Lembra do “Imagina na Copa”? Para alguns, a frase ficou para trás – o lema agora é outro: “Não vai ter Copa”.

Manifestantes voltarão a protestar nesta terça-feira em São Paulo, em meio a temores crescentes de que protestos que mobilizaram o Brasil no ano passado ganhem fôlego no Mundial, cujo pontapé será daqui a 44 dias.

Os atos perderam força desde as grandes manifestações de junho passado, sendo cada vez mais associados à violência e vandalismo, com cenas recorrentes de destruição, embates entre manifestantes e policiais e ação agressiva de grupos adeptos da tática “black bloc” e mascarados.

Mas, para muitos, a escala de mobilização deve mudar na época da Copa.

Autoridades temem que protestos maiores e mais violentos podem se repetir durante o torneio, e por motivos sem relação ao evento, como economia ou violência urbana, disse à BBC Brasil uma fonte do governo a par dos planos de segurança.

Num esforço de reverter a percepção negativa com a Copa, o governo lançou uma ampla campanha publicitária para ressaltar os aspectos positivos em sediar o evento – chamado pela presidente Dilma Rousseff de “Copa das Copas”.

Sem dúvida, a aposta é numa mudança de humor do público.

“A chegada das seleções e o começo dos jogos vão criar um clima de festa no país”, disse à BBC Brasil o ministro do Esporte, Aldo Rebelo, no início de abril.

“Não conheço nenhum movimento social relevante, nenhuma organização sindical importante, nenhum partido representativo que seja contra a Copa. Por isso, não acredito em grandes manifestações.”

Demonstrações recentes, no entanto, mostraram que a situação é volátil e que o risco de revoltas “é concreto”, disse o cientista político Ricardo Ismael, da PUC-Rio, que tem acompanhado as manifestações.

“O governo federal está gastando milhões em publicidade para dizer que o Brasil está maravilhoso… (Mas) o que existe em relação à Copa é que os problemas reais do povo brasileiro não vão poder ser escondidos em 30 dias,” disse ele.

Prejuízo eleitoral?Imagens de moradores fechando ruas de Copacabana, no Rio de Janeiro, correram o mundo na semana passada, alimentando temores de que atos semelhantes se repitam em várias cidades num momento em que o país receberá milhares de visitantes e estará em evidência mundial.

Pesquisas indicam, porém, que o momento atual não é favorável às manifestações. O apoio aos atos caiu para 52% ante 81% em junho de 2013, ápice dos protestos, segundo pesquisa Datafolha divulgada em fevereiro. A sondagem também apontou que 63% dos entrevistados são contra a realização de protestos durante a Copa – 32% se disseram favoráveis.

Mas manifestantes prometem seguir nas ruas.

“Vai ocorrer protesto durante a Copa? Vai. Não dá para calcular se vai ser menos ou mais violento”, disse o ativista F.M., que tem participado de manifestações em São Paulo.

O ato desta terça-feira será às 19h no Tatuapé, na zona leste de São Paulo, próximo ao Itaquerão, que receberá o jogo de abertura da Copa entre Brasil e Croácia, em 12 de junho.

Não surpreende que a questão dos protestos na Copa tenha se tornado frequente nos discursos oficiais.

Nas últimas semanas, Dilma tem garantido “segurança pesada” para a Copa, e o investimento nesta área será de quase R$ 2 bilhões.

Qualquer convulsão maior durante o evento poderá arranhar a campanha dela à reeleição, em outubro.

Em 2013, manifestantes e forças de segurança se enfrentaram durante a Copa das Confederações, inclusive perto de estádios onde partidas seriam realizadas. Os protestos derrubaram a aprovação da presidente à época.

O diretor de marketing da Fifa, Thierry Weil, disse na semana passada que a entidade e patrocinadores estão preocupados com os episódios recentes de violência no país. Mas o secretário-geral da entidade, Jérôme Valcke, minimizou a tensão e disse confiar no esquema de segurança para o evento.

Braços cruzados

O apoio à realização da Copa no Brasil também tem caído: chegou a 48% neste mês ante 79% em 2008, um ano após o país ter sido anunciado como anfitrião, segundo outra pesquisa do Datafolha, publicada no início de abril.

Ceticismo local é comum antes da realização de grandes eventos e foi observado em outras edições de Copas e Olimpíadas, o que não comprometeu o andamento dos torneios.

Não é só o risco de manifestações que preocupa: diversas categorias têm ameaçado greves nas semanas que antecedem ou até mesmo durante o Mundial, inclusive representantes de policiais federais, vigilantes, aeroviários e aeronautas – áreas-chave para o torneio.

No início do mês, policiais militares da Bahia cruzaram os braços por dois dias. Foram registrados 39 homicídios na região de Salvador, sede da Copa e uma das cidades mais violentas do país, além de saques e assaltos.