O Brasil tem 151 municípios que reprovam 20% ou mais dos alunos da rede pública ao fim do 1º ano do ensino fundamental. O número representa 2,7% do total de cidades brasileiras. Mesmo assim, especialistas consideram a situação alarmante. Há municípios onde metade das crianças, que nessa época da escolaridade têm cerca de 6 anos, repetem.

Os dados são do Censo Escolar 2010, do Ministério da Educação (MEC), e foram mapeados pelo pesquisador e economista Ernesto Martins Faria. Ele considerou as redes estaduais, municipais e federal.

Nenhum dos 151 municípios é capital de Estado. A maior parte – 81 deles– localiza-se na Região Nordeste, que tem o Estado com maior número de municípios com as altas taxas de reprovação: Piauí, com 39. Nele, encontram-se os índices mais altos do País: Lagoa do Piauí, com 48,4%, e Aroeiras do Itaim, com 47,4%.

No Sudeste, a segunda região com maior número de cidades, 40 municípios reprovam mais de 20% dos estudantes do primeiro ano. O Estado campeão é o Rio de Janeiro, com 31 cidades, incluindo Petrópolis (20,7%) e Paraty (24%). São Paulo tem apenas um município entre os 151: Aramina, a 450 quilômetros da capital, com 26% de reprovação.

A reportagem entrou em contato com algumas prefeituras e encontrou diversas justificativas, como a evasão dos estudantes e a falta de infraestrutura das escolas rurais.

Faria, autor do estudo, considera inadmissível reprovar alunos aos 6 anos, com raras exceções. “A reprovação ainda é uma questão cultural que existe em algumas regiões do País.”

O MEC é contra a reprovação de crianças nessa faixa etária, mas Estados e municípios têm autonomia. Além disso, as diretrizes curriculares para essa etapa de ensino sugerem que não haja reprovação nos três primeiros anos do ensino fundamental, já que é nessa época que ocorre o ciclo de alfabetização da criança.

Reprovar é desistir da aprendizagem. É quando a escola coloca a culpa no aluno e não discute seu processo de aprendizado”, afirma a secretária de Educação Básica do MEC, Maria do Pilar Lacerda. “Muitas dessas crianças não frequentaram educação infantil e seus pais não tiveram direito à escola.”

De acordo com ela, programas do MEC contribuem para combater o quadro. Alguns exemplos são o Pró-Letramento, que trata da formação continuada de professores com foco nos anos iniciais do fundamental, e o Escola Ativa, que foca na qualidade da educação nas classes multisseriadas (com alunos de diversas idades) das escolas rurais.

Prejuízos

Segundo especialistas em educação, é durante a alfabetização que a criança deveria ter seu desenvolvimento acompanhado de perto. Além disso, estudos mostram que a repetência não tem impacto positivo sobre o desempenho educacional e sobre a autoestima do aluno.

“Na média, as crianças ganham mais passando de ano do que repetindo”, afirma Ocimar Alavarse, professor da Faculdade de Educação da . “O aluno que reprova não recebe tratamento pedagógico adequado, é tratado como um qualquer e acaba excluído.”

Segundo ele, não há justificativa pedagógica e social para reprovar crianças nessa . “Até pouco tempo atrás, com 6 anos elas estavam na pré-escola. Não há nenhum conhecimento em jogo para ser dominado que determine a aprovação ou não”, diz.

Cesar Callegari, membro da Câmara de Educação Básica do Conselho Nacional (CNE), afirma que os altos índices de reprovação estão relacionados à taxa de frequência. “Mas as diretrizes nacionais afirmam que, mesmo em se tratando de baixa presença – por conta de secas e enchentes de rios, em lugares distantes, por exemplo –, o sistema de ensino tem a obrigação de criar maneiras especiais para que a criança tenha acesso à escola.”

Mas ele também critica os sistemas que encaram a aprovação como promoção automática. “Essa tradução fácil que ainda ocorre no Brasil provocou um dos piores estragos que se tem notícia na história da nossa educação”, afirma.