Clima de protestos influencia visita e discurso de papa no Brasil

O efervescente clima político do Brasil deve ser um ator importante na primeira visita do papa Francisco ao Brasil, a partir de 22 de julho, para a Jornada Mundial da Juventude. A cúpula da Igreja Católica brasileira já indicou que o papa deve mencionar a onda de protestos populares em seu discurso; ao mesmo tempo, […]

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O efervescente clima político do Brasil deve ser um ator importante na primeira visita do papa Francisco ao Brasil, a partir de 22 de julho, para a Jornada Mundial da Juventude.

A cúpula da Igreja Católica brasileira já indicou que o papa deve mencionar a onda de protestos populares em seu discurso; ao mesmo tempo, autoridades brasileiras antecipam mais manifestações durante a visita do pontífice.

Na segunda-feira, o cardeal Dom Odilo Scherer, arcebispo de São Paulo, dissera que o papa “certamente terá palavras para as questões levantadas pelos jovens (durante as manifestações), para as suas muitas insatisfações e seu desejo de mudanças”.

Reportagem do jornal espanhol El País afirma que o papa considerou as manifestações “coerentes com o evangelho” e que ele teria mudado seu discurso da Jornada Mundial da Juventude para abordar a onda de protestos.

O papa foi informado dos protestos pelo cardeal Dom Raymundo Damasceno, arcebispo de Aparecida, em visita a Roma. Segundo Dom Raymundo, o pontífice “vê tudo isso como como algo natural, num país democrático onde as pessoas podem e devem, às vezes, manifestar seus anseios” a seus governantes.

Na terça-feira, a Agência Brasileira de Inteligência (Abin) informou que há um “alerta vermelho” para protestos de “grupos de pressão” (espontâneos) e um “alerta laranja” para os movimentos “reivindicatórios” (organizados por categorias profissionais ou sociais) no período da Jornada, que deve reunir milhões de pessoas no Rio de Janeiro e em Aparecida do Norte (SP).

Alguns grupos já anunciaram a organização de protestos para coincidir com a visita do papa – um deles para questionar os gastos públicos que ajudaram a financiar a própria Jornada Mundial da Juventude. É possível que o roteiro do pontífice seja alterado para garantir a segurança – algo que o Vaticano negou.

Em entrevista coletiva na quarta-feira, o porta-voz da Santa Sé, Federico Lombardi, disse que o papa Francisco dispensará o “papa-móvel” blindado durante sua passagem pelo Brasil e “confia na habilidade das autoridades brasileiras em lidar com a situação (de eventuais protestos)”, informou a agência France Presse.

Tônica social

O tom do discurso papal deve refletir o atual momento e a tônica, adotada desde o início de seu pontificado, de enfatizar as políticas sociais voltadas à população mais carente, diz à BBC Brasil André Ricardo de Souza, estudioso da religião no departamento de sociologia da Universidade Federal de São Carlos (UFSCAR).

“Esse é o foco do discurso dele. Não o imagino fazendo críticas diretas ao governo, mas sim focando os mais pobres e necessitados, com uma mensagem social forte”, diz Souza.

Para Paulo Fernando Carneiro de Andrade, do Centro de Teologia e Ciências Humanas da PUC-RJ, uma prévia disso foi observada no discurso do papa durante sua visita, no início do mês, à ilha italiana de Lampedusa – por onde muitos imigrantes irregulares tentam entrar na Europa.

Na ocasião, o papa fez uma crítica à “globalização da indiferença” ante o drama dos imigrantes.

A CNBB (Conferência Nacional dos Bispos do Brasil) afirmou também que o papa, como argentino, é um “conhecedor do contexto social” latino-americano e que isso deve se refletir em suas declarações durante a passagem pelo Brasil.

Contexto

Além dos protestos, há outros fatores importantes que contextualizam a atual visita, como a queda na proporção de católicos no Brasil – o maior país católico do mundo – e a tentativa da igreja a reagir aos escândalos de corrupção e pedofilia.

Poucas semanas antes da Jornada Mundial da Juventude, o papa Francisco decretou mudanças nas leis do Vaticano, alterando seu código penal para tipificar crimes sexuais (incluído o de pedofilia) e financeiros (como o de lavagem de dinheiro).

Todo esse contexto cria um “momento singular” para a visita do papa, afirma Carneiro de Andrade, num momento em que a igreja faz aceno à juventude para estancar perda de fiéis.

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