América Latina vive febre de empreendedorismo
Por décadas, a maior parte da riqueza gerada nos países da América Latina vinha da exportação de matérias-primas. Petróleo da Venezuela, cobre do Chile, soja da Argentina, banana do Equador, prata do México, carne do Brasil. A vasta região foi premiada com uma fabulosa coleção de commodities que o mundo quer e precisa. Mas a […]
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Por décadas, a maior parte da riqueza gerada nos países da América Latina vinha da exportação de matérias-primas.
Petróleo da Venezuela, cobre do Chile, soja da Argentina, banana do Equador, prata do México, carne do Brasil. A vasta região foi premiada com uma fabulosa coleção de commodities que o mundo quer e precisa.
Mas a América Latina não tem se saído tão bem em exportar ideias. Quando se fala em empreendedorismo e inovação, a região tem um histórico ruim.
Os países da OCDE (Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico) investem, em média, 2,4% do seu PIB em pesquisa e desenvolvimento. O Chile e no México – os únicos dois países da região que integram o grupo – esse gasto é de 0,4%.
No Brasil, esse investimento representa 1,1% do PIB. Em outros países da região esse volume é ainda menor.
Os latino-americanos simplesmente não inventam muita coisa. Apesar de abrigar 8% da população global, apenas 2,6% dos pedidos de registro de patente do mundo partiram da região.
Mudança de cultura
Mas tudo isso está começando a mudar.
“Até recentemente, empreendedorismo no Peru era uma questão de sobrevivência”, conta Gary Urteaga, um empreendedor peruano. “As pessoas começavam seu próprio negócio porque não conseguiam emprego. Então iam vender sanduíches na rua e a lavar carros.”
“Mas agora, pela primeira vez, as pessoas estão optando por ser empreendedores.”
Urteaga é co-fundador do Cinepapaya.com, uma plataforma para smartphone e tablets que faz a venda online de ingressos para cinema.
“Começamos há dois anos, com o financiamento do governo peruano para inovação. Não sabíamos nem o que a palavra ‘start-up’ naquela época. Não sabíamos nada.”
E o empresário não está sozinho. Em toda a região, cada vez mais as pessoas estão começando a entrar em contato com termos comuns no Vale do Silício há anos.
Na Colômbia, uma start-up da área médica chamada Keraderm conseguiu financiamento do governo para desenvolver tecnologia ligada a enxertos de pele.
Quando um paciente é internado com queimaduras ou ferimentos sérios, a empresa coleta uma pequena mostra de sua pele e, após cinco dias, consegue produzir várias camadas de implantes com as células do paciente. Como é feito a partir da pele da própria pessoa, o risco de rejeição é mais baixo.
“Olhar para um país com a Colômbia, que tem vários problemas em termos de violência e segurança, é ver o quanto mudamos nos últimos 10 anos”, diz Jorge Soto, executivo-chefe da Keraderm.
“Agora, os países desenvolvidos vão começar a olhar para nós como uma fonte de novas ideias e novas empresas.”
Controlando bois
No Brasil, Danilo Leão aprendeu sobre empreendedorismo a duras penas. Ele foi criado em uma fazenda e, aos 15 anos, cometeu o erro de vender vacas que estavam prenhes. Após a venda, seu pai lhe explicou que ele poderia ter vendido o animal pelo dobro, já que o bezerro também entraria no negócio.
Dessa maneira, ele começou a notar a falta de informações confiáveis sobre rebanhos. E, um ano depois, criou o BovControl – uma start-up de tecnologia que fornece aos criadores informações online detalhadas sobre as 200 milhões de cabeças de gado no Brasil e de outras 40 mil cabeças no mundo todo.
A ideia ganhou o interesse de criadores, abatedores e empresários não apenas no Brasil, mas também nos Estados Unidos e na África do Sul.
‘Ano da inovação’
No Chile, o presidente Sebastián Piñera declarou, em 2012, que este seria o “ano do empreendedorismo” e que 2013 seria o da inovação.
Seu governou lançou o programa Start-Up Chile, que financia empreendedores do exterior com US$ 40 mil e fornece vistos de um ano para que eles venham para o país desenvolver suas ideias.
Vivek Wadhwa é um consultor de tecnologia americano que ajudou o governo chileno com o programa. “Eu cheguei no país há alguns anos para analisar os esforços de desenvolvimento do governo e o que eu disse a eles foi que, daquela maneira, eles estavam fadados ao fracasso.”
“O Chile estava desperdiçando milhões de dólares na tentativa de criar indústrias de cima para baixo. E então eu disse que o que eles precisavam era de empreendedorismo. O Chile precisa ver a si mesmo como outros países de população pequena, como a Noruega, Israel e Cingapura.”
O programa está no seu quarto ano e já financiou cerca de 1.500 empreendedores, tanto chilenos como estrangeiros, e vem inspirando projetos similares no Brasil, no Peru e em outras partes do mundo.
Derrubando a burocracia
O governo chileno também adotou outras medidas, como reduzir a burocracia, para incentivar o setor.
Em 2010, um chileno levava uma média de 27 dias para abrir um negócio. Hoje, o processo demora apenas um dia – como acontece no Brasil. De acordo com o Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas (Sebrae), um microempresário consegue abrir seu negócio no mesmo dia, obtendo seu Cadastro Nacional de Pessoa Jurídica (CNPJ) no Portal do Cidadão. Em alguns setores, claro, é preciso outros documentos, como licenças para o imóvel, claro.
Recentemente, o Chile também a abrigou o LAB 4+, um encontro entre empreendedores e agências de quatro governos da região: Colômbia, México, Peru e o próprio Chile. Os quatro países querem, até 2015, aumentar para 1% seus investimentos em pesquisa e desenvolvimento.
No entanto, ainda há grandes desafios. Em comparação com a África e a Ásia, pouca gente na América Latina fala inglês – o idioma de facto do empreendedorismo.
E como muitos governos da região sofrem pressão para investir em direitos básicos como saúde e educação, em vez de colocar dinheiro em programas para promover a tecnologia e a inovação. Mas os primeiros passos são promissores.
“Em toda a região, essa cultura vem mudando dramaticamente”, diz Soto.
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