Gangues transformam noitadas nos altos da Afonso Pena em “caldeirão” da violência
De segunda a sexta-feira Afonso Pena é apenas uma avenida como outra qualquer em Campo Grande: trânsito, calçadão, pontos comerciais; no domingo à noite o local se transforma num verdadeiro caldeirão da violência com bebedeiras, som alto e confrontos entre gangues
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De segunda a sexta-feira Afonso Pena é apenas uma avenida como outra qualquer em Campo Grande: trânsito, calçadão, pontos comerciais; no domingo à noite o local se transforma num verdadeiro caldeirão da violência com bebedeiras, som alto e confrontos entre gangues
Conexão Jamaica, Guris da Mata, Maloca do Tiradentes, Turma da Planalto, Guris do Margarida. Estes são alguns nomes de grupo de adolescentes e até maiores de idade que se reúnem em verdadeiras facções e fundam gangues em Campo Grande. O número de “malocas”, termo utilizado pelos integrantes, não é sabido ao certo, mas o que se sabe é que quando grupos rivais se encontram o mínimo que acontece é pancadaria.
O Midiamax conseguiu identificar e conversar com um integrante de gangue enraizada na região Norte de Campo Grande. Sua turma tem mais de 50, entre maiores e menores de idade, de ambos os sexos. Invadir território demarcado por rivais significa desafiar para briga e em muitas vezes estes confrontos acabam em morte. Um exemplo foi um garoto esfaqueado durante um show sertanejo no Parque das Nações Indígenas, que acabou morrendo na Santa Casa de Campo Grande antes mesmo de receber atendimento médico.
“A gente já sai de casa armado com faca, pau, revólver, punhal. É um orgulho quando a gente coloca os caras pra correr. É uma sensação de prazer quando isto acontece”, diz o integrante de da gangue – que não será identificado na matéria por motivos de segurança. Ele será tratado apenas pelo nome fictício de Chulepa.
Chulepa descreve que os confrontos entre gangues acontecem em festas, geralmente shows gratuitos ou não, clubes. O principal ponto é a Avenida Afonso Pena, mais precisamente na região próxima ao Parque das Nações Indígenas. Domingo à noite é o estopim para os acertos de conta, pois ali se reúnem amantes do som automotivo que acabam atraindo a atenção das gangues. “Tem muita mulher rebolando, bebida. Daí onde tem o barulho mais alto a gente vai chegando. Se já tem gente de outro grupo (gangue) já começam a fazer roda em volta, dançar, provocar. Quem é mais forte, tem mais gente, sempre bota o outro grupo pra correr”, diz.
O garoto revela que chega ser muito fácil comprar uma arma na Capital, sem revelar com quem conseguiu adquirir a sua. O valor para um 38 está em média R$ 600,00. Um 32 pode ser comprado a partir de R$ 100,00. “Eu tô nesta vida porque gosto mesmo. Eu sou o fofo lá da vila porque chego com dinheiro, droga. A mulherada tudo fica em volta”, gaba-se Chulepa.
O “maloqueiro” revela que a gangue Conexão Jamaica, formada por jovens do bairro Mata do Jacinto, tem até um rap composto especialmente para ser cantado pelos integrantes. Inclusive, se alguém de outra denominação ousar cantar trechos e for descoberto, na certa irá, no mínimo, apanhar do grupo rival.
Afonso Pena é o point mais procurado
A avenida Afonso Pena, na Capital, foi o ponto eleito para as gangues se encontrarem, fazer confronto ou esperar por outro no término de shows. O local já pode ser batizado de panela de pressão, pois em quase todo final de semana tem pancadaria. Alguns, quando tem morte, acabam ganhando repercussão na mídia, como foi o caso do baleamento do garoto Felipe Machado Felício, no dia 3 de outubro, em frente ao shopping Campo Grande. Os acusados do crime estão presos Willian Paniago Nery (18) que confessou ser o autor do disparo e Ewerton Cosme Fernandes Silva, conhecido como Guinho, 22, que era dono da moto utilizada no momento do crime. Bruno Lima Fernandes, 20 anos, apontado como o dono da arma também está preso. Willian disse à polícia que foi surrado pelo grupo da vítima, que pertencia a uma gangue do bairro Tiradentes.
Questionado se uma eventual falta de policiamento facilita os confrontos, Chulepa diz que tanto faz porque ele e seu grupo sempre ficam bebendo e usando drogas e, muitas vezes, a polícia chegou, revistou, jogou a bebida fora, ordenou que fossem embora para sua casas, mas ao saírem o grupo fez “vaquinha” e comprou outro garrafão de vinho. “A gente toma de tudo, mas o fino é o garrafão de cinco litros”, diz.
Os grupos, normalmente, saem do bairro em direção à avenida sempre a pé. No trajeto já vão promovendo baderna: assoviando paras as mulheres, destruindo patrimônio. Uma coisa é igual lei de cadeia: ninguém pode cometer violência sexual ou tentar algum outro tipo de envolvimento sem o consentimento da mulher. O castigo é surra coletiva, onde cada integrante da gangue chuta, dá socos, pontapés do “transgressor”.
Indícios
Chulepa está no mundo do crime, mas tem consciência de que isto é errado. Filho de pais separados, mãe quase que desconhecida, criado por familiares, o jovem faz um instante de reflexão quando é questionado sobre os motivos que levam uma pessoa a fazer parte de uma gangue e ainda gostar deste mundo turbulento. “A falta de estrutura na família é o começo de tudo. Depois vem a revolta com a situação desgraçada que vive neste ambiente. A bebida, droga, arma e gangue são consequências lógicas. Dos maloqueiros ninguém tem consideração pelo pai porque geralmente é ele que vem tirar satisfação das coisas erradas, bate. É o bruto da história. É difícil ver alguém falar da mãe”, diz.
Ele ainda tem seu “momento bom menino” e diz que os pais não devem deixar seus filhos saírem sozinhos ou com amigos pra festas. “Tem que ir junto. Não interessa se o guri ou a menina são evangélicos porque quando chega num ambiente destes tem sempre um pra convidar pra um rolê, e aí vai: já oferece uma bebida, já mostra as gurias rebolando em cima dos carros e quando vê já é um do grupo”, revela.
Engana-se quem pensa que gangue é coisa apenas de pessoas de classes sociais mais baixas. Chulepa revela que na região do bairro Carandá Bosque existe um grupo que também aterroriza. “Lá tem muito burga. Já vi passarem em carrões até com armas de grosso calibre na mão e apontando pra gente”.
“Falta cultura e referência”
Uma das delegacias que acaba recebendo jovens maiores de idade com envolvimento com gangues é a Derf (Especializada na Repressão de Roubos e Furtos). Embora a maioria dos integrantes sejam menores de idade, um dia acabam chegando à maioridade no mundo do crime. Muitos que não trabalham acabando se envolvendo em roubos e furtos para poder sustentar o vício das drogas, comprar roupas bacanas, sapatos da moda e bancar a bebedeira das garotas do grupo.
O delegado André Luiz Novelli resume como causas para busca de uma gangue a falta de cultura e referência familiar. Por conta disto acabam encontrando na rua um berço que não cobra, propicia a adrenalina do perigo. “O País tem problema de crise moral. Que referência familiar este jovem vai ter de certo ou errado?”, questiona.
Para Novelli é uma visão míope acreditar que apenas a polícia é a responsável por combater a criminalidade, no caso as guangues. “Estes garotos estão numa idade hormonal muito perigosa, onde se quer aprender e, infelizmente, eles não tem onde conseguir este referencial dentro da própria casa e o mundo os espera fora deste ambiente. Muitas vezes o caminho errado é o mais fácil de se achar”.
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