Das 116 pequenas centrais hidrelétricas (PCHs) previstas para serem construídas na Bacia do Alto Paraguai, 29 já estão em operação. O impacto que elas podem causar na Bacia Pantaneira, principalmente sobre o estoque pesqueiro da região, foi um dos assuntos abordados durante o I Seminário Sobre Turismo de Pesca, realizado em Miranda, no dia 21 de janeiro. “É uma situação bem preocupante porque todas estas em conjunto, tem o potencial de alterar o curso de inundação do Pantanal”, afirmou ao Diário a pesquisadora Débora Calheiros.

Segundo ela, as hidrelétricas respondem a necessidade de energia do país com um sistema que é interligado nacionalmente. Então, se precisa de energia em São Paulo, por exemplo, as hidrelétricas vão funcionar, soltando ou segurando água, em função da necessidade energética, e não de acordo com o fluxo natural do rio em determinada época. “Imaginando 116 operando de forma diferente, sem controle, isso com certeza tem um potencial enorme. Em outros lugares do Brasil e do mundo existem problemas muito sérios de manutenção da produção pesqueira com implementação de barragens”, continuou.

Em 2009, o Ministério Público Federal de Corumbá abriu um inquérito civil público sobre o assunto. No ano passado, uma audiência pública foi realizada em Campo Grande para debater a influência de empreendimentos hidrelétricos no equilíbrio ecológico do Pantanal. “Nossa preocupação, junto com o Ministério Público Federal e o Ministério do Meio Ambiente, é que a gente avalie o impacto conjunto destes empreendimentos para pensar em uma política pública para conservação da Bacia do Alto Paraguai”, explicou Débora.

Ela alerta que o fluxo irregular da água pode afetar a pesca, a pecuária e a própria navegação. “Temos que avaliar o efeito do conjunto destes empreendimentos porque normalmente eles são licenciados em separado. E ninguém está tendo essa visão de conjunto. Nossa preocupação, como pesquisadora, é exatamente prever e evitar que estes impactos se concretizem porque muita gente depende da qualidade ambiental do Pantanal”, reforçou.

Consequências

Segundo Débora Calheiros, as 29 PCHs que estão em operação – outras 11 estão em construção – já afetam alguns rios do Mato Grosso. “Vimos isso no rio Manso, que é o único que já tem um estudo realmente. Agora no rio Jauru, os pescadores já estão observando que a produção pesqueira está impactada”, disse. Estas mudanças na parte alta do Pantanal afetam diretamente a parte mais baixa, onde está Corumbá.

“O que estamos preocupados é que o rio Cuiabá tem quatro grandes hidrelétricas em seus principais rios, que são o Itiquira, Correntes, São Lourenço e Manso. A gente não sabe o efeito disso nele, que é o principal rio da bacia, responsável por 40% da água do Pantanal. E tem que lembrar que 70% das hidrelétricas estão previstas para Mato Grosso, na parte norte da bacia, que é responsável por 75% da água do ecossistema”, continuou. Ela explicou também que se toda essa água variar seu fluxo de forma artificial, pode haver alteração nos períodos de seca e cheia. “E isso no Pantanal é você mexer no que a gente chama de fator hidroecológico chave do sistema”, explicou.

“Estamos tentando fazer um estudo com a UFMT (Universidade Federal do Mato Grosso), pessoas da Holanda e da Escócia justamente para termos esta informação. Mas isso demora uns 2 ou 3 anos para ficar pronto”, disse a pesquisadora a este Diário. Lembrando do assoreamento ocorrido no rio Taquari, ela acredita que os danos das hidrelétricas podem ser ainda piores. “A gente acha que pode ser pior, já que vai mexer no curso de inundação do sistema. O Taquari, ele mexe ali no Taquari abaixo. Lá em cima não. Mas com as hidrelétricas, o problema maior vai ser em cima, de onde vem a água para todo o Pantanal”.

Estudo

Depois da audiência pública, o assunto está sendo analisado pela quarta câmara do Ministério Púbico Federal. “Eles vão emitir um parecer técnico, que está um pouco atrasado, era para ser concluído há uns 2 meses, mas estamos esperando este parecer, para a partir daí, o MPF tomar uma decisão sobre esta questão. A proposta deles é suspender os licenciamentos até que o estudo seja realizado para, nesse caso, avaliar o impacto conjunto das hidrelétricas e principalmente, deixar os rios sem barragens. Se nós barrarmos todos os rios, a gente não vai ter peixe”, concluiu Débora Calheiros.