Perícia vai esclarecer circunstâncias de assassinato de adolescente indígena

Existem contradições gritantes entre os depoimentos das testemunhas e o do fazendeiro que assumiu a autoria do crime. Laudos saem logo, segundo delegado regional de Dourados

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Existem contradições gritantes entre os depoimentos das testemunhas e o do fazendeiro que assumiu a autoria do crime. Laudos saem logo, segundo delegado regional de Dourados

A Polícia Civil de Dourados tem um caso extremamente delicado em suas mãos, e com contradições que podem alterar a penalização do réu confesso, o fazendeiro Orlandino Carneiro Gonçalves, de 64.

No último sábado (16), Orlandino desferiu um tiro fatal no adolescente guarani kaiowá Reinaldo Barbosa, de 15 anos, quando ele e mais dois garotos da mesma etnia pescavam em um açude de criação de peixes na fazenda Sardinha, de propriedade do fazendeiro.

Ouvido pela reportagem, o delegado Regional de Dourados, Antônio Carlos Videira, informou que a perícia técnica vai buscar elementos materiais que possam esclarecer as contradições entre os depoimentos dos dois meninos e a do fazendeiro.

Na primeira versão apresentada pelos índios, os três meninos saíram correndo de um grupo armado de três pessoas, mas Reinaldo ficou enroscado numa cerca, e foi rendido ali, e executado. As primeiras informações foram de que a execução ocorreu, possivelmente, com um revólver calibre 38.

Mas, segundo o delegado regional, depois que as duas testemunhas principais foram inquiridas, ontem (20), na delegacia, os meninos disseram à polícia que eles foram retidos por três homens à beira do açude, “em depoimentos prestados em guarani, com auxílio de intérprete, confusos, difíceis de entender”.

Depoisde rendidos, um dos homens dizia “mata, mata” em guarani, e nesse momento Orlandino desferiu um tiro à queima roupa na cabeça de Reinaldo.

Não há informação porque os dois outros meninos teriam sido liberados pelo grupo, ou se realmente o grupo teria corrido, como na primeira versão.

Fazendeiro

A terceira versão é a do fazendeiro. Ao se apresentar na delegacia, acompanhado de uma advogada, e ao ser reinquirido depois do depoimento dos garotos, Orlandino afirmou que deu um tiro de carabina 22 a uma distância de aproximadamente 50 metros em direção ao grupo, que estava no açude, acertando sem querer a cabeça de Reinaldo.

Segundo ele, o adolescente ainda estava vivo. O fazendeiro contou que foi socorrer o rapaz, colocado na carroceria de sua camionete, mas ao avistar um grupo de pessoas caminhando numa estrada de terra, pensou que fossem índios e, por temor, abandonou Reinaldo ferido no chão.

Para o delegado regional Antônio Carlos Videira, de qualquer forma ocorreu um homicídio doloso, porque ao atirar contra os três meninos Orlandino assumiu o risco de matar.

A própria delegada responsável pelo inquérito policial instaurado para apurar o caso, Magali Leite Cordeiro, não descarta a possibilidade de enquadramento do fazendeiro em homicídio doloso e ocultação de cadáver. Segundo ela, se for comprovada a intenção de matar intencionalmente, vai solicitar o pedido de prisão preventiva do fazendeiro.

O delegado regional explicou que a prisão preventiva não foi necessária até agora para evitar uma eventual fuga de Orlandino “porque em apenas dez dias não seria possível concluir um inquérito como esse, que tem que ser rigoroso”.

No entanto, a critério judicial, a prisão preventiva e o prazo da investigação podem ser prorrogados. Legalmente, o prazo para a conclusão das investigações é 30 dias, prorrogáveis por mais 30 dias.

Perícia é fundamental para esclarecer versões

Em casos de tiro à queima-roupa as áreas próximas ao disparo ficam impregnadas da pólvora que é usada para impulsionar a bala, e também de resíduos metálicos do cano da arma.O exame residuográfico é uma das técnicas de perícia mais comuns para se colher a materialidade do caso.

Por isso, o corpo de Reinaldo, que está enterrado na fazenda de Orlandino tomada pelos índios, tem de apresentar resíduos desses materiais, como a própria expressão “à queima-roupa” descreve. Se comprovada a intenção de matar, a pena do fazendeiro seria alta, inclusive por ser considerada como motivo fútil, o furto de peixes.

Questionado se a cerca de arame farpado a que se referiram os meninos, local onde Reinaldo teria se enroscado, continha pedaços de roupa, e se havia sangue nas suas proximidades, o delegado regional afirmou que ainda não houve tempo de fazer a perícia em toda a área, e que os peritos deverão voltar à fazenda agora ocupada pelos guaranis kaiowás.

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