Em seu livro de estreia para o público adulto, a inglesa J.K. Rowling, autora da série “Harry Potter”, arrisca-se a abordar temas mais difíceis, mas não perde os adolescentes de vistas. São eles que movem a trama de “Morte Súbita”, romance lançado no Brasil pela editora Nova Fronteira.

O primeiro trabalho de Rowling depois de encerrar a série que lhe rendeu fama e fortuna concentra-se nos acontecimentos impulsionados pela morte de um conselheiro de uma pequena vila no da Inglaterra.

O tal conselheiro sofre uma morte natural, mas isto repercute na vida de diversos personagens –da garota pobre que ele incentivava a participar da equipe de remo da escola ao presidente do conselho da cidadezinha, que se alegra com o desaparecimento de seu oponente na luta por passar um bairro de periferia à jurisdição de outro município.

É principalmente em torno desta disputa que a narrativa se estrutura, opondo os defensores da separação do bairro pobre de Fields do distrito de Pagford aos que lutam para que a região continue desfrutando dos benefícios que a cidadezinha oferece.

Apesar de o livro não eleger um protagonista, são três adolescentes os responsáveis pelos desdobramentos mais dramáticos da trama, que acabam afetando de alguma forma todos os personagens.

Por motivos diferentes, mas sempre como uma vingança contra os pais, os garotos Andrew e Bola e a menina Sukhvinder invadem o site do conselho distrital e, usando o nome do conselheiro morto, deixam mensagens que mancham as reputações de seus genitores, envolvidos na eleição para a vaga deixada pelo morto. Seus atos têm consequências maiores do que os jovens esperavam e acabam colocando de cabeça para baixo o mundo dos adultos.

Rowling, que construiu sua popularidade com a história de um garoto órfão, também não poupa os personagens de “Morte Súbita” de histórias trágicas, desta vez, sem a mágica como solução. As 500 páginas do livro trazem um desfile de temas sociais, desde a degradação de uma família por conta do vício da mãe em heroína até uma cena de abuso sexual apresentada quase como algo corriqueiro naquele ambiente, passando pelo transtorno obsessivo compulsivo do vice-diretor da escola local, que em seus delírios teme ser um pedófilo.

Não faltam também a garota vítima de bullying, que se autoflagela para substituir a dor emocional pela dor física; um pai violento, que bate na mulher e nos filhos; e até algumas mortes estúpidas de personagens inocentes, que vão permitir uma espécie de redenção para outros, mas que deixam o leitor com uma sensação amarga de inutilidade.

Outro ponto que chama a atenção é o interesse da autora em introduzir a temática sexual sempre que possível. A impressão é de que Rowling coloca aqui todo o conteúdo que jamais poderia ter usado nos livros da série “Harry Potter”, onde a sexualidade é algo quase ausente.

Em “Morte Súbita”, por sua vez, a escritora não se acanha em apresentar desde cenas de entre adolescentes até as fantasias dos adultos, algumas vezes direcionadas a personagens bem mais jovens –como no caso de uma mãe suburbana que começa a ter fantasias com o líder da banda preferida da filha.

Ainda assim, o novo livro de Rowling se aproxima de sua criação mais famosa especialmente na criação dos personagens, sempre descritos de forma detalhada mas cômica, que quase os transformam em caricaturas, algo bastante comum na série “Harry Potter”.

O formato parece estar agradando: desde seu lançamento, em 5 de dezembro, “Morte Súbita” já vendeu mais de 250 mil exemplares, de acordo com a editora Nova Fronteira, um ritmo de cerca de 5 mil cópias por dia.