Heloísa Adário é coordenadora geral do Programa de Fomento às Penas e Medidas Alternativas do Ministério da Justiça. Ela esteve em Campo Grande durante o VII Congresso Nacional de Alternativas Penais, realizado no dia 20 de outubro. Heloísa defende a importância dos debates sobre o sistema de penas alternativas e destaca o papel da sociedade durante o processo de restauração do sujeito infrator.

Midiamax: Qual a principal característica das penas alternativas, punição ou reparação de danos?

Heloísa Adário: Reparação de danos. Na questão das alternativas, a gente fala de uma punição por conta de uma infração cometida pelo sujeito, mas que tem que ser acompanhada e tratada de uma maneira diferente do que a pena de prisão. A gente trabalha com princípios fundamentais, como a responsabilização do infrator perante seus atos e a comunidade e da restauração das relações dele com a a vítima.

Midiamax: Quais os principais avanços nestes 11 anos, desde que o sistema foi implantado no Brasil?

Heloísa Adário: Em termos quantitativos, há um número significativo no Brasil em aplicações das penas. Em termos qualitativos, houve ampliação dos debates, nos quais podemos apontar que a pena alternativa não é punitiva ou de execução penal, mas ela tem que ter um caráter também educativo, restaurativo, sempre visando a pacificação social e a diminuição dos índices de violência.

Midiamax: O Sistema Brasileiro de Penas e Medidas Alternativas foi reconhecido pela ONU entre as melhores práticas de redução da população carcerária do mundo. Que tipo de pena ou medida integra esse sistema e quais critérios para a aplicação?

Heloísa Adário: A principal pena alternativa, que normalmente se aplica e que tem caráter mais positivo, pois trabalha a responsabilização do sujeito, é a de prestação de serviço à comunidade. Para isso você tem um trabalho de educação, estabelecimento de vínculos dele com a comunidade, com a rede social de apoio. Os critérios são determinados por baixo ou médio potencial ofensivo, tem infrações com condenação de até um ano e outras de até quatro anos, e todas são passivas de penas alternativas.

Midiamax: O que representa desafio maior: encontrar e aplicar a pena alternativa ou fazer com que as pessoas entendam sua eficácia?

Heloísa Adário: Uma coisa não anda sem a outra. Tivemos um momento em que o grande desafio era convencer a sociedade de que a pena alternativa deveria ser aplicada, mas havia uma resistência, pois se dizia que era impunidade. Hoje, essa visão já difere um pouco de 10 anos atrás, quando o programa se iniciou, principalmente em relação ao poder Judiciário. E hoje o desafio é ampliar o debate sobre o assunto, o que significa convencer a comunidade da importância das penas alternativas para a recuperação do indivíduo no sentido da restauração das relações sociais. Por isso a seriedade dos workshops, para debater como a participação da comunidade pode ser maior, como ela pode interferir na relação do indivíduo.

Midiamax: O famoso “pagar cesta básica” já se tornou uma pena de certa forma banalizada e, principalmente no casa dos ilícitos cometido por menos de idade, não costuma nem ser sentida como pena pelo próprio infrator efetivamente, uma vez que é a família que arca com o custo e até com a entrega de tal cesta. Qual a sua avaliação sobre isso?

Heloísa Adário: Apesar de ser uma das penas previstas, não recomendamos a cesta básica, principalmente à pessoa de baixo poder aquisitivo, que geralmente é a grande maioria dos apenados, e esse tipo de pena onera cada vez mais o indivíduo e dificulta a situação familiar e isso não é positivo. E ela também não surte efeito porque não responsabiliza o sujeito. Em casos de pessoas com alto poder aquisitivo, ela se justifica mais. Então você tem uma pena que pode, de repente, fazer um empresário doar um número X para uma instituição carente e isso pode gerar bom resultado.

Midiamax: A senhora defende que é preciso haver mais envolvimento e compreensão da sociedade em relação às penas alternativas. Mas dentro do sistema Judiciário, como é a receptividade a esse modelo?

Heloísa Adário: O pode Judiciário é a instituição fundamental, pois é quem aplica as penas. A preocupação deles é garantir que não haja impunidade e que tenha a fiscalização do cumprimento da pena. A partir do momento que se garante que há essa estrutura, ele passa a ter maior segurança e não tem porquê não aplicar a pena. Então o judiciário não é apenas parceiro, mas sujeito ativo e fundamental nesse processo.

Midiamax: Em termos de estatísticas, qual o “desempenho” de Mato Grosso do Sul na aplicação de penas alternativas? E em termos qualitativos, é possível avaliar os resultadis no estado?

Heloísa Adário: Sei que em Mato Grosso do Sul tem centrais de penas alternativas em dois municípios, criadas com o apoio do Ministério da Justiça. É um estado bastante ativo nesta questão e vai ser parceiro nosso, com certeza, na realização dos debates.