Banco brasileiro permite armazenar DNA por até 75 anos

Uma molécula de DNA de uma pessoa contém toda a informação genética sobre ela. Imagine deixar toda essa informação como herança para que seus filhos e netos tenham acesso a um histórico médico que pode ajudar a identificar a probabilidade de ter diversas doenças no futuro. Com foco na pesquisa do código genético para a […]

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Uma molécula de DNA de uma pessoa contém toda a informação genética sobre ela. Imagine deixar toda essa informação como herança para que seus filhos e netos tenham acesso a um histórico médico que pode ajudar a identificar a probabilidade de ter diversas doenças no futuro.

Com foco na pesquisa do código genético para a prevenção de doenças, foi inaugurado em 25 de abril de 2014 o primeiro banco de armazenamento de DNA da América Latina, o GenomaBank. O serviço será oferecido para que familiares possam guardar por até 75 anos o material genético de seus parentes depois do seu falecimento.

A amostra é colhida por meio de uma técnica de biópsia pouco invasiva, que faz uma incisão de 2 milímetros de diâmetro na pele, entre os dedos da mão. Os tecidos são armazenados a uma temperatura de -22°C e podem ser solicitados para análise de genoma a qualquer momento. A opção pela pele se deve à quantidade grande de DNA que se pode obter em uma pequena amostra, o que não aconteceria no caso de DNA obtido de unhas e cabelos. O GenomaBank cobrará R$ 3.500 pela extração e armazenamento do material pelos primeiros três anos e, após esse período, será cobrada uma taxa anual de R$ 500 pelo depósito do DNA.

O ex-presidente da Sociedade Brasileira de Genética Médica e diretor do Laboratório Genetika, Salmo Raskin, diz que a possibilidade de armazenar o DNA dos familiares é uma inovação importante, porque normalmente as pessoas não pensam nessa possibilidade. Manter o material conservado para uso futuro também é útil porque, com a evolução das pesquisas, os exames serão mais baratos e rápidos.

Para o professor do Departamento de Genética da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) e fundador do Serviço de Genética Médica do Hospital de Clínicas de Porto Alegre, Roberto Giugliani, que estuda as doenças genéticas há 30 anos, a alternativa do banco de DNA é uma novidade interessante, mas é necessário considerar a adesão das pessoas ao serviço, que, acredita, deverá ser limitada a uma parcela da população devido ao alto custo. Segundo o professor, tivemos uma experiência no Brasil com os bancos de cordão umbilical, para o armazenamento de células-tronco, que foram bem aceitos, mas, com a descoberta de novas formas de se obter as células, hoje as pessoas não fazem mais esse procedimento, apesar de os bancos ainda existirem. Giugliani concorda que o acesso a esse serviço seria importante para o avanço da pesquisa da genética no País, onde não existe a cultura da prevenção e nem a investigação sobre predisposição a doenças.

Segundo Giugliani, o projeto do banco de DNA interessa mais para a área da medicina do que para a ciência em geral, porque serve para que as famílias utilizem esse material para descobrir a possibilidade de desenvolver doenças. Os descendentes da pessoa que teve seu material conservado poderão recorrer à análise de DNA para confirmar ou até mesmo prever um diagnóstico de uma doença genética, por meio da busca de mutações que podem causá-las.

Na área da pesquisa, a possibilidade de se ter um banco de amostras de DNA para o trabalho com o genoma pode ser explorada em duas situações: quando o pesquisador solicita a análise do material para uma pesquisa onde não há identificação do doador (mas com o seu consentimento ou dos familiares), ou para pesquisar a genética de uma família específica, neste caso com identificação da origem do DNA.

SUS

A pesquisa do genoma humano pode revelar diversas informações, desde características do indivíduo e aptidões específicas em áreas como música ou esportes até tendência ao desenvolvimento ou resistência a doenças.

A análise do genoma já é uma realidade. Existem mais de 4,5 mil genes já associados a doenças específicas e, em breve, mais genes podem ser identificados. Segundo Giugliani, a técnica de mapeamento de genoma era restrita a doenças raras, mas hoje se estende a várias especialidades, como diabetes e hipertensão. As investigações genéticas já podem identificar a predisposição de alguns tipos de câncer, como o de mama, por exemplo, e doenças no fígado. “Mas é uma área que evolui muito rápido, logo teremos novas doenças capazes de ser identificadas”, diz Giugliani.

Raskin destaca que o atendimento genético foi disponibilizado para pacientes do SUS em fevereiro deste ano e vai oferecer a consulta genética e exames laboratoriais mais básicos, como por exemplo o exame que diagnostica síndromes como a do X Frágil, que causa retardo mental. Em um universo de 3 mil exames, o SUS vai oferecer em torno de 20, segundo Raskin. Essa medida, assim que estiver acessível para a maioria da população, vai causar um grande impacto na análise de doenças genéticas. Segundo o geneticista, as pessoas sem plano de saúde, três em cada quatro brasileiros, não tinham acesso nem mesmo aos exames mais simples, como o de cariótipos, que investiga cromossomos para diagnosticar síndromes como a de Down e de Patau. Mas a prevenção de doenças por meio do estudo do genoma ainda vai demorar para acontecer pelo SUS, diz, porque “a saúde no Brasil ainda é muito direcionada para o tratamento e não para a prevenção”.

Hoje, segundo Raskin, é mais comum que os pacientes procurem a medicina genética para investigar a predisposição a doenças – muitas mulheres buscam saber se podem ter câncer de mama no futuro, seguindo o exemplo da atriz americana Angelina Jolie, que descobriu que tinha grande possibilidade de ter a doença pelo exame genético. Mas a maioria das pessoas procura a genética quando já há uma suspeita da doença. A pesquisa do genoma ainda é demorada, e o exame leva pelo menos dois meses para ficar pronto. Segundo o médico, ainda há uma diferença muito grande entre a pesquisa genética e a medicina que está disponível para os pacientes.

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