Em época de eleição, as disputas judiciais não se restringem mais apenas às trocas de acusações entre partidos, candidatos e suas campanhas. O crescimento do acesso à internet no País, ao mesmo tempo em que aumentou o espaço para o debate sobre política, também faz com que portais, sites, blogs e até provedores de internet se tornem alvos na Justiça Eleitoral. São cada vez mais comuns os pedidos de remoção de conteúdo considerado ofensivo por candidatos, que têm encontrado respaldo no Judiciário.

Apesar de os casos de multa contra o Google – por não remover conteúdos do ar – ganharem destaque nessas eleições, o problema faz parte da rotina diária da empresa desde as eleições de 2008, de acordo com a diretora jurídica Fabiana Siviero. A posição do gigante da internet tem sido a mesma, segundo ela: lutar até a última instância para manter o material e garantir a liberdade de expressão dos usuários. “Vivemos em uma democracia”, justificou.

Entre as ações mais recentes contra a empresa, estão o caso do vídeo do vereador de Maceió, Ronaldo Lessa (PDT), e do vereador de São Paulo Francisco Chagas Franciliano (PT). Ambas publicações foram consideradas difamatórias pelos TREs. O Google se recusou a remover os vídeos do Youtube, mesmo sujeito a multa. “O Google entende que deve existir liberdade eleitoral para todo mundo, até para os candidatos. Nas eleições, a liberdade de expressão é ampliada”, disse Fabiana.

Segundo ela, existe uma especial dentro do Google para o recebimento e análise desses materiais. “Entender o conteúdo, ver se ele é válido ou se não tem o porquê ficar no ar”, explicou. Em casos de uso de palavras de baixo calão, ataques pessoais sem informações relevantes e ausência de conteúdo político, Fabiana disse que o material é avaliado como de “caráter abusivo” e retirado da internet.

Para pressionar o Google, os TREs de Maceió e São Paulo impuseram multa de R$ 30 mil e R$ 5 mil por dia, respectivamente. Fabiana lembrou que a empresa passou por casos semelhantes em 2010, em um deles estava envolvido Netinho de Paula (Psol), na época candidato a senador. “Tivemos uma representação do Netinho para a remoção de um vídeo. Ele ganhou em primeira instância e tivemos multa de R$ 50 mil por dia. Recorremos ao TSE e o ministro Gilmar Mendes reconheceu que o vídeo era crítico, mas que não era ofensivo e não devia ser retirado”, contou.

Para a diretora do Google, a internet é uma das plataformas mais importantes no regime democrático. “A informação não fica sob controle das empresas, qualquer pessoa pode publicar ideias, vídeos e informações. A informação está nas mãos das pessoas”, disse. “O candidato pode usar a web para responder e esclarecer as dúvidas dos eleitores. E não mandar remover o conteúdo e tirar o acesso da população à informação”, enfatizou.

Calúnia e difamação

Antes de um comunicado chegar ao Google, existe uma série de procedimentos legais. De acordo com a porta-voz do Tribunal Regional Eleitoral de São Paulo (TRE-SP), Eliana Passarelli, o candidato entra no TRE com uma representação baseada na legislação eleitoral. O pedido é julgado por um juiz, “se ele entende que um vídeo se caracteriza em calúnia e difamação, pede para tirar do ar”, explicou. “São muitos casos, eu não me recordo de nenhuma decisão em que foi negada a retirada do conteúdo para o candidato”, acrescentou.

Segundo a porta-voz, a partir do momento da escolha dos candidatos, com base na legislação eleitoral, fica assegurada a manifestação em relação a materiais que contenham “injúria e informação sabidamente inverídica”. Ela, porém, garantiu que o debate político é permitido, “só não pode resvalar para o ataque pessoal”. “O juiz analisa até que ponto está dentro da discussão política ou se aquilo se extrapolou”, concluiu.

A decisão cabe recurso e é por este direito que o Google recorre. “Não é que o Google está descumprindo a lei, mas estamos usando nosso direito, garantido pela Constituição, de recorrer. Se a gente perder em última instância, a gente retira”, afirmou Fabiana.

A diretora ainda lembrou uma decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) que vetou a censura ao humor durante campanha eleitoral e liberou o uso de montagens, trucagens e veiculação de opiniões sobre candidatos e partidos, a pedido da Associação Brasileira de Emissoras de Rádio e Televisão (Abert). As restrições estavam previstas em legislação de 1997, e foram derrubadas pelo STF durante as eleições de 2010.

Eleições 2012 na web

Segundo o gerente de planejamento estratégico digital, Felipe Morais, “não tem como pensar em uma campanha política hoje, sem citar a campanha de Barack Obama em 2008”. Morais ressaltou a repercussão dos conteúdos na web, mas alertou que “todo o controle na internet não tende a dar muito certo. Como dizemos no mercado, escreveu na web, escreveu na pedra, ou seja, fica para a eternidade. Por mais que o político delete uma publicação, alguém terá ela guardada em um blog ou em um tweet”, explicou.

Morais ainda reforçou de que quando se tenta calar as pessoas no meio virtual, “elas se juntam em uma força maior, se conectam com muita rapidez e não tem como ninguém ou nenhuma empresa censurar”. Com experiência em mais de 30 campanhas para prefeito, vereador e deputados, o marqueteiro político Justino Pereira cito como importante “que os políticos ouçam o que as pessoas pensam deles e quais são as propostas que elas creem ser boas para resolver os problemas das cidades”.

Pereira prega a democracia virtual dentro do que é válido na vida real: “se o argumento é político e não é ofensivo, preconceituoso ou incitador de ódios, não tem porque ser retirado. Faz parte do jogo democrático”, disse. “A liberdade à expressão é a garantia de veiculação da verdade, o extremo oposto à injúria e à calúnia, que estão no campo da mentira. O exercício da liberdade não necessita de calúnias ou difamações”, concluiu.