Pecuária mais rentável depende de tecnologia, diz novo chefe da Embrapa Gado de Corte
O pesquisador Cleber Oliveira Soares foi nomeado chefe-geral da Embrapa Gado de Corte, baseada em Campo Grande. Cleber gerenciará o Centro de Pesquisa pelos próximos três anos. Em entrevista ao Midiamax, fala sobre tecnologias desenvolvidas na unidade, os planos de internacionalização da empresa e a adoção de boas práticas de produção por parte dos pecuaristas. […]
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O pesquisador Cleber Oliveira Soares foi nomeado chefe-geral da Embrapa Gado de Corte, baseada em Campo Grande. Cleber gerenciará o Centro de Pesquisa pelos próximos três anos. Em entrevista ao Midiamax, fala sobre tecnologias desenvolvidas na unidade, os planos de internacionalização da empresa e a adoção de boas práticas de produção por parte dos pecuaristas.
Midiamax – O Congresso Nacional discute a proposta de internacionalização da Embrapa. O que isso irá significar para a empresa e para o país?
Dr. Cleber Oliveira Soares – Isso vai representar uma forma efetiva de atuação, não só da Embrapa mas do Brasil, nos países especialmente de clima tropical no mundo. O Brasil é visto e reconhecido como o maior produtor de alimentos do mundo. Nossa capacidade é fantástica e isso se dá ao desenvolvimento tecnológico no campo, no agronegócio como um todo. A Embrapa é instituição âncora e líder no desenvolvimento nacional dos programas agropecuários, junto com organizações estaduais e institutos de pesquisa.
A demanda de países de clima tropical por tecnologias brasileiras é muito grande. Existe uma pressão para que o Brasil transfira e compartilhe conhecimento científico para países em desenvolvimento e também desenvolvidos. Nesse contexto, a Embrapa há cinco anos vem se preparando para essa internacionalização por meio do Labex (Laboratório da Embrapa no Exterior). Temos unidades nos Estados Unidos, França, Holanda, Inglaterra, Gana, Venezuela, Panamá e Coreia do Sul. Há expectativa de abertura de outro escritório na Ásia, talvez na China.
A Embrapa tem três vertentes de atuação internacional: a primeira é pesquisa em conjunto com instituições internacionais sólidas, por desenvolvimento tecnológico. A segunda é troca e intercâmbio de material e pessoal. Recebemos muitas delegações estrangeiras e também enviamos muitos técnicos nossos para capacitação e treinamento no exterior. E a terceira é a transferência de tecnologia, ou seja, levar tecnologia para países de clima tropical.
Midiamax – Já existem tecnologias produzidas em nossa unidade de Campo Grande sendo aplicadas em outros países?
Dr. Cleber – Temos várias desenvolvidas pela Embrapa Gado de Corte, e um dos exemplos mais clássicos é na área de pastagens, onde o Brasil é líder no segmento de sementes de forrageiras tropicais. Temos várias cultivares como a Brachiaria brizantha (Marandu), conhecida como brachiarão, onde hoje é plantado em praticamente toda a América Latina e em países africanos. Outro exemplo é na área de melhoramento animal. O Brasil exporta genética bovina para o mundo, vide o exemplo de nossos Nelore, Guzerá, até mesmo do Brahman brasileiro e outras raças tropicais que foram melhoradas aqui no país.
Midiamax – Muito se fala atualmente em boas práticas na agricultura e na pecuária, e a Embrapa Gado de Corte coordena um programa nesse sentido. Como funciona?
Dr. Cleber – Esse programa começou pequeno aqui na unidade de Campo Grande, voltado para Mato Grosso do Sul. Fomos expandindo e passando para diversas regiões do país. Recentemente foi lançada uma portaria interministerial entre as pastas da Agricultura, Meio Ambiente e do Trabalho, instituindo o programa Pró-BPA. Visa levar subsídios técnicos para os pecuaristas de uma forma que ele tenha noções básicas e protocolos para a produção pecuária sustentável. São doze grandes temas que perpassam desde a gestão econômica, social e ambiental da propriedade rural, passando pelo manejo sanitário e de pastagens até os tratos pré e pós-abate.
Midiamax – Então não é só o manejo correto que conta, mas também uma boa assistência ao trabalhador rural, por exemplo?
Dr. Cleber – Com certeza. Um dos tópicos do programa de boas práticas agropecuárias é formar pessoas-chave para que a informação se perpetue, seja difundida e chegue ao produtor rural. O modelo estratégico é a formação de multiplicadores, como por exemplo técnicos de associações de criadores, técnicos do Senar, da nossa Agraer, das Ematers, entre outros. Essas pessoas contribuem para fazer o conhecimento chegar na ponta. Sozinhos não faríamos isso. Precisamos cada vez mais fazer e consolidar parcerias.
Midiamax – Que vantagens o consumidor espera obter de uma carne produzida dentro dessas regras?
Dr. Cleber – O mercado consumidor, tanto externo quanto interno, está cada vez mais exigente. Quando éramos pequenos víamos nossas mães amaciar carne no martelo. Hoje é muito difícil encontrar um daqueles no supermercado. E o próprio hábito de consumo foi aprimorado. A pessoa é mais rigorosa ao escolher a carne que vai comprar. Além das características intrínsecas da carne, como maciez, suculência, cor e sabor, nosso consumidor está preocupado também de como este produto final – carne – foi produzido. Por onde passou? O que o animal consumiu? Como ele foi tratado e abatido? Cada vez mais o consumidor exige um processo produtivo com qualidade superior. E o programa de boas práticas visa exatamente isso.
Midiamax – Como os produtores rurais se comportam diante dessas boas práticas? Eles aderem ou ainda resistem?
Dr. Cleber – No Brasil temos uma diversidade de sistemas de produção em pecuária de corte. Temos em média 0,9 a 1 animal por hectare. Temos extensão territorial e área de pastagem muito grande, e a nossa média faz com que a taxa de ocupação seja pequena. Apesar disso, temos produtores que produzem a pasto com taxa de lotação altíssima, 10 a 15 animais. Tudo depende de quanta tecnologia o produtor utiliza. Dentro do nosso próprio Estado temos essa variável.
Midiamax – A pecuária extensiva é prática dominante em nosso Estado, mas o confinamento de gado já ganha a preferência de alguns produtores. Como o senhor vê esse cenário?
Dr. Cleber – No Brasil isso vem mudando, mas de forma lenta, assim como em Mato Grosso do Sul. Nos estados da região central do país, ainda tem essa cultura forte da pecuária extensiva, mas mesmo essa modalidade está altamente tecnificada. Vide exemplos em MS, onde temos muitos pecuaristas extensivos mas manejam o pasto de forma adequada, fazem adubação ou mesmo o programa de integração lavoura-pecuária. Ou seja: esse cenário está mudando. É necessário mudar para otimizar o uso da terra e tornar a pecuária mais rentável.
Midiamax – A expansão das fronteiras da cana-de-açúcar e do eucalipto em Mato Grosso do Sul pode provocar algum rearranjo na distribuição de terras destinadas tradicionalmente à pecuária?
Dr. Cleber – Em proporção de área é possível, sim. Mas em volume de animais e produtividade, não. Hoje temos pecuaristas fortes no Estado que usam em uma mesma área o sistema de integração lavoura-pecuária, inclusive com floresta. Ou seja, no mesmo espaço se produz grão e depois da colheita você entra com o animal em cima, com pasto. E tem pecuarista fazendo integração de floresta com pasto. Planta eucalipto e pasto, e quando o eucalipto está em determinada altura, entra com animal pastando na mesma área. Temos tecnologia para duplicar nossa produtividade de carne no mesmo espaço.
Midiamax – Mas isso ainda não é uma regra para todos.
Dr. Cleber – O sistema de produção pecuária no Brasil ainda é muito diversificado. Temos desde pecuaristas que adotam o máximo de tecnologia disponível até aqueles extremamente tradicionais.
Midiamax – De que trata a pecuária de precisão e que ganhos pode trazer ao pecuarista?
Dr. Cleber – Este é um conceito novo que surgiu na Embrapa Gado de Corte há uns cinco anos, e trata do uso de tecnologias e ferramentas para otimizar o sistema de produção pecuária. Exemplo clássico são os processos de rastreabilidade, onde se utilizam chips, trasnponders eletrônicos, antenas de passagens e bótons, e você consegue rastrear por onde o animal transita e analisar o desempenho como ganho de peso e consumo.
Midiamax – Falando sobre sua gestão à frente da unidade, como foi sua trajetória na Embrapa até chegar ao posto atual?
Dr. Cleber – Em 2001 passei em primeiro lugar geral no concurso público para pesquisador da Embrapa, na área de sanidade animal, e fui destacado para vir a Campo Grande atuar no centro nacional de pesquisa de gado de corte. Em 2002 fui assessor da chefia de Pesquisa e Desenvolvimento (P&D) e em 2005 passei a ser o chefe, ou seja, a pessoa que cuida do desenvolvimento de forrageiras, programas nutricionais, avaliação genética, sanidade animal, manejo, entre outros. Depois de seis anos à frente do departamento, me candidatei e passei por um processo de seleção que envolveu entrevista com a diretoria executiva da Embrapa em Brasília. Fui selecionado para conduzir a Embrapa Gado de Corte pelos próximos três anos, com previsão de mais três.
Midiamax – Qual sua formação acadêmica?
Dr. Cleber – Fiz o curso de medicina veterinária no Rio de Janeiro, depois passei na Argentina fazendo especialização. Voltei ao Brasil onde fiz meu mestrado em parasitologia veterinária e doutorado em ciências veterinárias, com título de PHD.
Midiamax – Quais são os principais planos de sua gestão?
Dr. Cleber – A proposta de gestão está calcada em um horizonte em 2027, quando a Embrapa Gado de Corte completará 50 anos. Uma instituição de ciência e tecnologia completa um ciclo a cada 50 anos. Com certeza o cenário do agronegócio vai se tornar muito mais dinâmico, como tem acontecido na área de TI. Os planos de gestão estão baseados em ações e diretrizes que são calçadas por um posicionamento estratégico, de valor organizacional; o segundo ponto são desafios tecnológicos e científicos que teríamos pela frente; e o terceiro pilar diz respeito aos resultados finalísticos. Para isso foram priorizados os temas relacionados à P&D, voltados para melhoramento vegetal, melhoramento animal, sanidade animal, nutrição animal, socioeconomia, genética e assuntos correlatos.
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