Papa leva Igreja até periferia em primeira viagem à América Latina
Sair das periferias, ajudar os mais pobres, buscar justiça social, comprometer-se, “ir para a vida”: esta foi a mensagem do papa Francisco em sua primeira viagem à América Latina, onde recebeu elogios de analistas e de antigos expoentes da Teologia da Libertação. “Foi revolucionário para o que estávamos acostumados nos últimos 30 anos. Mas foi […]
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Sair das periferias, ajudar os mais pobres, buscar justiça social, comprometer-se, “ir para a vida”: esta foi a mensagem do papa Francisco em sua primeira viagem à América Latina, onde recebeu elogios de analistas e de antigos expoentes da Teologia da Libertação.
“Foi revolucionário para o que estávamos acostumados nos últimos 30 anos. Mas foi bem mais uma revolução dos gestos, Francisco não quer mudar a doutrina”, disse à AFP o teólogo Fernando Altermeyer, da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP).
“João Paulo II recorria ao coração. Bento XVI recorria ao cérebro. Francisco tem uma mensagem visceral, é como um soco no estômago”, explicou Altermeyer.
De acordo com o teólogo, “sua mensagem é descentralizar. Sair do centro e ir para as periferias, confortar as pessoas, compartilhar”.
Segundo o teólogo, Francisco “está ressuscitando” muitos pilares da Teologia da Libertação, “como a compaixão, a opção pelos mais pobres, as periferias, a cidadania participativa”.
A Igreja proposta pelo Papa argentino, de 76 anos, “não tem medo de abrir a porta, sair às ruas, dialogar, chegar às pessoas”, concordou Faustino Teixeira, professor de Ciência da Religião da PUC de Minas Gerais (PUC-MG).
Chamado de “Papa do povo”, Francisco se manteve fiel à sua alcunha e, nos últimos sete dias, abraçou carinhosamente centenas de fiéis, beijou crianças, tomou os chimarrões que lhe foram oferecidos enquanto passeava a bordo do papamóvel, brincou e falou com os moradores de uma favela do Rio usando uma linguagem direta, clara.
Figuras da Teologia da Libertação (TL), como o ex-sacerdote e teólogo brasileiro Leonardo Boff, condenado ao silêncio por João Paulo II, devido às suas posições radicais, manifestaram entusiasmo com o primeiro papa latino-americano da História, eleito em março em substituição ao agora emérito Bento XVI que, enquanto líder da Congregação para a Doutrina da Fé, combateu esta corrente teológica.
Passamos “de uma fortaleza para uma casa aberta”, festejou Boff em seu blog. “São novos ares, nova música, novas palavras para velhos problemas que permitem pensar uma nova primavera na Igreja”, longe do inverno eclesial dos últimos dois pontificados caracterizados pelo controle das doutrinas, afirmou.
“Não se apresenta como doutor, e sim como pastor. Fala a partir da prática, do sofrimento humano, da fome do mundo (…) Denuncia o fetichismo do dinheiro e o sistema financeiro mundial que martiriza países inteiros. Dessa postura, ele resgata as principais diretrizes da TL, sem precisar citar o nome”, continuou.
Neste domingo, o Papa pediu aos bispos latino-americanos que “amem a pobreza” e não ajam com seu rebanho com “psicologia de príncipes”.
Destacou também a importância do trabalho em pastorais e das comunidades eclesiásticas de base. “A Pastoral é o exército da maternidade da Igreja. Às vezes, nós nos esquecemos disso, e ela vira madrasta”, lamentou.
O Papa “atualizou a doutrina social da Igreja ao dizer que ‘a grandeza de uma sociedade é dada pelo modo como ela trata os mais necessitados’”, afirmou o frade dominicano Frei Betto, outro expoente da TL, em sua coluna no jornal O Globo.
“Francisco não é um pastor que ordena e impõe, e sim que abre horizontes e imprime entusiasmo. Há algo novo na barca de Pedro”, celebrou.
Durante encontro com cardeais e bispos brasileiros, o pontífice lembrou o Concílio Vaticano II (1962-1965), que adaptou a Igreja aos tempos modernos e mudou seu perfil fechado e doutrinário para uma Igreja pastoral, muito aplicado na América Latina.
Altermeyer lamentou o fato de que o pontífice não tenha mencionado o cardeal salvadorenho Oscar Romero, defensor dos pobres e dos direitos humanos, assassinado enquanto celebrava uma missa em 1980 e considerado um santo não-oficial na região.
“Faltou um pedaço, isso precisava ser dito”, afirmou o teólogo, embora acredite que o “pragmático” Francisco deva realizar “a tarefa hercúlea” de reformar a Cúria antes do final do ano e que, talvez, esteja “apenas esperando o momento certo” para fazê-lo.
“Ele foi eleito para reformar a Cúria e, aqui (na JMJ), ele recarregou suas baterias por um bom tempo”, estimou.
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