília.

Rodríguez, de 51 anos, diz também que sabia que sua decisão de abandonar o Mais Médicos, vitrine do governo de Dilma Rousseff – cairia “como uma bomba”.

“Virou mais do que isso (saúde pública), é algo político”, opina.

A médica, que é especialista em medicina integral geral, deixou seu posto de trabalho no Pará se sentir enganada por receber apenas uma fração do que receberiam profissionais do Mais Médicos vindos de outros países.

Ela alegar ganhar apenas US$ 400 por mês, além de US$ 600 que são depositados em sua conta em Cuba, e que o governo cubano ficaria com outros  US$ 3 mil do salário pago pelo governo brasileiro a Rodríguez.

A Agência Brasil explica que os médicos cubanos atuam no Brasil em regime diferente dos que se inscreveram individualmente no Mais Médicos – via convênio do Ministério da Saúde brasileiro com a Organização Pan-Americana da Saúde (Opas), que recebe os repasses estatais e os encaminha ao governo cubano.

“Fiquei indignada”, diz Rodríguez. “Muitos médicos pensam como eu, que isso é um roubo do nosso dinheiro.”

Ela pediu asilo na Embaixada dos EUA em Brasília e pediu refúgio no Brasil, para regularizar sua estada no país enquanto seu pedido é processado por Washington.

Rodríguez afirma que seu desejo é emigrar aos EUA, mas caso não consiga está disposta a ficar no Brasil – onde a Associação Médica Brasileira, crítica ao Mais Médicos, ofereceu-lhe um emprego transitório.

‘Ativo político’

Para analistas, o episódio virou um caso delicado de política externa e doméstica para a presidente Dilma Rousseff, que tem o Mais Médicos como bandeira nas eleições de outubro.

“O que parecia ser um ativo político para ela na campanha pode se transformar em um problema político importante”, afirma Paulo Velasco, especialista em relações internacionais da Universidade Cândido Mendes.

Velasco diz acreditar que se Washington aceitar o pedido de asilo de Rodríguez, o episódio pode “complicar mais” a relação com o Brasil e estimular outros médicos cubanos a fazer o mesmo.

Mais de 7 mil médicos cubanos vieram ao Brasil para o programa, reforçando uma relação bilateral que prevê também o aumento do comércio entre Brasília e Havana.

O ministro da Saúde, Arthur Chioro, acusou na semana passada a oposição de explorar politicamente o caso de Rodríguez e “boicotar” o Mais Médicos. “Se dependesse da oposição, 22 milhões de brasileiros continuariam sem atendimento à saúde”, afirmou.