A MedTrans, que tem entre os sócios-cotistas Carolina Neder dos Santos Pereira, aparentada do diretor do órgão, Carlos Henrique dos Santos Pereira, já teve contrato de R$ R$ 2,4 milhões no ano passado.

O Detran-MS publicou a inexigibilidade de licitação para serviços de exames médicos em dez municípios de Mato Grosso do Sul. Entre as empresas contratadas sem concorrência com base em dispositivos legais, o maior volume de dinheiro vai para a MedTrans, que tem entre os sócios-cotistas a médica Carolina Neder dos Santos Pereira, aparentada do diretor do órgão, Carlos Henrique dos Santos Pereira.

A publicação aconteceu na edição de sexta-feira (22) do Diário Oficial. São dez clínicas credenciadas que devem receber dos cofres públicos do Detran-MS um total de R$ 3.454.461,28 (três milhões, quatrocentos e cinqüenta e quatro mil, quatrocentos e sessenta e um reais e vinte oito centavos). Desse montante, R$ 2,9 milhões ficam com a empresa de Carolina dos Santos Pereira.

A médica também consta como Tabeliã e Oficiala substituta do 9º Ofício Santos Pereira, cartório de Campo Grande que pertence à família do diretor do Departamento Estadual de Trânsito de Mato Grosso do Sul.

A empresa da qual Carolina Santos Pereira é sócia também foi contratada pelo órgão público no ano passado, sem a inexegibilidade de licitação, para prestar os mesmos serviços com um valor de R$ 2.586.430,00 (dois milhões, quinhentos e oitenta e seis mil, quatrocentos e trinta reais). Carlos Henrique Santos Pereira já era diretor do Detran-MS.

Os contratos incluem a prestação dos serviços por médicos que realizam os exames de aptidão física e mental nos candidatos à obtenção, renovação, inclusão ou mudança de categoria da Carteira Nacional de Habilitação.

Todo o processo de contratação foi feito sem necessidade de licitação com base no artigo 25 da Lei 8.666. O Detran-MS, através da assessoria, se limitou a dizer que a MedTrans está credenciada para prestar o serviço, mas se negou a fornecer dados de contato da empresa.

Endereço de correspondência

Segundo a Secretaria da Receita Federal, a empresa registrada como MEDTRANS Serviços Médicos tem sede na Rua José Antonio, 2732, em Campo Grande. Em visita ao endereço, a reportagem foi recebida por uma funcionária que disse nunca ter visto a sócia no consultório porque ela não trabalharia no local.“Aqui é só endereço de correspondência da MedTrans”, disse.

Questionada sobre o alvará de funcionamento da empresa, a funcionária disse que o documento, de fixação obrigatória nos endereços comerciais, havia sido “enviado para a o contador”.

“Apenas” sócia

O psiquiatra Alex Leite de Melo, que se declarou responsável pela MedTrans, confirmou que a empresa presta serviços para o Detran-MS e que Carolina Santos Pereira é sócia. “Somos em vinte médicos, temos uma sociedade”, admitiu.

Sobre o vínculos de parentesco da sócia com o diretor do órgão público que é o principal cliente da empresa, o médico desconversa. “Acho que ela é filha de um primo do Carlos Henrique dos Santos Pereira”, informou por telefone.

Com relação ao fato de a médica responder pela responsabilidade técnica da MedTrans, ele disse que ela seria “apenas” sócia. “Ela não é responsável técnica não. É só cotista da empresa”, garantiu.

A reportagem tentou contato com Carolina dos Santos Pereira, mas não conseguiu falar com ela até o momento da publicação. Porém, segundo a Portaria Detran-MS “T” Nº147, assinada pelo próprio Carlos Henrique Santos Pereira em março, confirma Carolina como responsável técnica pela clínica no período de 8 de março deste ano até 1º de agosto. A informação foi publicada no Diário Oficial de 11 de março de 2010.

Coincidentemente, a MedTrans foi aberta poucos dias após a publicação da Portaria 97, que, em 14 de maio de 2009, definiu as normas do credenciamento para as empresas que prestariam os servíços de exames médicos para o Detran-MS. Carlos Henrique dos Santos Pereira, como diretor presidente do órgão, foi quem assinou a Portaria.

Pagamento certo

De acordo com o artigo 23 da tal Portaria, o pagamento do serviço prestado pela Entidade, por exame realizado, equivale a 70% do valor da taxa cobrada dos motoristas, caso o serviço seja feito nas dependências do Detran, ou a 80% da taxa cobrada dos contribuintes quando o exame é feito na clínica credenciada.

A remuneração é creditada pelo próprio Detran-MS em conta corrente da empresa ou diretamente ao médico até o 20º dia do mês subseqüente. Os pagamentos certos e feitos com base em relatório do sistema SIHAB, que controla os exames efetivamente recolhidos.

Portaria 97

A Portaria 97, assinada por Santos Pereira (o diretor), e que permitiu à empresa de Santos Pereira (a médica), ser contratada sem exigência de licitação, define uma série de critérios para contratação dos serviços médicos iguais aos prestados pela MedTrans.

O argumento para ratificação da inexigibilidade da licitação utilizado no processo de contratação das empresas foi o artigo 25 da lei 8.666, que abre a brecha legal para em casos como os de notória especialização, por exemplo, ser feita a escolha sem concorrência.

Carolina Neder dos Santos Pereira consta em uma lista da Associação Brasileira de Medicina de Tráfego como aprovada em concurso para obtenção do título de especialista em medicina de tráfego apenas em 20 de junho de 2010.

Além disso, no cadastro da Secretaria de Receita Federal, consta como atividade econômica principal da MedTrans o ítem “Atividades de atenção ambulatorial não especificadas anteriormente”.

Pela Portaria 97, as empresas devem ainda fornecer alvará de Licença da Prefeitura Municipal, compreendido o alvará sanitário e de localização, e certidão do Conselho Regional de Medicina de registro da Entidade junto ao referido Conselho.

Espécie de Convênio

Para o diretor administrativo do Sindicato dos Médicos, João Batista de Medeiros, pelo fato de o Detran-MS ser uma autarquia, o procedimento seria diferenciado. “É uma consulta especializada que o médico assina um laudo técnico. No caso do Detran, não se pode considerar um serviço público, pois é uma autarquia, uma espécie de convênio”, divagou.

Mesmo com todos os requisitos, a escolha das entidades e médicos que vão prestar os serviços é feita por uma “comissão especial de credenciamento”, novamente sob a influência do aparentado Santos Pereira.

O diretor presidente Carlos Henrique dos Santos Pereira foi procurado pela reportagem. A assessoria informou que ele estava em reunião fora do Detran-MS e não poderia atender o telefone. Segundo a assessoria, “assim que for possível”, Santos Pereira se posicionará sobre a questão.