Lembra do “Imagina na Copa”? Para alguns, a frase ficou para trás – o lema agora é outro: “Não vai ter Copa”.

Manifestantes voltarão a protestar nesta terça-feira (29) em São Paulo, em meio a temores crescentes de que protestos que mobilizaram o Brasil no ano passado ganhem fôlego no Mundial, cujo pontapé será daqui a 44 dias.

Os atos perderam força desde as grandes manifestações de junho passado, sendo cada vez mais associados à violência e vandalismo, com cenas recorrentes de destruição, embates entre manifestantes e policiais e ação agressiva de grupos adeptos da tática “black bloc” e mascarados.

Mas, para muitos, a escala de mobilização deve mudar na época da Copa.

Autoridades temem que protestos maiores e mais violentos podem se repetir durante o torneio, e por motivos sem relação ao evento, como economia ou violência urbana, disse à BBC Brasil uma fonte do governo a par dos planos de segurança.

Num esforço de reverter a percepção negativa com a Copa, o governo lançou uma ampla campanha publicitária para ressaltar os aspectos positivos em sediar o evento – chamado pela presidente Dilma Rousseff de “Copa das Copas”.

Sem dúvida, a aposta é numa mudança de humor do público.

“A chegada das seleções e o começo dos jogos vão criar um clima de festa no país”, disse à BBC Brasil o ministro do Esporte, Aldo Rebelo, no início de abril.

“Não conheço nenhum movimento social relevante, nenhuma organização sindical importante, nenhum partido representativo que seja contra a Copa. Por isso, não acredito em grandes manifestações.”

Demonstrações recentes, no entanto, mostraram que a situação é volátil e que o risco de revoltas “é concreto”, disse o cientista político Ricardo Ismael, da PUC-Rio, que tem acompanhado as manifestações.

“O governo federal está gastando milhões em publicidade para dizer que o Brasil está maravilhoso… (Mas) o que existe em relação à Copa é que os problemas reais do povo brasileiro não vão poder ser escondidos em 30 dias,” disse ele.

Prejuízo eleitoral?

Imagens de moradores fechando ruas de Copacabana, no Rio de Janeiro, correram o mundo na semana passada, alimentando temores de que atos semelhantes se repitam em várias cidades num momento em que o país receberá milhares de visitantes e estará em evidência mundial.

Pesquisas indicam, porém, que o momento atual não é favorável às manifestações. O apoio aos atos caiu para 52% ante 81% em junho de 2013, ápice dos protestos, segundo pesquisa Datafolha divulgada em fevereiro. A sondagem também apontou que 63% dos entrevistados são contra a realização de protestos durante a Copa – 32% se disseram favoráveis.

Mas manifestantes prometem seguir nas ruas.

“Vai ocorrer protesto durante a Copa? Vai. Não dá para calcular se vai ser menos ou mais violento”, disse o ativista F.M., que tem participado de manifestações em São Paulo.

O ato desta terça-feira será às 19h no Tatuapé, na zona leste de São Paulo, próximo ao Itaquerão, que receberá o jogo de abertura da Copa entre Brasil e Croácia, em 12 de junho.

Não surpreende que a questão dos protestos na Copa tenha se tornado frequente nos discursos oficiais.

Nas últimas semanas, Dilma tem garantido “segurança pesada” para a Copa, e o investimento nesta área será de quase R$ 2 bilhões.

Qualquer convulsão maior durante o evento poderá arranhar a campanha dela à reeleição, em outubro.

Em 2013, manifestantes e forças de segurança se enfrentaram durante a Copa das Confederações, inclusive perto de estádios onde partidas seriam realizadas. Os protestos derrubaram a aprovação da presidente à época.

O diretor de marketing da Fifa, Thierry Weil, disse na semana passada que a entidade e patrocinadores estão preocupados com os episódios recentes de violência no país. Mas o secretário-geral da entidade, Jérôme Valcke, minimizou a tensão e disse confiar no esquema de segurança para o evento.

Braços cruzados

O apoio à realização da Copa no Brasil também tem caído: chegou a 48% neste mês ante 79% em 2008, um ano após o país ter sido anunciado como anfitrião, segundo outra pesquisa do Datafolha, publicada no início de abril.

Ceticismo local é comum antes da realização de grandes eventos e foi observado em outras edições de Copas e Olimpíadas, o que não comprometeu o andamento dos torneios.

Não é só o risco de manifestações que preocupa: diversas categorias têm ameaçado greves nas semanas que antecedem ou até mesmo durante o Mundial, inclusive representantes de policiais federais, vigilantes, aeroviários e aeronautas – áreas-chave para o torneio.

No início do mês, policiais militares da Bahia cruzaram os braços por dois dias. Foram registrados 39 homicídios na região de Salvador, sede da Copa e uma das cidades mais violentas do país, além de saques e assaltos.