Há catorze anos, Lineu (Marco Nanini), Nenê (Marieta Severo) e família inundam as noites de quinta da Globo com roupas coloridas, decoração kitsch e um indefectível clima de subúrbio carioca. A combinação, levada ao ar muito antes de fenômenos populares como a novela Avenida Brasil (2012), fez da classe C não apenas um personagem de destaque na Globo, mas um chamariz de audiência, que permaneceu cativa esse tempo todo e que agora é obrigada a dizer adeus. A Grande Família sai do ar às 23h20 desta quinta-feira, após inúmeras revelações, confusões, brigas, idas e vindas, como um dos mais longevos e bem-sucedidos seriados da TV brasileira.

Remake da série de mesmo nome exibida entre 1972 e 1975 na Globo, o programa superou seu original em duração e repercussão e revelou ter mais importância do que o filme que inspirou, em 2007, agora pouco lembrado. Em termos de audiência, é impossível comparar, já que o próprio Ibope mudou nesses quarenta anos, sem falar nos hábitos dos brasileiros, agora divididos entre TV aberta, TV paga e internet. Mas, dentro da programação da Globo, esta A Grande Família é um hit. Em 2001, quando estreou, o programa marcava média de 23 pontos de audiência na Grande São Paulo. Em 2014, em sua 14ª temporada, a média é próxima, um feito e tanto em uma emissora que viu seu ibope despencar nesse intervalo: 20 pontos.

Em parte, este sucesso se deve justamente ao fato de o programa ter pintado um retrato fiel de uma parcela das famílias brasileiras, justamente a que assiste à programação da Globo e que seria mostrada mais tarde em tramas como Cheias de Charme (2012, como Avenida Brasil). Os grandes tipos desse grupo estão todos ali: Lineu, o patriarca sério e mau humorado, que dá duro no trabalho de fiscal da vigilância sanitária; Nenê, a dona de casa superprotetora dos filhos; Bebel (Guta Stresser), a filha mais velha meio amalucada que se casou com um malandro de primeira linha, Agostinho (Pedro Cardoso); e o filho caçula acomodado, que vive largado no sofá em vez de procurar um emprego, Tuco (Lucio Mauro Filho).

Personagens que saíram de cena no decorrer das temporadas também deram sua contribuição para o retrato dos brasileiros que ficam entre os ricos e os pobres. Seu Flor (Rogério Cardoso), pai de Nenê, era o aposentado namorador que morava com a filha e, na ausência de outras camas na casa, tinha que dormir no sofá. Tio Juvenal (Francisco Milani) era o parente ranzinza e folgado que incomodava os Silva com sua falta de noção. Seu Flor e Tio Juvenal deixaram o seriado após a morte de seus intérpretes, em 2003 e 2005, respectivamente. Já a cabeleireira Marilda (Andréa Beltrão), que ficou no programa entre 2002 e 2009, era a solteirona que estava louca para encontrar um namorado.

Antes de sair do elenco, Andrea Beltrão havia afirmado que tiraria apenas uma licença das gravações de A Grande Família para poder se dedicar a outros projetos. Mas a folga acabou se estendendo e ela anunciou seu adeus definitivo pouco depois. O movimento da atriz foi modelo para o resto do elenco. A vontade de fazer outros trabalhos é o principal motivo para o fim da série. Após catorze anos de dedicação quase exclusiva, os atores querem encarar novos desafios e, para isso, precisam do tempo que normalmente é dispensado às gravações do seriado.

Nas últimas semanas, com a aproximação do fim, o elenco parece menos convicto da decisão de encerrar a produção. Guta Stresser e Marieta Severo soltaram lágrimas durante entrevistas sobre o assunto, mas não deram o braço a torcer, dizendo que estavam contentes com o final que estava reservado à história. Para encerrar o ciclo, o episódio que vai ao ar hoje mostra o diretor Daniel Filho interessado em fazer uma seriado de televisão sobre os Silva e abordando Lineu e companhia com a proposta de levar às telas o dia a dia da família. A partir da próxima semana, A Grande Família dá espaço à terceira temporada do reality show The Voice Brasil.