Já desembargador, Ruy Celso promete ‘exatidão’ e ‘consciência’ nas decisões

Tido como um dos mais estudiosos magistrados do Poder Judiciário sul-mato-grossense, Ruy Celso Barbosa Florence, na posse, recorreu à tese defendida por gênios da literatura e da música, um deles Chico Buarque e prometeu praticar a Justiça sempre obedecendo aos “dois lados da balança”

Ouvir Notícia Pausar Notícia
Compartilhar

Tido como um dos mais estudiosos magistrados do Poder Judiciário sul-mato-grossense, Ruy Celso Barbosa Florence, na posse, recorreu à tese defendida por gênios da literatura e da música, um deles Chico Buarque e prometeu praticar a Justiça sempre obedecendo aos “dois lados da balança”

O novo desembargador do Tribunal de Justiça de Mato Grosso do Sul, Ruy Celso Florence tomou posse no final da tarde desta quarta-feira, 18. No discurso, ele firmou um pacto de trabalho sustentado em teses defendidas por Ítalo Calvino, consagrado escritor de origem cubana, mas que viveu na Itália, que enumerou com seis qualidades que devem nortear a literatura – leveza, rapidez, exatidão, visibilidade, multiplicidade e consistência.

Para Ruy Celso, que discursou para um auditório lotado com autoridades de todas as esferas dos poderes, as virtudes enumeradas por Ítalo Calvino “também devem e serão seguidas por ele enquanto desembargador”.

Tido entre os companheiros da magistratura como “um homem de virtudes, estudioso e de mente aberta”, o novo desembargador possui um extenso curriculo como juiz da Vara da Família de Campo Grande que, para ele, dá conhecimentos na magistratura para que nas tomadas de decisões sejam observados “os dois lados da balança”.

Homenagens

Durante a cerimônia não faltaram elogios para Ruy Celso, que assumiu vaga deixada pelo desembargador Rêmulo Leteriello, que se aposentou em março passado.

Indicado por merecimento foi eleito para a vaga por unanimidade. O colega de faculdade e também de estágio Euvaldo Chaid Filho veio de São Paulo, onde também é desembargador, para prestigiar a promoção de Ruy Celso.

O presidente do TJ-MS, Luiz Carlos Santini destacou que Ruy Celso foi um de seus mais fortes aliados na implantação do primeiro curso de Direito na Universidade Federal de Mato Grosso do Sul. “Vejo que ele vem enriquecer esta Casa por sua capacidade profissional”, disse.

A mãe Elvira Barbosa Florence, irmãos, filhas, outros parentes e a mulher Sônia Bertoli Florence destacaram virtudes do novo desembargador como “um bom pai, pessoa justa, estudioso e mente aberta”.

Quem é

Filho de procurador de Estado e professora universitária, o paulista Ruy Celso Barbosa Florence nasceu em Aguaí e ingressou na magistratura sul-mato-grossense em fevereiro de 1986. Atuou como juiz na Comarca de Bonito antes de ser promovido, por merecimento, para a 1ª Vara da Comarca de Paranaíba, em outubro de1988.

Em 1990, a pedido, foi removido, para a 1ª Vara Cível de Aquidauana e, seis anos depois, por merecimento, foi promovido para a 4ª Vara de Família de Campo Grande, de onde, por permuta, foi removido para a Vara de Execução Fiscal Estadual da Capital, em abril de 2007.

O desembargador já atuou como juiz titular do 6º Juizado Especial Cível e do Juizado do Consumidor, ambos de Campo Grande, além de ter presidido a 1ª Turma Recursal dos Juizados Especiais. Foi membro efetivo do TRE/MS na classe Juiz de Direito e juiz auxiliar da Corregedoria-Geral de Justiça por dois biênios.

É bacharel em Ciência Jurídicas e Sociais, especialista em Direito Penal e Criminologia, mestre em Direito das Relações Sociais e doutor em Direito das Relações Sociais. É professor decano dos Cursos de Graduação e Pós-Graduação em Direto da Universidade Anhanguera – Uniderp, Campo Grande, tendo sido o primeiro coordenador do Curso de Direito da Uniderp e nome da primeira turma de formandos.

Ruy Celso é ainda professor da Escola Superior da Magistratura de MS (Esmagis), professor convidado da Escola Superior do Ministério Público de MS, professor convidado da Escola Paulista da Magistratura, membro fundador da Academia Sul-Mato-Grossense de Letras Jurídicas e membro do Instituto Brasileiro de Ciências Criminais.

Foi presidente da Associação dos Magistrados de MS (Amamsul), professor do Departamento de Filosofia do Direito da PUC-Campinas e diretor da Escola Judiciária Eleitoral do TRE/MS. Recebeu título de cidadão sul-mato-grossense da Assembleia Legislativa e título de cidadão aquidauanense da Câmara Municipal de Aquidauana. Tem várias obras publicadas. (com informações da assessoria de imprensa do TJ-MS).

O discurso do desembargador Ry Celso:

Introdução

Exmo. Sr. Presidente do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso do Sul, Desembargador Luiz Carlos Santini.

Exmo. Sr. Governador do Estado de Mato Grosso do Sul, Dr. André Puccinelli.

Exmo. Sr. Presidente da Assembléia Legislativa de Mato Grosso do Sul, Sr. Jéferson Domingos.

Autoridades que representam os Três Poderes do nosso Estado, e em nome dos quais saúdo as outras dignas autoridades que compõem a mesa desta solenidade e que já foram nominadas pelo cerimonial; Exmo. Sr. Desembargador Euvaldo Chaib Filho, que neste ato protocolar representa o Presidente do Tribunal de Justiça de São Paulo, Desembargador José Roberto Bedran; Exmo. Sr. Desembargador Luis Paulo Cotrin representando o Presidente do Tribunal Regional Federal da 3ª Região Desembargador Roberto Haddad; demais autoridades presentes; ilustres Desembargadores que compõem este sodalício; nobres Desembargadores aposentados; colegas magistrados; membros do ministério público; advogados; membros das procuradorias; integrantes da defensoria pública; colegas professores das escolas oficiais e das universidades particulares, servidores do Poder Judiciário; Exmos. Srs. Representantes dos meios de comunicação, caríssimos parentes e amigos, senhores e senhoras.

Com o merecido destaque, agradeço antecipadamente as generosas e demasiadamente benevolentes palavras do Desembargador Rubens Bergonse Bossay, exemplo de homem e magistrado para todos nós.

Agradeço, também, a fidalguia do Sr. Procurador Geral de Justiça, Dr. Paulo Alberto de Oliveira, orador gentil, que enobrece a Justiça do nosso estado.

Minha gratidão, ainda, ao prestigiado advogado Dr. Leonardo Avelino Duarte, Presidente da Ordem dos Advogados do Brasil, seção Mato Grosso do Sul pelo carinho da homenagem, que espelha os reconhecidos valores que norteiam sua vida.

Da Posse

Hoje, tenho a honra e o orgulho de tomar posse no cargo de Desembargador do Tribunal de Justiça de Mato Grosso do Sul, em razão de promoção pelo critério de merecimento, resultado de votação unânime desta corte ocorrida em 13 de abril de 2011.

Ocuparei vaga deixada pelo nacionalmente aplaudido Desembargador Rêmolo Leteriello, reconhecido como semeador de escolas judiciais e disseminador dos juizados especiais cíveis e criminais por todo o território brasileiro. Cidadão e profissional que honra e dignifica, não só a magistratura sul-mato-grossense, mas, também, toda a Justiça desse país.

Por essas qualidades, embora eu passe doravante, a ocupar o espaço deixado pelo festejado Desembargador, o vazio propriamente permanecerá, e não poderá ser preenchido. Assim é, pela mesma razão que não se conhece quem supriu a ausência de Beethoven, de Albert Einstein, de Tom Jobin e tantos outros. Reafirmando essa verdade, lembro a eloquência do amigo Desembargador Romero ao vaticinar que os Beatles nunca serão substituídos, e ninguém jamais poderá tomar o lugar de Chico Buarque de Holanda.

Sr. Presidente, cheguei a este momento da minha carreira graças ao trabalho de muitos, desde o mais humilde servidor das Comarcas pelas quais passei, até a compreensão de Vossa Excelência e do Órgão Pleno deste Tribunal.

Por isso, agradeço a todos, que nestes vinte e cinco anos de magistratura, contribuíram de forma direta ou indireta para que eu pudesse exercer, com leveza, a nobre função de julgar.

Ítalo Calvino, consagrado escritor de origem cubana, radicado na Itália desde tenra idade, ao ser convidado para proferir seis conferências na Universidade de Harvard nos anos letivos de 1985/1986, identificou-as com seis qualidades que devem nortear a literatura – leveza, rapidez, exatidão, visibilidade, multiplicidade e consistência. Virtudes, ao meu ver, a nortear, não só os escritores, mas de empréstimo, as atividades dos magistrados, e a vida de todos nós.

Vejam que, os Estados Unidos da América anunciaram neste mês, o assassinato do seu maior inimigo, Osama bin Laden. Entretanto, juntamente com a confissão do assassínio, divulgaram terem banhado o corpo morto, soltando-o ao mar a partir de uma prancha, depois tê-lo envolvido em um lençol branco, seguindo assim, a tradição religiosa islâmica. Sem entrar no mérito da questão, o fato é que, com essa última parte da mensagem, os Estados Unidos buscaram tornar mais leve para os seguidores do líder religioso, a sua trágica morte.

No mesmo tom, um magistrado ao presidir um processo, por mais dura que se anuncie a pena ou os efeitos da sua decisão, torna mais leve a sua missão e a posição de todos, quando age respeitando a dignidade das pessoas envolvidas, com educação no trato e gentileza nos gestos, colocando-se mentalmente, sempre que possível, no lugar das partes.

A rapidez, segundo Calvino, deve ocorrer na literatura a partir da sabedoria em encadear uma história a outra, com segredo de ritmo e capturação do tempo, de forma a manter aceso o desejo de ouvir o resto.

Assim, também, deve ser um processo judicial. Pois quando bem conduzido, amarrando uma fase à outra, sem ofensas ao ritmo e a marcha, nem retrocessos ou paralisações, torna mais rápida, fácil e lógica a decisão final.

A exatidão, tema da terceira conferência de Calvino, ou precisão para os egípcios, era simbolizada no Antigo Egito por uma pluma que servia de peso num dos pratos da balança em que se pesavam as almas. Essa pluma levíssima tinha o nome de Maat, deusa da balança. O hieróglifo de Maat indicava o tom fundamental da flauta.

Pois essa parece-me ser a exatidão a guiar a Justiça, medida com a leveza da pluma e a suavidade do som da flauta, sem nunca esquecer que em cada lado da balança existem almas.

Já a visibilidade, homenageada por Ítalo Calvino em sua quarta colação, acena para a qualidade que deve ter a literatura de transformar no espírito humano, “caracteres alfabéticos negros sobre uma página branca em imagens que podem ser vistas com os olhos fechados”.

Para o Judiciário, a atuação rápida, eficiente e conciliatória, dando o seu melhor para o país, é a receita para que o jurisdicionado a perceba em todo o seu merecido esplendor. Esse é o caminho ético e seguro para que ocorra o fenômeno da visibilidade do Poder. Fenômeno com capacidade de , por si só, contrapor-se e arrostar qualquer ataque indevido, maldoso ou mesmo criminoso contra esta instituição abrigada por Themis, filha do Céu e da Terra.

No critério multiplicidade, Calvino sugere que uma obra literária deve, se possível, ser concebida fora do “self” do seu autor, “saindo da perspectiva limitada do eu individual, não só para entrar em outros “eus” semelhantes ao nosso, mas para fazer falar o que não tem palavra, o pássaro que pousa no beiral, a árvore na primavera e a árvore no outono, a pedra, o cimento…”,

O Judiciário atual, abrindo-se para novas formas de estancar e solucionar conflitos, tais como a conciliação, a mediação, a arbitragem, a justiça restaurativa e outras, com a participação em grandes redes de combate à violência, ao tráfico de pessoas e trabalho infantil que envolvem os diferentes poderes, universidades, ongs, etc, sai definitivamente do seu casulo, do seu “self”, enfim, do seu eu.

Considero-me, Sr. Presidente, um privilegiado em participar desse momento da nossa Justiça. O apoio que Vossa Excelência vem dispensando para a criação dos núcleos de conciliação em nosso Estado ficará indelevelmente registrado na memória histórica do judiciário sul-mato-grossense.

Por fim, o que dizer da consistência, última qualidade apontada por Ítalo Calvino, como essencial à literatura.

Infelizmente, Calvino não chegou a escrever sobre esse tema, assim como não proferiu as demais palestras. Morreu antes.

No entanto, mesmo sem ter noção sobre o que Calvino pretendia registrar na abordagem do tema, já que nunca foi localizado nenhum vestígio sobre algum esboço que ele tivesse deixado em torno do assunto, é possível imaginar quisesse ele falar sobre o valor axiológico e a robustez de conteúdo que deve ter a obra literária.

É o que se espera de um julgador moderno. Que ele tenha consistência. Não seja um vazio em conhecimento e nem um tolo em sonhos. Mas sim, dotado de ideais e valores maiores, com discernimento suficiente para saber que é lei da física, da biologia e das religiões que só se colhe de acordo com o semeado. E, que viva de maneira tal que seu coração nunca pese mais que a já referida Maat, pena da justiça e da verdade.

Feitas essas considerações, que tenho certeza, longas para quem ouve, peço a todos o imerecido perdão.

Resta-me entretanto, as derradeiras palavras, propositadamente deixadas para o final pois do contrário a emoção impedir-me-ia de dizer todo o resto.

Transmito aqui o meu muito obrigado a todos os amigos de dentro da magistratura, aos quais peço licença para fazê-lo em nome dos Desembargadores Josué de Oliveira, Romero Osme Dias Lopes e Carlos Contar.

Agradeço a tantos amigos de fora da magistratura, e a eles peço autorização para fazê-lo respeitando a antiguidade, Francisco Pinto, o Chiquitão, Pedro Chaves Santos Filho e Anísio Bispo Santos

Agradeço aos amigos da imprensa, e da mesma forma, com o pedido de assentimento de todos, cumprimento-os nas pessoas de César Quintas (Fundação Zharan), Adilson Trindade (Grupo Correio do Estado), Fernando Soares (Grupo Folha do Povo), Carlos Eduardo Naegele (Midiamax), Feitosa (Grupo Feitosa de Comunicações) e Danilo Costa (Jornal de Domingo).

Agradeço aos colegas de PUC aqui presentes, Desembargador Euvaldo Chaib Filho e o advogado Carlos Araújo Pimentel Neto.

Agradeço, também, aos amigos, empresário Sami Moussalli e o Juiz e Professor da PUC José Henrique Rodrigues Torres, que assim como os outros dois, se deslocaram da cidade de Campinas apenas para estarem aqui nesta solenidade.

Meu muito obrigado pela presença ao Juiz Sidmar Dias Martins, auxiliar da Presidência do Conselho Nacional de Justiça.

Agradeço a todos os meus irmãos aqui presentes, Cléa Áurea, Carlos Alberto, João Carlos e Maria Ruth. Meu muito obrigado, também, à minha sogra e minhas cunhadas, assim como aos e demais parentes, o que faço em nome de Elvira Florence Vergueiro a tia Elvirinha.

Faço, ainda, neste momento, justa homenagem às mulheres que embelezam a minha vida: Sônia, esposa adorada, exemplo de tolerância, compreensão e companheirismo. Rayane e Raíssa, filhas queridas. Elvira, minha mãe, modelo de mulher.

Finalmente, rendo tributo a todos os meus antepassados ausentes em corpo, e o faço em nome do meu pai Carlos Alberto Florence.

Obrigado a todos pela paciência em me ouvir.

 

Conteúdos relacionados