Julgamento de acusados por morte de líder indígena de MS acontece dia 12 em SP

O julgamento dos acusados pelo assassinato do cacique guarani-kaiowá Marcos Veron, ocorrido em janeiro de 2003 em Juti, acontece no dia 12 de abril; transferência do local de julgamento, de MS para SP, foi pedida por não haver no Estado condições de isenção, segundo o MPF

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O julgamento dos acusados pelo assassinato do cacique guarani-kaiowá Marcos Veron, ocorrido em janeiro de 2003 em Juti, acontece no dia 12 de abril; transferência do local de julgamento, de MS para SP, foi pedida por não haver no Estado condições de isenção, segundo o MPF

O julgamento dos acusados pelo assassinato do cacique guarani-kaiowá Marcos Veron, ocorrido em janeiro de 2003 em Juti, no interior de Mato Grosso do Sul, acontece no dia 12 de abril, em São Paulo. O Tribunal Regional Federal da 3ª Região (TRF 3), seguindo integralmente manifestação do Ministério Público Federal (MPF), havia determinado que o Tribunal do Júri ocorra em São Paulo para garantir a imparcialidade dos jurados e evitar que a decisão sofra influência social e econômica dos supostos envolvidos no crime.

Pelo MPF, participam do julgamento o procurador da República Marco Antônio Delfino de Almeida, de Dourados, e o procurador regional da República Luciano Mariz Maia.

Apesar dos acusados pelo assassinato de Marcos Veron irem a julgamento, em Mato Grosso do Sul existem diversos outros casos de violência contra indígenas que não tiveram o mesmo destino.

Em novembro de 2010, dois professores indígenas da etnia guarani-kaiowá desapareceram após ocupação de uma fazenda em Paranhos, fronteira com o Paraguai. Apenas o corpo de um deles foi encontrado.

Em 18 de setembro de 2009, um grupo armado atacou um acampamento Guarani, às margens da BR-483, na região conhecida como Curral do Arame, a dez quilômetros de Dourados (MS). Um índio de 62 anos foi ferido por tiros, outros indígenas foram agredidos e barracos e objetos foram queimados. Não se conhecem ainda os autores do ataque.

Indígenas da etnia Terena, que ocupavam área tradicional onde incide a fazenda Querência São José, em Dois Irmãos do Buriti, gravaram em vídeo e áudio ação de despejo realizada pela Polícia Militar, sem ordem judicial de reintegração de posse. A ação ocorreu em 19 novembro de 2009.

Em dezembro de 2009, indígenas da etnia Terena, que retomaram parte da fazenda Petrópolis que faz parte da área declarada pelo Ministério da Justiça como Terra Indígena Cachoeirinha, em Miranda, denunciaram ter sofrido ameaças depois que o TRF 3 suspendeu ordem de reintegração de posse. O STF determinou a desocupação da área, mas os indígenas pedem prazo para colher as lavouras já cultivadas.

Para o procurador da República Marco Antonio Delfino de Almeida, “todos os casos apontados mostram que infelizmente a violência contra povos indígenas não é um fato isolado nem uma questão ultrapassada. O que se espera do poder público e do Judiciário é uma ação imparcial para que ocorra a efetiva proteção dos povos indígenas”

Entenda o caso

Acampados na terra indígena Takuara, na fazenda Brasília do Sul, os kaiowá sofreram ataques, entre os dias doze e treze de janeiro de 2003, de quatro homens armados que teriam sido contratados para agredi-los e expulsá-los daquelas terras. Armados com pistolas, eles ameaçaram, espancaram e atiraram nas lideranças indígenas. Veron, à época com 72 anos, foi encaminhado ao hospital com traumatismo craniano, onde faleceu.

Respondem pelo assassinato Estevão Romero, Carlos Roberto dos Santos, Jorge Cristaldo Insabralde e Nivaldo Alves de Oliveira. Em outubro de 2008, o MPF ofereceu denúncia contra outras 24 pessoas por envolvimento no crime.

Transferência do jurí

Entre os motivos levantados pelo MPF para pedir a transferência do Tribunal do Júri de Dourados (MS) para a capital paulista estão o poder econômico e a influência social do proprietário da fazenda, Jacinto Honório da Silva Filho. Proprietário de terras em Mato Grosso do Sul e outros estados, Jacinto Honório teria negociado com dois índios a mudança de seus depoimentos. Vítimas da agressão, eles teriam sido contratados para trabalhar em uma de suas propriedades na Bolívia.

Também assinaram um depoimento em 2004 mudando a versão que deram ao crime no dia seguinte ao assassinato. Inocentaram os seguranças contratados pelo fazendeiro e passaram a responsabilizar um outro índio, já morto, pelo assassinato do cacique Veron. O fazendeiro teria tentado, inclusive, comprar o depoimento do filho do cacique assassinado, oferecendo-lhe bens materiais em troca da assinatura de um termo de depoimento já redigido.

Manifestação do juiz

Além disso, em seu pedido de desaforamento (mudança de local do júri), o MPF citou as manifestações de juiz estadual que teria se manifestado oralmente contra os indígenas e contra o procurador da República do caso. Nomes que figuram na lista de jurados da Justiça Federal em Dourados também poderiam figurar na lista de jurados do juízo estadual da Comarca de Dourados.

Para o MPF, nem mesmo a realização do Tribunal do Júri em Campo Grande seria suficiente para garantir a imparcialidade. Manifestações na Assembléia Legislativa sul-mato-grossense, condenando os acampamentos indígenas e relativizando a morte das lideranças, bem como opiniões desfavoráveis aos índios em diversos jornais do estado também foram juntadas ao processo, para mostrar que um júri federal realizado em qualquer subseção judiciária do estado teria viés contrário aos índios.

O MPF apresentou ainda nota técnica elaborada pelo analista pericial em antropologia da instituição, considerada pelos desembargadores do TRF 3 como sendo muito clara e bem fundamentada, no sentido de não haver no local condições de isenção suficientes para garantir um julgamento imparcial.

Segundo argumentou o MPF, existe um forte preconceito contra o povo indígena por parte de membros importantes da sociedade sul-mato-grossense. Entre as críticas aos indígenas, proferidas pela Assembléia Legislativa apenas dois meses após a morte de Veron, estava o fato de os índios terem enterrado o líder na própria área ocupada. O enterro foi realizado com amparo de uma decisão da Justiça Federal proferida em resposta a uma Ação Civil Pública do MPF e, por esse motivo, a instituição também foi criticada por “apoiar indistintamente as invasões de terras privadas”.

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