Financiamento público de campanha pode gerar polêmica na reforma política
O financiamento das campanhas eleitorais está entre os 11 temas a serem discutidos na Comissão de Reforma Política do Senado, que inicia seus trabalhos nesta terça-feira (1º), às 14h. Atualmente, o que existe no país é um sistema misto no qual recursos públicos se juntam a doações privadas. Apesar de vários parlamentares da base aliada […]
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O financiamento das campanhas eleitorais está entre os 11 temas a serem discutidos na Comissão de Reforma Política do Senado, que inicia seus trabalhos nesta terça-feira (1º), às 14h. Atualmente, o que existe no país é um sistema misto no qual recursos públicos se juntam a doações privadas. Apesar de vários parlamentares da base aliada e da oposição defenderem a substituição do modelo atual pelo financiamento exclusivamente público, o assunto deve gerar polêmica, pois não há consenso sobre como isso deveria ser feito – e nem se deveria ser feito.
Uma das propostas mais conhecidas é a que combina o financiamento público com o voto em lista fechada (no qual o eleitor vota na legenda, e não no candidato). O PT está entre os partidos que a defendem, como lembra Humberto Costa (PE), líder da legenda no Senado. Uma das justificativas é que, com a mudança, seria possível evitar a excessiva “personalização” das candidaturas e os altos custos das campanhas.
O senador Wellington Dias (PT-PI), integrante da Comissão de Reforma Política, acrescenta que a combinação entre financiamento público e lista fechada permitiria a qualquer candidato, “com ou sem dinheiro”, participar das eleições.
– Seria possível chegar ao Congresso sem estar comprometido com o financiador A ou B – diz ele.
Nessa declaração está presente a ideia de que o sistema proporcional de lista aberta (atualmente utilizado na eleição de vereadores e deputados), além de estimular a “personalização” das campanhas, leva os candidatos a competirem não apenas com os candidatos de outros partidos, mas também com os de sua própria legenda. Isso produziria uma busca acirrada por recursos e, como resultado, os eleitos ficariam comprometidos com os grupos e as empresas que os financiaram.
Além disso, o senador Inácio Arruda (PCdoB-CE), que apoia a mesma proposta, afirma que os principais escândalos com os partidos políticos estão vinculados ao financiamento privado, como aqueles em que há uso do “caixa dois”.
Essa posição não se restringe às legendas associadas à esquerda do espectro político. O deputado federal Ronaldo Caiado (DEM-GO), por exemplo, é outro que defende o financiamento público integrado à lista fechada. Ele argumenta que essa combinação, além de evitar a predominância dos candidatos com mais recursos, permite uma fiscalização mais eficiente do financiamento público, já que nesse caso o dinheiro seria distribuído somente aos partidos.
Outras combinações
Mas a combinação de financiamento público com lista fechada não é uma unanimidade. Jayme Campos (DEM-MT) e Pedro Taques (PDT-MT) estão entre os senadores que apoiam a primeira proposta, mas não a segunda: ambos defendem, junto com o financiamento público, o voto distrital, que é uma das modalidades de eleição majoritária.
Para Jayme Campos, “o voto em lista fechada privilegia quem comanda as legendas nos estados”, pois, nesse modelo, é o partido que escolhe os candidatos. Esse tipo de alerta é comum entre os críticos de tal proposta: o próprio presidente da Comissão de Reforma Política, senador Francisco Dornelles (PP-RJ), diz que “a lista fechada levaria à ditadura das cúpulas partidárias”. E também se aponta o risco de que, com a concentração de poder nas cúpulas, perca-se o vínculo entre o eleitor e o eleito.
Outro senador que não defende a lista fechada é Aécio Neves (PSDB-MG), também integrante da Comissão de Reforma Política. Ele declarou que o financiamento público tem de estar entre os principais itens em discussão, mas ao lado do voto distrital misto e da cláusula de barreira. O voto distrital misto – modelo que mescla características dos sistemas proporcional e majoritário – é uma bandeira não apenas de Aécio, mas de todo o seu partido.
Contra o financiamento público exclusivo
Entre os parlamentares que se colocam frontalmente contra o financiamento público está Aloysio Nunes Ferreira (PSDB-SP). Em recente discurso na tribuna da Casa, ele disse que “é mentiroso o argumento de que a fonte da corrupção na política seja a necessidade de angariar recursos para as campanhas”.
– Político ladrão não faz negócio com seu mandato para financiar campanha, mas sim para pôr dinheiro no bolso – afirmou.
Ele avalia que o financiamento público atual – que existe junto com o financiamento privado – já oferece um grande auxílio financeiro para as legendas, “pois o fundo partidário mobiliza vultosos recursos públicos”. Esse fundo, que se destina à manutenção das legendas, é administrado pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE). Para Aloysio Nunes, mesmo que fosse extinto, o financiamento privado continuaria a existir de forma ilegal – como, aliás, já ocorre, ressaltou ele.
O senador por São Paulo também argumentou que o horário eleitoral gratuito no rádio e na televisão “não deixa de ser uma forma de recurso público, pois trata-se de uma concessão pública”. Nos Estados Unidos, em contraste, paga-se pelo uso da televisão para propaganda dos candidatos.
– Eu não aceito que o dinheiro que pago de imposto financie a campanha de um candidato que não quero ver eleito – acrescentou ele.
Risco de centralização
Em estudo publicado em 2004, o consultor legislativo do Senado Fernando Trindade avalia que o financiamento exclusivamente público, dependendo da forma como é proposto, pode ter resultados indesejáveis se “reforçar tendências centralizadoras dos partidos políticos”.
Analisando proposições que tramitavam no Congresso naquele ano, Fernando Trindade observou que algumas delas previam o repasse dos recursos públicos – provenientes da Justiça Eleitoral – aos diretórios das instâncias superiores dos partidos (os diretórios nacionais). Estes, por sua vez, repassariam parte do dinheiro aos diretórios estaduais e municipais. Como resultado, os diretórios estaduais e municipais ficariam dependentes do diretório nacional (assim como os municipais ficariam dependentes dos estaduais), fortalecendo ainda mais o poder dos dirigentes na escolha dos candidatos.
Segundo o consultor, “pode-se argumentar que isso já ocorre hoje (…), só que sem a legitimação expressa pela via do dinheiro público, que passaria a ser utilizado para reproduzir essa iniquidade”.
Há várias propostas no Congresso que preveem a implantação do financiamento exclusivamente público. Uma das mais recentes foi apresentada pelo próprio governo federal, em fevereiro de 2009, como parte de um conjunto de proposições sobre reforma política. Esse projeto de lei (PL 4.634/09) tramita na Câmara e ainda não foi examinado pelo Senado.
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