Pode ter sentido a denuncia ainda que sem prova do deputado estadual Ivan de Almeida, do PRTB, conhecido como coronel Ivan, que levantou suspeita sobre a construção de prédios aos arredores de nascentes de rios, perto do shopping Campo Grande, uma das áreas mais valiosas da cidade.

O parlamentar disse em entrevista divulgada na semana passada por uma emissora de rádio da Capital que, em troca da aprovação dos projetos que permitiram a construção dos prédios, a empresa responsável, Plaenge, teria presenteado algumas autoridades com apartamentos.

O microempresário, ambientalista e membro Associação Bálsamo, Eduardo Romero, disse que o mercado imobiliário exerce uma forte influência sobre o conselho municipal do meio ambiente, órgão que opina na hora de alguma empreiteira explorar determinada região da cidade.

Também conselheiro da ONG Ecoa (Ecologia e Ação), integrante da Rede de Juventude pelo Meio Ambiente e militante do partido Verde, Romero em entrevista ao Midiamax diz que alguns projetos para a construção de prédios na cidade chega ao conselho “já recomendados”. Eis o diálogo do ambientalista com a repórter Valquíria Oriqui.

Midiamax – Como ambientalista qual a sua opinião sobre o impasse que envolve o deputado coronel Ivan e a construtora que, segundo ele, fez muitos prédios no entorno do Córrego Prosa, o que teria motivado a abertura da cratera da Avenida Ceará, segundo o parlamentar?

Romero – Admiro e respeito a coragem do deputado Ivan, pois a cada dia mais a classe política se deixa levar pelos interesses próprios, fecha-se acordos vergonhosos e prejudicam a sociedade. Não posso afirmar nada sobre a denuncia/impasse que o envolve, mas como cidadão eu sinto a necessidade de uma investigação séria e comprometida. Um fato é real: todas as áreas de fundo de vale, como essa da denuncia, têm sido negociadas na cidade, não sabemos os critérios e nem os beneficiados, mas isso pode gerar um grave problema dentro de 30 ou 40 anos. Daqui a pouco não teremos mais áreas de preservação ambiental, pois em todas têm sido instalado edifícios, basta dar uma volta pela cidade e se constata isso, um absurdo. Manter essas áreas preservadas é vital para qualquer cidade que não queira ser vítima de enchentes e alagamentos.

Midiamax – Romero, o senhor já fez parte do Conselho de Meio Ambiente, como são os trâmites para que uma obra possa vir a ser feita dentro do perímetro urbano?

Romero – Legalmente toda obra que ofereça grandes impactos ambientais precisa passar pelo CMMA, o Conselho deve dar o parecer favorável ou contrário, o fato é que muitos desses pareceres saem com recomendações. Veja como exemplo: para instalar a nova Rodoviária foi recomendado que se fizesse um Parque no Córrego Bálsamo, e até agora nada. Há muita articulação política nesses Conselhos. Todas as áreas são representadas, é uma queda de braço constante. O setor imobiliário é forte, articulado e financia muita gente da vida política, vale ressaltar que o poder público tem a maioria dos assentos, ai já viu.

Midiamax – O Ministério Público tem conseguido acompanhar de perto os problemas ambientais da cidade?

Romero – Infelizmente não. Não sei se a demanda que é grande ou se o interesse não existe. Toda vez que oferecemos uma denuncia ao MPE leva-se uma eternidade para apurar os fatos e na maioria das vezes as denúncias nem são respondidas. Isso é ruim para a democracia e para a sustentabilidade da Cidade.

Midiamax – Quais são os pontos mais polêmicos que o senhor considera no que diz respeito a meio ambiente hoje na Capital?

Romero – O lixão é uma vergonha, estamos patinando nisso por questões políticas mesmo. Falamos de coleta seletiva, até tem isso escrito nos caminhões da coleta, uma vergonha e mentira, pois ainda armazenamos as mais de 700 toneladas de lixo/dia no lixão. Temos 33 córregos na cidade, e todos, todos estão poluídos, não adianta ter um mapinha que mede a poluição, precisamos é recuperar, evitar e acima de tudo cumprir as determinações legais da mata ciliar. Cada curso de água, com a vegetação, que mantemos na cidade reduzimos a onda de calor, influenciamos na quantidade de chuva, melhoramos a qualidade do ar, mas isso é ignorado atualmente. Fizemos alguns parques lineares (Prosa, Segredo e Bandeira) isso é ótimo, mas precisa ser mais sério esse programa.

Midiamax – Recentemente uma recicladora de pneus foi incendiada e por seis dias a fumaça tóxica tomou conta do bairro. O que deveria ser feito para que isso não acontecesse?

Romero – Devia-se ter um controle de segurança mais eficaz. A recicladora deve ser responsabilizada e no mínimo realizar uma ação que compense o dano, seja plantio de árvores, ou seja, recuperando, por exemplo, uma área degrada. São por essas e outras razões que é necessário manterem uma boa massa arbórea, pois as plantas ajudam a reduzir esse impacto.

Midiamax – Para finalizar, como o senhor avalia o problema da coleta de lixo em Campo Grande? Temos o Lixão, que infelizmente serve de sustento para famílias pobres, e em toda a redondeza há problemas ambientais. O que poderia ser feito naquela localidade?

Romero – O problema do lixo que menciono acima é vergonhoso. Uma capital que se enche de orgulho em dizer que tem qualidade de vida, não pode em hipótese alguma manter um lixão, uma coisa tão ultrapassada e ambientalmente tão errada. Devemos implantar a coleta seletiva de lixo de verdade, envolver essas famílias que estão hoje no lixão nesse processo, ser co-participes, eles tiram o sustento dali por não terem outra opção. Se houver vontade política e comprometimento na coleta seletiva, em transformar o entorno, vale lembrar que nas proximidades do lixão estão os bairros mais carentes da Capital, é preciso criar e estimular ações de geração de emprego e renda ali, isso é possível.

Midiamax – Qual a sua formação? Nasceu onde? Tem filhos? E há quanto tempo se dedica à preservação ambiental? Continua filiado ao PV? Tem pretensões políticas?

Romero – Sou Jornalista e Ator por formação. Nasci em Fátima do Sul (MS). Sou solteiro. Dedico-me as questões ambientais há 16 anos. Sou filiado ao PV, suplente de vereador em Campo Grande.

Midiamax – O senhor se sente satisfeito com o trabalho que vem sendo realizado em Campo Grande? A Capital possui hoje uma secretaria de meio ambiente, o senhor acha que o trabalho da secretaria é suficiente? Em que ponto ela deixa a desejar? Em que ponto ela é louvável? O que pode ser feito para melhorar?

Romero – A cidade tem crescido, tem se firmado como Capital. Não restam dúvidas que o sistema viário, os Parques Lineares, a nova Rodoviária, dão outra imagem para Campo Grande, porém não podemos esquecer o entorno, não dá para ficar só na estética da cidade, é preciso pensá-la de verdade. Temos uma Secretaria de Meio Ambiente que deixa a desejar e muito. Recentemente tivemos a polêmica dos envenenamentos de árvores na cidade, e o posicionamento da SEMADUR foi dizer que não tinha condições de fazer os estudos para saber a verdadeira causa da morte, isso é absurdo, acaba estimulando a impunidade, ainda bem que a coisa não ficou só nisso. Vejo pouca priorização nas questões ambientais, o foco da secretaria está no urbanismo, e isso é perigoso. Embora tenha minhas críticas a SEMADUR, reconheço e louvo o programa CÓRREGO LIMPO CIDADE VIVA, a iniciativa em trabalhar isso com os alunos e comunidade, só defendo que isso devia ser mais intenso e que a recuperação fosse real. Para melhorar é preciso estar conectado com a realidade, eu não vejo, por exemplo, a Secretaria fazendo audiências públicas, não vejo o setor ambientalista sendo convidado para discutir projetos, propor ações, isso só acontece quando há impasse político, precisa ser uma constante, pois em conjunto erramos menos.

Midiamax – O meteorologista Natálio Abrão disse que obra bem feita resiste a chuvas. O senhor como ambientalista, como explica esses alagamentos e desmoronamentos, tanto em Campo Grande como no interior do estado?

Romero – A maioria dos problemas que enfrentamos é por qualidade de serviço e priorização de investimentos, muitas vezes não se tem a visão holística da cidade. Pensamos somente no valor econômico/financeiro do momento da obra e esquecemos o que isso representara a médio e longo prazo. As cidades vão crescendo, desmatam tudo o que podem, acabam com os cursos d’água, impermeabilizam o solo, chega uma hora que ultrapassa o limite. Na natureza tudo é interligado.

Midiamax – Como o senhor analisa as usinas que já não são mais aprovadas em São Paulo, que é um Estado tomado por indústrias? Como o senhor vê as instalações de usinas em MS? Qual a consequência disso em longo prazo para o Estado?

Romero – Isso é um tiro no pé. Toda monocultura por si só oferece riscos, estão pintando a cana como à salvadora de tudo. Penso que se realmente essa é a melhor opção no momento, que ao menos seja feita de forma responsável e criteriosa. Sou contra o plantio no Pantanal. Para entendermos nosso Mato Grosso do Sul, precisamos saber que estamos entre duas Bacias Hidrográficas, a do Paraná (região de nosso planalto, águas corrente, mais da metade do Estado, e que por uso da agricultura descontrolada, temos as maiores áreas degradadas) e de outro lado a BACIA ALTO PARAGUAI (BAP, onde está o Pantanal, nossa planície, águas calmas, local ainda “preservado”, dado a cultura e relação do homem pantaneiro e das dinâmicas hídricas). O que não fica claro é porque entra Governo, sai Governo, e a vontade de plantar cana e instalar usinas no Pantanal volta à tona. Temos mais da metade do Estado apto a isso, embora vale ressaltar que qualquer monocultura pode ser ameaça. Esta briga se dá desde os anos 80. Por essa causa já perdemos gente.