Elas surgiram de forma rápida e quieta por toda a península: as barreiras e controles nas estradas – sempre bem guarnecidas e por vezes agressivas.

Atravessamos uma na estrada que liga Sevastopol à capital da Crimeia, Simferopol. Carros eram revistados para assegurar que nada – ou ninguém – chegasse à região vindo da Ucrânia ocidental, que, para muitos aqui, foi palco da “revolução ilegal” – em referência aos protestos e à derrubada do presidente Viktor Yanukovych.

A barreira na estrada tinha um comando variado – policiais que desertaram de Kiev para integrar o governo autônomo da Crimeia, favorável à Rússia, soldados armados com fuzis kalashnikovs e cossacos.

Um deles decidiu falar. “Eu vim da Rússia”, afirmou. “Nós temos o direito de estar aqui porque os moradores locais pediram nossa ajuda, para protegê-los dos fascistas da Ucrânia ocidental”.

Ao lado dele está um homem usando um uniforme com o emblema nacional da Sérvia, que é formado por quatro letras “s” do alfabeto cirílico – a abreviação sérvia para “Apenas a Unidade Salva os Sérvios”.

Como já estive baseado em Belgrado, iniciei uma conversa em sérvio.

“Sim, eu sou do sul da Sérvia”, ele afirmou. “Vim para ajudar meus irmãos russos ortodoxos – nós somos iguais e é normal que eu esteja aqui”.

Ele negou ser um paramilitar – mas está claro que ele é um Chetnik, o grupo de sérvios nacionalistas que lutaram na guerra da Iugoslávia e agora esporadicamente aparecem em outros locais como mercenários.

Medo de uma guerra

Os homens que controlam as barreiras nas estradas argumentam que precisam proteger a comunidade local – mas muitos acreditam que eles sejam uma ameaça à segurança.

Eles parecem simbolizar a ruptura da lei e da ordem que paraliza a Crimeia. Um desses grupos impediu uma delegação da Organização para a Segurança e Cooperação na Europa (OSCE) de entrar na península – disparando tiros de alerta para mostrar sua determinação.

Roman Borodin e sua mulher Tanya, por exemplo, são russos étnicos que vivem na Crimeia, mas não querem ver a região sendo empurrada para os braços de Moscou.

Eu visitei o apartamento deles em Sevastopol, que agora está cheio de caixas. Eles preparam-se para mudar-se da Crimeia para Kiev, preocupados com o futuro de sua filha de quatro anos de idade, Masha.

“Nós estamos saindo porque a situação é imprevisível”, disse Borodin.

“Nós não sabemos o que Putin fará em seguida aqui. Eu temo que seja a guerra. Não quero que a Crimeia se torne a Bosnia-Herzegovina ou o Kosovo. Isso é terrível”.

A maioria dos russos étnicos na Crimeia pediram abertamente ajuda de Moscou. Eles classificam o movimento que derrubou o governo em Kiev como “fascistas”.

A história tem um grande peso por aqui. Sua alegação baseia-se no fato de que grupos de direita apoiaram a revolução que derrubou o presidente Viktor Yanukovych e no nacionalismo da Ucrânia ocidental durante a Segunda Guerra.

Mas Roman me diz que não quer o apoio da Rússia.

“Eu passei dez anos em Moscou e por isso sei como é a Federação Russa”, afirmou. “As pessoas são pobres lá e o nível de corrupção é muito alto – e também não há liberdade de expressão”.

Ele acredita nas alegações dos russos que vivem na Crimeia de que os ucranianos ocidentais poderiam agredi-los?

“Isso é um mito”, ele disse. “Nós passamos recentemente alguns meses na cidade ocidental de Lviv. As pessoas eram extremamente educadas e gentis. Não há violência contra o povo russo – eu falava russo abertamente e não tive nenhum problema. O medo vem da propaganda na televisão”.

“Quando eu fui para o ocidente, minha mãe disse para eu não falar que era de Sevastopol – e ela assiste muita televisão. As pessoas na Ucrânia ocidental estão unidas para construir um novo país sem corrupção e sem criminosos. Nós queremos ajudá-los”.

Fervor pela Rússia

Essa é apenas uma opinião entre muitas outras semelhantes por aqui. Ela é um indicativo de que o governo da Crimeia pode ter superestimado o apoio para o referendo da próxima semana que pode unir a região à Rússia.

Em um show na praça principal de Sevastopol, podia-se ver, entretanto, que muitos querem a união com a Moscou. “Esta é a Crimeia, mas no fundo é a Rússia”, dizia a letra de uma canção que embalava uma multidão com fervor patriótico.

Na realidade, a Ucrânia já perdeu a Crimeia, agora sob o controle de um governo rebelde, tropas russas, milícias e mercenários.

E isso é celebrado por muitos aqui.

Mas para outros, uma separação formal será motivo para deixar a região.