As pessoas mais felizes do mundo não estão no Qatar, o país mais rico. Não estão no Japão, o país com a maior expectativa de vida. Nem no Canadá, que tem alto percentual de pessoas com curso superior, mas não aparece no Top 10. Uma pesquisa divulgada na quarta-feira (19) e realizada com mais de 150.000 pessoas em todo o mundo, revela que sete dos 10 países com as atitudes mais otimistas ficam na América Latina.

Muitos dos sete têm classificações ruins em medidas tradicionais de bem-estar. Um exemplo é a Guatemala, país dilacerado por décadas de guerra civil, seguida por ondas de violência criminal que lhe dão uma das maiores taxas de homicídio do mundo. A Guatemala fica uma posição acima do Iraque no Índice de Desenvolvimento Humano das Nações Unidas (medida que classifica um país levando em conta expectativa de vida, educação e renda per capita). Mas é o sétimo em emoções positivas.

“Na Guatemala, existe uma cultura de pessoas amigáveis que estão sempre sorrindo”, disse Luz Castillo, 30, um instrutor de surf. “Apesar de todos os problemas que estamos enfrentando, estamos cercados por uma beleza natural que nos permite ficar longe de tudo isso.”

O Gallup Inc. fez entrevistas em mais de 148 países do mundo no ano passado perguntando se foram respeitados, sorriram ou riram muito, aprenderam ou fizeram algo interessante no dia anterior.

No Panamá e Paraguai, 85% dos entrevistados disseram sim a todas as cinco perguntas, colocando os países no topo da lista. Eles foram seguidos de perto por El Salvador, Venezuela, Trinidad e Tobago, Tailândia, Guatemala, Filipinas, Equador e Costa Rica.

As pessoas com menor probabilidade de relatar emoções positivas vivem em Cingapura, a rica ordeira cidade-Estado que está entre as mais desenvolvidas do mundo. Outros países ricos também se classificaram surpreendentemente mal na lista. A Alemanha e a França empataram com o Estado africano da Somália em 47º lugar.

Nações prósperas podem ser profundamente infelizes, enquanto as atingidas pela pobreza são muitas vezes cheias de positividade.

Esse é um paradoxo com sérias implicações para um campo relativamente novo e controverso chamado de economia da felicidade, que busca melhorar o desempenho do governo, acrescentando percepções de satisfação das pessoas a métricas tradicionais, tais como expectativa de vida, renda per capita e taxas de graduação.

O primeiro-ministro britânico David Cameron anunciou um programa de bem-estar nacional em 2010 como parte de um compromisso para melhorar a vida dos britânicos após a recessão global. A pesquisa domiciliar enviada para 200.000 britânicos fazia perguntas como: “Quão satisfeito você está com a sua vida hoje em dia?”

A Organização para a Cooperação Econômica e Desenvolvimento, que reúne 34 dos países mais avançados do mundo, recentemente criou um Índice de Vida Melhor que permite que o público compare os países com base na qualidade de vida que vai além do bem-estar material.

Alguns especialistas dizem que esse é um caminho perigoso que poderia permitir que governos usem percepções positivas como uma desculpa para ignorar problemas. Como um exemplo dos riscos, alguns disseram que a pesquisa Gallup pode ter sido desviada por uma tendência cultural latino-americana de evitar declarações negativas, independentemente de como o indivíduo se sente realmente.

“Minha reação imediata é pensar que a pesquisa foi influenciada por um perfil cultural”, disse Eduardo Lora, que estudou a medição estatística de felicidade como o ex-economista chefe do Banco Interamericano de Desenvolvimento. “O que a literatura empírica diz é que algumas culturas tendem a responder a qualquer tipo de pergunta de uma forma mais positiva”, disse Lora, natural da Colômbia, o 11º país mais positivo do mundo.

Entre os nove países menos positivos, há poucas surpresas, como o Iraque, Iêmen, Afeganistão e Haiti. Para outros, como a Armênia, a infelicidade é algo um pouco mais efêmero.

“Sentir-se infeliz é parte da mentalidade nacional por aqui”, disse Agaron Adibekian, um sociólogo que vive na capital da Armênia, Yerevan. “Os armênios gostam da melancolia. Tivemos muitos anos de agitações. Os americanos mantêm seus sorrisos e evitam compartilhar seus problemas com os outros e os armênios se sentem envergonhados do sucesso.”

Os Estados Unidos ficaram em 33º lugar. As maiores economias da América Latina, o México e o Brasil, ficaram 20 posições mais abaixo na lista.

Jon Clifton, um dos sócios do Gallup, reconheceu a tendência cultural em expressar emoções positivas ou negativas. Mas ele disse que os céticos não devem subestimar a expressão de emoções positivas como um fenômeno importante em si mesmo.

“Essas expressões são uma realidade, e isso é exatamente o que estamos tentando quantificar”, disse ele. “Eu acho que há maior emocionalidade positiva nesses países.”

Alguns latino-americanos disseram que a pesquisa atingiu algo fundamental sobre seus países: o hábito de se concentrar em coisas positivas, como amigos, família e religião, apesar da dificuldade de suas vidas diárias.