Câmara estuda cota entre deputados, mas ignora número de candidatos negros
A Câmara dos Deputados começou a estudar a reserva de cadeiras de deputados estaduais e federais para negros sem conhecer o número de candidatos afrodescendentes que disputaram as eleições de 2010. Até o último pleito, o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) não incluía o item raça/cor na ficha de registro de candidaturas. Na última quarta-feira, a […]
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A Câmara dos Deputados começou a estudar a reserva de cadeiras de deputados estaduais e federais para negros sem conhecer o número de candidatos afrodescendentes que disputaram as eleições de 2010. Até o último pleito, o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) não incluía o item raça/cor na ficha de registro de candidaturas.
Na última quarta-feira, a Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara aprovou a admissibilidade da Proposta de Emenda à Constituição (PEC) que cria uma reserva de cadeiras de deputados referente a dois terços do percentual da população que se declarou preta ou parda no último Censo (50,7%). Nos números de hoje, o percentual representaria 173 dos 513 deputados federais. A proposta estipula que o número de cadeiras não pode ser inferior a 20% da composição da Casa ou superior a 50%.
A PEC ainda precisa passar por uma comissão especial, pelo plenário da Câmara (em dois turnos) e, posteriormente, remetida ao Senado. Uma lei eleitoral precisa ser aprovada até um ano antes da eleição para entrar em vigor – portanto, não há mais possibilidade de vigorar em 2014.
A intenção da proposta é aumentar a presença dos cidadãos autodeclarados preta ou parda – que representam 50,7% da população – na política. Na Câmara, o número de deputados negros gira em torno de 8%. Segundo o autor da proposta, o deputado Luiz Alberto (PT-BA), a proposta, se prosperar, vai obrigar partidos a entrar na disputa pelas cadeiras destinadas aos negros. Pelo projeto, cada eleitor teria direito a dois votos: um na lista geral de candidatos e outro específico para candidatos que se declaram afrodescendentes.
“O partido que não disputar a essas cotas, ele vai entrar perdendo. Então, ele vai ter quase que obrigação de entrar nessa disputa. É uma opção política”, disse o deputado.
A proposta é diferente do que foi feito para tentar incluir mulheres na política, quando a legislação passou a prever um mínimo de 30% de mulheres na lista de candidatos dos partidos políticos. Em 2012, no primeiro pleito com a regra em vigor, o número de mulheres eleitas vereadores representou 13% do total.
Para Luiz Alberto, estabelecer cotas de candidaturas “não tem efeito prático”. Apesar de desconhecer o número de candidatos afrodescendentes nas últimas eleições, Alberto afirma que o déficit de negros no Parlamento não ocorre por falta de opções ao eleitor.
“Não tem como não preencher as vagas. Não temos esse dado computado, de quantos candidatos negros disputaram a eleição, mas não é por falta de candidatos que eles não conseguem alcançar a vaga. Essa hipótese de sobrar vaga não existe”, afirmou, ao ser questionado se a proposta previa a eventualidade de os Estados não preencherem todas as cadeiras.
Para o deputado, o problema está no racismo, que atinge até mesmo a consciência dos negros. Na Bahia, segundo ele, apenas quatro dos 39 deputados se autodeclaram afrodescendentes, apesar de a população ser predominantemente negra.
“O racismo atinge a consciência das pessoas, tanto brancos e negros. O racismo impõe à população negra uma espécie de inferiorização, em relação à disputa de poder, que impede de fazer um movimento no sentido de defender seus interesses de forma mais objetiva”, disse Alberto.
Divergências
A matéria defendida pelo Partido dos Trabalhadores (PT) recebeu algumas manifestações contrárias na Comissão de Constituição e Justiça da Câmara. Os deputados, até agora, só definiram que a proposta atende a requisitos mínimos para tramitar na Câmara, mas o mérito do texto ainda não foi analisado.
Durante a sessão, o deputado Marcos Rogério (PDT-RO) criticou a inclusão de apenas um segmento na PEC. Para ele, se forem aprovadas cotas para afrodescendentes, os deputados teriam de discutir reserva de cadeiras para outras minorias, como deficientes físicos, indígenas e outras categorias.
“O Brasil vem se tornando o país das cotas. Eu penso que o debate é importante, mas não dá para fazê-lo de forma a incluir apenas esse segmento, que já temos uma representação no Parlamento bastante alta por mérito das pessoas que representam o país neste parlamento. Nenhum negro que aqui atua se sente menor do que nenhum outro porque aqui (ele) não é (menor)”, disse.
Para o ex-ministro do TSE Marcelo Ribeiro, o projeto pode desvirtuar a representação popular no Legislativo. “Acho que podem ser feitas ações afirmativas a favor de pessoas de cor negra outros tipos de ações, discutir cotas para universidade, viabilizar melhor a participação dos afrodescendentes na sociedade, para que possam estudar mais, ingressar na faculdade, melhorar a integração na sociedade. (…) Agora, estabelecer que o cidadão vai ser representante por uma cota, vai precisar de menos votos para ser representante. Isso vai desvirtuar a representação popular”, opinou.
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