“Balada do Amor e Ódio” retrata Espanha pós-Guerra Civil

Para o diretor espanhol Alex de La Iglesia, o palhaço é uma figura arquetípica na Espanha – tanto quanto o padre ou o toureiro. Como fez em filmes anteriores, como “800 Balas” (2002) e “Crime Ferpecto” (2004), mais uma vez ele escolhe a figura do habitual protagonista cômico dos circos para conduzir a trama de […]

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Para o diretor espanhol Alex de La Iglesia, o palhaço é uma figura arquetípica na Espanha – tanto quanto o padre ou o toureiro.

Como fez em filmes anteriores, como “800 Balas” (2002) e “Crime Ferpecto” (2004), mais uma vez ele escolhe a figura do habitual protagonista cômico dos circos para conduzir a trama de “Balada do Amor e do Ódio” – o drama por vezes grotesco, mas sempre fascinante, que venceu os prêmios de melhor direção e roteiro no Festival de Veneza 2010.

No centro da história, roteirizada também por De La Iglesia, estão, na verdade, vários palhaços, permitindo estabelecer não só um diálogo entre gerações mas também entre as duas épocas do filme, 1937 e 1973, sinalizando a véspera do início e a fase final do franquismo (que começou em 1939 e acabou apenas em 1976).

Em 1937, os palhaços tentam fazer o show continuar, apesar da Guerra Civil que está ensanguentando um país extremamente dividido. Acuados pelas forças franquistas, mais organizadas e em maior número, os republicanos caçam voluntários para lutar.

Um dos palhaços (Santiago Segura), ainda dentro de um vestido e com peruca de mulher, acaba indo, armado apenas de um machete. Apesar disso, faz um estrago considerável entre os franquistas, que o levam à prisão, depois à morte.

O palhaço tinha um filho, Javier, que, ao crescer (interpretado por Carlos Areces), abraça a profissão do pai, tornando-se o Palhaço Triste num circo em Madri, em 1973. Lá, o rei absoluto é o Palhaço Gracioso, Sérgio (Antonio de La Torre), casado com a bela trapezista Natalia (Carolina Bang).

A violência marca a relação entre Sérgio e Natália, numa simbiose doentia, à qual se soma o amor de Javier pela moça. Essa espiral de paixão, loucura e violência dentro do circo só encontra paralelo na realidade imediata de uma Espanha que se debate nos estertores da ditadura franquista, sacudida por atentados como o que mata o presidente do governo Carrero Blanco, em 1973.

De La Iglesia constrói habilmente essa tensão da história passional, em desdobramentos cada vez mais imprevisíveis. Ao mesmo tempo, deixa claras as pegadas de sua inspiração na história real da Espanha, intercalando trechos de filmes da época ao mostrar o general Francisco Franco e o atentado contra Carrero Blanco, além de shows dos famosos Payasos de La Tele, populares na TV espanhola dos anos 70, infância do cineasta.

Amarrando as pontas da dualidade extrema que procura compor da mentalidade de seu país, o diretor encena uma vertiginosa sequência final no Vale dos Caídos – o polêmico monumento construído por Franco entre 1940 e 1958 para abrigar, compulsoriamente, os mortos dos dois lados da Guerra Civil.

Neste cenário, a fotografia fortemente contrastada de Kiko De La Rica e a sofisticada direção de arte de Eduardo Hidalgo materializam toda a ambição do diretor, que realiza aqui sua obra mais madura e impactante. (Neusa Barbosa, do Cineweb).

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