Um dia após receber uma sentença de um ano de prisão por fraude fiscal, o ex-primeiro-ministro italiano Silvio Berlusconi, de 76 anos, atacou as políticas econômicas do atual governo e ameaçou retirar o apoio de seu partido, manobra que poderia forçar eleições antecipadas no país.

Em entrevista coletiva ao lado de seu advogado, em Milão, Berlusconi disse que a administração do premiê Mario Monti estava levando a Itália a uma “espiral de recessão” e que seu partido decidirá nos próximos dias se mantém ou não seu apoio ao governo.

Monti foi escolhido para compôr um novo gabinete em meio ao agravamento da crise no país e a renúncia de Berlusconi.

Com um perfil tecnocrático, ele não foi eleito por voto direto e deveria permanecer no poder para conduzir uma série de ajustes orçamentários até as próximas eleições regulares.

O Partido da Liberdade (PDL), comandado por Berlusconi, é o maior do Parlamento italiano. Se o governo atual perder seu apoio, o país pode ter que convocar eleições mais cedo.

O ex-premiê havia sido sentenciado inicialmente a quatro anos de prisão, mas a pena foi posteriormente reduzida para um ano pelas acusações de ter inflacionado o preço das distribuições de direitos comprados por seu grupo midiático Mediaset para sonegar impostos.

Ele deve recorrer da decisão judicial.

“Obrigado” a ficar

A fala de Berlusconi na manhã deste sábado chega ao mesmo tempo em que milhares de manifestantes protestaram em Roma contra as medidas de austeridade implementadas pelo governo de Monti.

Analistas acreditam que o ex-premiê deve investir no clima de insatisfação popular com os cortes e aumentos de impostos para retornar ao cenário político.

Ele ausou Monti de colocar em prática uma “extorsão fiscal” do povo italiano durante a crise da zona do euro.

“Nós precisamos reconhecer o fato de que a iniciativa do governo é uma continuação da espiral de recessão da nossa economia. Ao lado de meus colaboradores vamos decidir nos próximos dias se é melhor retirar imediatamente nossa confiança neste governo ou mantê-la, dado que as eleições já estão agendadas”, disse.

As últimas eleições italianas ocorreram em 2008 e as próximas estão marcadas para 2013.
Mais cedo, Berlusconi disse que sente-se “obrigado” a permanecer na política, embora não tenha confirmado que se candidatará novamente ao cargo de premiê.

Ele manifestou o interesse de “reformar o sistema judiciário para que o que aconteceu comigo não aconteça a outros cidadãos”.

Em um claro ataque ao Judiciário, disse que a Itália “não é uma democracia, mas sim uma ditadura dos juízes”.

Caso

Apesar dos vários processos que tramitam contra ele, esta é a primeira vez que Berlusconi é condenado à prisão.

No entanto, espera-se que o ex-premiê recorra da decisão. Segundo o correspondente da BBC em Roma, David Willey, é pouco provável que Berlusconi seja preso, já que a sentença só pode ser executada após confirmação por dois tribunais de apelação.

O caso pelo qual Berlusconi foi condenado se refere à compra de direitos de exibição de filmes americanos por suas várias redes de TV. Berlusconi e outros réus são acusados de inflar artificialmente os preços dos direitos desses filmes, via duas empresas offshore controladas por ele. Parte do dinheiro seria desviada, em um esquema para pagar menos impostos.

O julgamento foi iniciado em 2006, mas interrompido diversas vezes, em parte devido a uma lei de imunidade que protegia Berlusconi enquanto ocupava o cargo de primeiro-ministro.

Ele também foi condenado nesta sexta a pagar 10 milhões de euros (cerca de R$ 26 milhões) e a ficar afastado de qualquer cargo público por três anos.

Segundo Wiley, deve levar alguns anos até que o recurso de Berlusconi seja analisado. “Então, é provável que ele nunca vá para a prisão.”

O ex-primeiro-ministro costuma dizer que as acusações contra ele são motivadas por perseguição política e por um Judiciário com inclinações esquerdistas.

Histórico

Figura dominante na política italiana há mais de 20 anos, Berlusconi não é o primeiro premiê do país a ser condenado por crimes.

Bettino Craxi, um socialista que ajudou Berlusconi a construir seu império na área de telecomunicações, fugiu do país para evitar a prisão após um julgamento por corrupção e morreu no exílio na Tunísia.

No caso de Berlusconi, apesar dos diversos processos relacionados a suas atividades empresariais, ele sempre conseguiu ser inocentado ou ser beneficiado pelo fato de os processos expirarem o prazo legal.

Além das acusações de corrupção, Berlusconi está sendo julgado atualmente em um processo em que é acusado de ter pago por sexo com uma menor e tentar encobrir o episódio.