A família da adolescente Gabriela Yukari Nichimura, morta ao cair de um brinquedo no Hopi Hari, na última sexta-feira (24), vai pedir R$ 2 milhões de indenização ao parque de diversões, segundo o advogado Ademar Gomes, que representa a família. Outro pedido de indenização, no valor de R$ 1 milhão, será apresentado contra o município de Vinhedo, no interior paulista, onde fica o parque.

“Nós vamos pedir R$ 2 milhões de indenização por danos morais e materiais ao parque e também R$ 1 milhão à Prefeitura de Vinhedo, que permitiu que um parque desse porte funcionasse sem a devida manutenção”, disse Gomes nesta quinta-feira (1º).

Ainda segundo Gomes, os danos materiais estão relacionados a despesas com o enterro e a estada da família no Brasil por mais tempo que o previsto –eles moram no Japão e, inicialmente,  voltariam ao país no dia 17 de março.

De acordo com o advogado, a foto apresentada pela família, que mostra o verdadeiro assento no qual a garota estava, é “determinante” para o processo. Ele disse que vai pedir que os responsáveis sejam indiciados por homicídio doloso. “Eu entendo que houve dolo eventual. Eles poderão ir a júri inclusive, porque sabiam que aquele assento não poderia ser usado. Segundo eles, aquela cadeira estava desativada.”

A assessoria de imprensa do Hopi Hari foi procurada pelo UOL, mas ainda não comentou as declarações. Já a Prefeitura de Vinhedo informou, em nota, que ainda não foi notificada, mas que “o lamentável episódio aconteceu dentro de um espaço privado e que o município de Vinhedo, sob o aspecto legal, não tem responsabilidade”. A prefeitura informou ainda que está colaborando com as investigações.

Entrevista dos pais
As informações foram dadas pelo advogado durante entrevista coletiva concedida pelos pais da garota em São Paulo. A mãe da adolescente, Silmara Nichimura, disse que não viu como a menina entrou em uma cadeira que deveria estar interditada.

“Minha filha era uma menina de 14 anos, em um parque. Ela estava totalmente feliz. Então, quando abriram os portões da nossa vez, ela e minha sobrinha saíram correndo. Quando eu cheguei com meu marido, nós ocupamos as duas cadeiras que sobraram e também já puxamos [a trava]. Então, na verdade, eu não posso dizer, porque ela chegou e sentou antes que eu chegasse.”

De acordo com o pai da adolescente, Armando Nichimura, eles não foram os primeiros a usar o brinquedo no dia acidente, mas também ele também não viu se a cadeira já havia sido usada por outra pessoa. “[Antes de entrar] nós estávamos do outro lado do brinquedo, então a gente não tinha visão. Nós usamos o brinquedo na terceira ou quarta rodada do dia”, disse.

Silmara disse não entender por que não havia um funcionário para checar, antes da subida, se as travas estavam presas de fato. “Nós moramos no Japão há 19 anos, já fui em muitos parques lá. Toda vez que sentamos em um brinquedo, vem um funcionário e checa cada brinquedo, faz essa inspeção na hora, com cada um. Mas com a gente não foi feito isso aqui no Brasil. E eu perguntei pra várias pessoas. Esse procedimento não é feito no Brasil ou não é feito no Hopi Hari? Mas ninguém me respondeu”, disse.

“Falta de respeito”
Silmara disse esperar que o parque seja fechado definitivamente. “A minha vontade seria [fechar o parque] definitivamente. Mas isso eu tenho certeza que não vai acontecer (…) Eu não falo só pela minha filha, eu falo pela população. Porque hoje foi minha filha, mas amanhã poderia ser qualquer pessoa. E outra coisa que eu não aceito, que eu não admito, que é algo que está doendo no meu coração, é que no dia do enterro da minha filha o parque estava aberto. Isso é uma falta de respeito não só comigo, mas com a minha filha e com a sociedade.”

“Vai ser difícil voltar”
A mãe disse que, apesar da dor que sente agora, o mais difícil vai ser voltar para o Japão. “Pra mim, vai ser muito difícil chegar lá. Aqui não tem as minhas coisas. Lá é minha vida. Tem o quarto da Yukari, tem as coisas da Yukari. A minha vida é ali. Então pra mim vai ser muito difícil caminhar por aqueles lugares.” Segundo Silmara, o sonho da filha era ser jornalista em Tóquio.

“Erro crasso”
O advogado do parque de diversões, Alberto Toron, admitiu pela primeira vez, nesta quinta-feira (1º), que pode ter havido um “erro crasso” na operação do brinquedo La Tour Eiffrel. Segundo ele, o parque vai firmar na tarde de hoje um TAC (Termo de Ajustamento de Conduta) com o Ministério Público para que o local seja fechado ao público e inspecionado. Além do MP, também devem participar representantes do Crea (Conselho Regional de Engenharia e Agronomia). 

Toron, que informou que a cadeira usada pela vítima estava inativa havia dez anos por um problema técnico, disse que o acidente pode ter sido resultado da falha de algum funcionário da operação ou da manutenção. “Talvez alguém tenha aberto inadvertidamente a trava da cadeira que não deveria funcionar. Mas se isso acontecesse, o funcionamento do brinquedo deveria ter sido imediatamente interrompido”, afirmou.

O advogado ressaltou que os funcionários do parque passam por treinamento para operação e manutenção dos brinquedos, mas reconheceu que o caso de sexta aponta para um “erro crasso”. “Estamos investigando e queremos que eventuais culpados sejam responsabilizados.”

Para o delegado Álvaro Santucci Noventa Júnior, o inquérito vai apurar a hipótese de dolo eventual, ou seja, quando o responsável, ainda que não intencionalmente, assume um risco. Somente agora, após o acidente, o parque admite ser necessária alguma faixa ou outro tipo de barreira para impedir o acesso do público àquela cadeira.

Conforme Santucci, isso é reforçado também pela ausência de barreira à cadeira danificada e pela forma de operação de funcionários que não interrompeu, durante o funcionamento, o brinquedo. “Além de negligência, foi imprudência não haver um aviso de interdição, disse.

Hoje, tanto o delegado quanto o advogado do parque disseram ter sido surpreendidos pela foto divulgada ontem pela familia – na qual Gabriela aparece na extremidade do brinquedo. Até então, a informação era a de que a adolescente estava na segunda cadeira da direita para a esquerda.

Trava abre durante descida

Ontem, após o depoimento da mãe da menina, que apresentou fotos de minutos antes do acidente, o delegado e o promotor Rogério Sanches Cunha, concluíram que a primeira inspeção havia sido feita na cadeira errada e que o assento onde realmente estava Gabriela deveria estar interditado.

“A cadeira era inoperante há anos, o parque não nega. O que o parque talvez quis negar em um primeiro momento era que alguém havia sentado nela.” O promotor diz que as fotos mostram Gabriela “sentando e subindo na cadeira inoperante”.

Após a descoberta do erro, o delegado determinou uma nova perícia no brinquedo e foi constatado que a trava da cadeira certa abre durante a queda do elevador. “(Constatou-se) que, na descida, quando a atração é colocada em atividade, aquela trava se levanta quando está em queda livre”, afirmou ele.

Segundo o delegado, a confusão aconteceu porque, no dia do acidente, uma testemunha disse que a menina estaria em outra posição.

“Apuramos inúmeras falhas que acabaram, em uma sucessão de erros, provocando a morte da Gabriela”, disse o promotor Cunha. “A partir do momento em que o parque reconhece que aquela cadeira é inoperante, ele sabe que aquela cadeira tem problemas mecânicos. Então não é que houve falha mecânica, a falha na cadeira já era previsível. O que houve foi uma falha humana em não se impedi-la de entrar naquela cadeira”, afirmou.

De acordo com o promotor, a menina levantou sozinha a trava do assento interditado –que não contava com nenhum aviso– e entrou em “uma verdadeira arma”. “Hoje praticamente trabalhamos com a certeza de que, no momento da frenagem ou talvez um pouco antes, por falta de força de ficar se segurando, ela efetivamente caiu, pendendo o corpo para frente. Essa menina entrou em uma verdadeira arma, em um brinquedo que era fatal”, disse Cunha.