Em meio ao apagamento étnico, indígenas Guató lutam contra classificação de ‘ribeirinhos’
A classificação de povos indígenas como ribeirinhos pode resultar na perda de terras e menor acesso à saúde
Lethycia Anjos –
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Indígenas do povo Guató ocupam territórios de Mato Grosso do Sul há mais de um século. No entanto, diversas ameaças colocam em risco sua existência. Em nota divulgada nesta terça-feira (21), o Conselho de Lideranças do Povo Guató no Guadakan/Pantanal denunciou a invisibilidade étnica enfrentada pelos povos indígenas, que pode resultar na perda de territórios.
Desde desastres ambientais, como os incêndios, até a falta de acesso à saúde e o apagamento étnico, indígenas alertam que diversas situações podem levar à ‘extinção’ do povo Guató. A nota afirma que a classificação de comunidades do povo Guató como ‘ribeirinhas’ tem ocorrido com apoio de ONGs (Organizações Não Governamentais), representantes das elites econômicas e políticas locais, pesquisadores, agentes públicos e órgãos do Estado.
Se classificados como ‘ribeirinhos’, o povo Guató perderia os direitos originários sobre as terras tradicionalmente ocupadas, além de não receberem mais assistência em saúde por parte da Funai (Fundação Nacional dos Povos Indígenas), Sesai (Secretaria Especial de Saúde Indígena) e MPF (Ministério Público Federal).
Povo Guató luta para não ser classificado como ‘ribeirinhos’
“No Pantanal profundo, a ausência eficaz do Estado Brasileiro aumenta a vulnerabilidade social e favorece a perpetuação de várias formas de violência contra nossas comunidades, inclusive para a transformação de terras indígenas não regularizadas em propriedades privadas e unidades de conservação”, diz a nota.
Segundo o Conselho, isso ocorre porque as comunidades do povo Guató estão localizadas em lugares distantes dos centros urbanos, onde o principal meio de transporte são as canoas e embarcações a motor.
“Para muitos não indígenas, o destino natural dos Guató seria transformar-se em ‘ribeirinhos’… Quando usamos roupas e celulares, por exemplo, para eles deixamos de ser indígenas. A pele mais escura, atribuem a nós o rótulo de ‘quilombolas’… Se a pele é mais clara, classificam como descendentes de argentinos, paraguaios e outros estrangeiros”.
Histórico de exclusão
O contexto histórico corrobora a denúncia. No século XX (20), o povo Guató foi tido como “extinto” no Brasil. No entanto, o Conselho argumenta que a comunidade nunca deixou de existir. “Resistimos à nossa maneira no Pantanal ou Guadakan, o mundo das águas onde somos o que somos”, enfatizam.
A partir de 1976, a comunidade da Aldeia Uberaba, localizada na TI (Terra Indígena) Guató, rompeu com a situação de invisibilidade étnica em Corumbá, Mato Grosso do Sul.
Já no início da década de 2000, a comunidade das aldeias Aterradinho e São Benedito, situadas na TI Baía dos Guató, fez o mesmo em Barão de Melgaço, Mato Grosso.
Em 2023, a comunidade da Aldeia Barra do São Lourenço seguiu o mesmo caminho em Corumbá e rompeu com o rótulo de ‘ribeirinhos’, imposto mais recentemente, a muitos coletivos originários.

Incêndios devastaram 80% do território Guató
É dos ramos secos do aguapé, planta típica do Pantanal, que artesãs criam peças únicas e difundem a cultura do povo Guató por todo o Brasil. No entanto, a recorrência dos incêndios florestais tem diminuído drasticamente os aguapés, colocando em risco a continuidade de um saber ancestral transmitido de geração em geração.
Desde 2020, os incêndios que assolaram o Pantanal de Mato Grosso do Sul devastaram 80% dos territórios, na Terra Indígena Baía dos Guató.
“Grande parte dos incêndios são a tentativa de fazendeiros e aliados de nos expulsar do Pantanal. Muitas famílias e comunidades indígenas ainda não conseguiram romper com a situação histórica de invisibilidade étnica”, argumentam.
A comunidade da Aldeia Barra do São Lourenço também enfrentou o mesmo problema em seu território. A TI Guató, por sua vez, foi socorrida em tempo e não registrou perda da cobertura vegetal.
“Em 2024, os incêndios voltaram a assolar a região, mas felizmente nossas comunidades foram socorridas rapidamente. Por isso, somos gratos a todas as pessoas e instituições que nos apoiam. Tanto na preservação do Pantanal quanto na sobrevivência nos territórios”, diz a nota.
Embora tenham recebido ajuda, na Barra do São Lourenço crianças e idosos passaram a apresentar problemas respiratórios por conta da inalação de fumaça dos incêndios. Além disso, o Conselho destaca que em todas as comunidades as águas estão contaminadas por cinzas. Essa contaminação as tornam impróprias para o consumo humano.
Em meio a um cenário preocupante, o Conselho manifestou repudio sobre a situação do atendimento à saúde por parte da Sesai. A entidade também solicitou apoio do Dsei (Distrito Sanitário Indígena) de Mato Grosso do Sul, para as Aldeias Uberaba e Barra do São Lourenço, em Corumbá.

Acesso à saúde comprometido
As comunidades estabelecidas em terras demarcadas, como as TIs Guató e Baía dos Guató, recebem atendimento por parte da Sesai. Na Aldeia Uberaba, porém, os indígenas pedem que atendimento seja aprimorado. Eles solicitam a contratação de Agentes Indígenas de Saneamento e a expansão do sistema de abastecimento de água tratada para as famílias.
“Precisamos da manutenção periódica e preventiva do gerador que bombeia água tratada em Corumbá, para onde periodicamente se deslocam pessoas das Aldeias Uberaba e Barra do São Lourenço, em busca de atendimento médico, há a necessidade de um lugar para o acolhimento dos pacientes indígenas”, solicitam.
Na comunidade da Barra do São Lourenço, o Conselho afirma que em 2024, as equipes do Dsei-MS não compareceram ao território. Além disso, denunciam que, repetidas vezes, membros do Conselho buscaram conversar sobre o problema, mas sem solução.
“No ano passado, tivemos informações de que a Sesai não teria enviado equipes à Aldeia Barra do São Lourenço. Disseram que o nível do rio Paraguai estaria baixo para viagens de barco. Curiosamente, barcos de turismo e embarcações das Forças Armadas conseguiam navegar pela região”, afirma o Conselho Guató.
Por fim, a nota reivindica que os coordenadores do Distrito Sanitário Indígena de Mato Grosso do Sul, bem como as Coordenações Regionais da Funai e o MPF nos dois estados, garantam o acesso à saúde do povo Guató.
“A Sesai deve incluir todas as nossas comunidades em suas ações no Pantanal. Fazendo cumprir as competências expressas no Art. 46 do Decreto n. 11.798, de 28 de novembro de 2023”.
O Jornal Midiamax solicitou um posicionamento do Dsei-MS sobre as denúncias informadas pelo Conselho Guató, mas não obteve retorno.
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