O apetite da China por recursos naturais continua grande, mas as investidas do país no exterior já não se limitam à projetos ligados à extração e obtenção de matéria-prima que, num passado recente, chegaram a elevar o Brasil ao topo da lista dos países que mais receberam investimentos diretos dos chineses.

No que alguns economistas definem como uma “nova onda”, os investimentos chineses no exterior estão mais diversificados, com maior participação de empresas privadas, revelando uma aposta em setores como imobiliário e de tecnologia e foco em países ricos.

Nesse cenário, os investimentos diretos chineses no Brasil, após atingirem seu ponto máximo em 2010, vem sofrendo queda desde então, segundo o levantamento China Global Investment Tracker, do centro de pesquisas Heritage Foundation, em Washington.

De acordo com o levantamento, que só leva em conta investimentos de mais de US$ 100 milhões e não inclui títulos públicos, em 2010 o Brasil foi o principal destino de investimentos diretos chineses, com US$ 13,7 bilhões.

Em 2011, o montante caiu para US$ 8,63 bilhões. No ano passado foram US$ 3,37 bilhões e neste ano, até agora, menos de US$ 1 bilhão.

“A concentração de investimentos no Brasil fez parte de um ciclo (?)”, disse à BBC Brasil o economista Derek Scissors, especialista em China do American Enterprise Institute e um dos responsáveis pelo levantamento da Heritage Foundation.

Destinos

Scissors lembra que, em 2006, a China concentrava seus investimentos na . Dois anos depois, o foco era a África Subsaariana, destino substituído pelo Brasil a partir de 2010.

Nos últimos dois anos, observa Scissors, a China tem investido pesadamente nos EUA e no Canadá.

“É um movimento normal, é assim que a China costuma agir. Concentra investimentos em uma região e, passado algum tempo, parte para outra”, afirma.

Segundo a Heritage, se somado o total acumulado desde 2005 o Brasil é o quarto principal destino de investimentos da China, com US$ 28,2 bilhões.

O ranking é liderado pela Austrália (US$ 58,2 bilhões), seguida por EUA (US$ 57,6 bilhões) e Canadá (US$ 37,6 bilhões).

Mudança

O economista Claudio Frischtak, consultor do Conselho Empresarial Brasil-China (CEBC), observa que até 2010 os investimentos chineses no Brasil foram caracterizados pela concentração em matérias-primas, principalmente petróleo e gás.

Empresas chinesas investiram em projetos de produção agrícola, exploração de petróleo, construção de dutos, iniciativas com o objetivo de expandir e dinamizar o complexo exportador brasileiro.

“A grande mudança após 2010 é a tentativa das empresas chinesas, ainda em curso, de diversificação e basicamente de estabelecer uma plataforma de manufaturas no Brasil”, disse Frischtak, que é coautor de um relatório do CEBC que analisa os investimentos chineses no Brasil entre 2007 e 2012.

“Mas minha percepção é de que já houve mais entusiasmo das empresas chinesas em relação ao Brasil”, afirma.

Frischtak cita reclamações de empresas chinesas sobre problemas como a estrutura tributária complexa do Brasil, carga tributária pesada e restrições à entrada de mão de obra estrangeira.

“Hoje, do ponto de vista de atrair investimento chinês para o Brasil, a bola está muito mais com a gente do que com os chineses”, diz Frischtak.

“Está muito mais no sentido de melhorar nosso ambiente de negócios, reduzir custos, melhorar nossa , fazer o país mais atraente como um todo”, afirma, lembrando que os problemas também afetam os próprios investidores brasileiros.

Tendências

Segundo o analista Thilo Hanemann, especialista em China do Rhodium Group, a diversificação dos investimentos chineses e o crescente interesse nos EUA estão relacionados às mudanças em curso na economia do país asiático.

“Muitas empresas sofrem pressão para aumentar sua competitividade, melhorar sua tecnologia, expandir para mercados globais e diversificar seus negócios. Tudo isso levou ao atual interesse nas economias desenvolvidas”, disse Hanemann.

“Apesar disso, ainda há um forte interesse em commodities. Petróleo, gás e agricultura vão continuar sendo parte importante dos investimentos chineses no exterior”, observa.

Hanemann diz que as empresas chinesas estão investindo em recursos naturais também nos países desenvolvidos, principalmente EUA, Canadá e Austrália, onde encontram “acesso a esses recursos aliado a um ambiente político estável”.

Outra tendência é o interesse no setor manufatureiro e de serviços e em setores que proporcionem segurança e possibilidade de lucros altos. Hanemann cita o crescente interesse dos chineses no setor imobiliário de cidades como Nova York.

“Vamos registrar um novo recorde de investimentos diretos chineses nos EUA neste ano. Até o momento, estamos em US$ 12 bilhões. E é uma tendência que deve continuar, está apenas começando”, afirma Hanemann.

Para Scissors, porém, a concentração nos EUA deve durar pouco, assim como os ciclos anteriores. Ele aposta na como próximo destaque nos investimentos chineses. E não descarta um retorno com força ao Brasil, no futuro.

“Não acho que vamos ver um aumento de investimentos chineses no Brasil em 2014 ou 2015. Mas o ciclo vai continuar”, diz.

“Acredito que antes do fim da década pode haver um novo salto nos investimentos chineses no Brasil.”