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Cotidiano

Cruel e persistente, racismo nas escolas de MS é reflexo da sociedade que exclui

Racismo é recorrente em ambiente onde deveria prevalecer a educação: a escola
Priscilla Peres -
(Imagem do Google Gemini, gerada por IA)

“Ninguém nasce odiando outra pessoa pela cor de sua pele, por sua origem ou ainda por sua religião. Para odiar, as pessoas precisam aprender, e se podem aprender a odiar, elas podem ser ensinadas a amar”.

Aos 20 anos, um jovem negro cita a frase de Nelson Mandela, proferida uma década antes de ele nascer. Entender a origem e forma como o racismo se perpetua na sociedade é a maneira que ele encontrou de enfrentar a violência sofrida em sua adolescência, na escola em que estudava.

Com todo apoio da família e amigos, ele levou o caso adiante. Fez boletim de ocorrência e um processo criminal contra as ofensas ouvidas. E, assim, descobriu o quão difícil é ter seus direitos garantidos e defendidos quando o assunto é racismo.

Esse jovem, que prefere não se identificar, é vítima e exemplo de um crime recorrente, praticado em ambiente onde deveria prevalecer a educação: a escola. É ali que se aprende sobre história e consciência, mas também onde os colegas chegam a demonstrar seu lado mais preconceituoso.

Pesquisa ‘Diversidade Jovem 2024′, da Espro, revela que 80% dos jovens negros afirmam ter sofrido preconceito racial no ambiente acadêmico. Os dados são alarmantes, por mostrar o quão opressor pode ser o ambiente escolar.

Entrevista sobre racismo na escola. (Foto: Helder Carvalho, Jornal Midiamax)

Recorrentes, mas subnotificados

De tempos em tempos, surge uma notícia de racismo nas escolas. O conteúdo sempre chocante faz com que muitos se questionem sobre a crueldade que pode ser proferida entre crianças e adolescentes. No mais recente, em , alunos criaram um grupo racista contra uma adolescente negra.

Quem atua diretamente com educação e políticas públicas afirma: a escola é uma reprodução da sociedade. Ou seja, o que acontece na sociedade reverbera no ambiente escolar. E assim voltamos à frase do Mandela: as pessoas aprendem a odiar, mas podem aprender o contrário.

Talvez o maior problema do racismo nas escolas seja a estatística, ou melhor, a falta dela. Por mais que exista, o racismo só se materializa em crime quando é denunciado. E isso quase não acontece. As pessoas são resistentes à denúncia, principalmente por desacreditar em consequências e punições.

Nosso personagem fala sobre o assunto, questiona a falta de providências sérias para os crimes cometidos em ambiente escolar e mais, a dificuldade para se conseguir levar uma denúncia de racismo adiante. Ele viveu tudo isso na pele e afirma que a escola ainda é vista como um ambiente onde há pouca consequência para os atos. Crimes de racismo, por exemplo, são levados para esfera de conciliação, e não da punição.

“Essa pouca consequência para os atos praticados dentro das escolas, essa certeza da impunidade e a falta de protocolos sérios para lidar com os casos fazem com que as pessoas não denunciem o que acontece no ambiente escolar”, afirma o estudante.

Estudante vítima de racismo. (Foto: Helder Carvalho, Jornal Midiamax)

Coragem para enfrentar

Subsecretária de Políticas Públicas para a Promoção da Igualdade Racial em MS, Vânia Lúcia Baptista concorda com o posicionamento do jovem e fala sobre a importância do enfrentamento aos casos de racismo. “Tem que tirar do campo da brincadeira, é racismo, uma violência que deve ser combatida”.

Especialista em Gestão de Políticas Públicas e Escolar, relacionados a gênero e raça, Vânia concorda que, muitas vezes, há uma naturalização das diversas exclusões em relações interpessoais. Mas precisa haver um enfrentamento aos crimes que acontecem.

Precisamos ter uma ação anti-racista para enfrentar e, para isso, entender que ainda existe o racismo, que ele é presente e que machuca pessoas”, conta. Segundo Vânia, quando um caso é conhecido, significa que pessoas estavam conscientes sobre o crime, que denunciaram, e isso serve de exemplo para toda a sociedade.

A mãe do nosso personagem corrobora a fala de Vânia. Ela sofreu junto do filho, com o racismo sofrido por ele na escola, e lutou para não ser “só mais uma ofensa”. Foi ela quem deu voz e coragem ao filho e quem fez questão de buscar seus direitos.

“Quando acontece, a gente não sabe o que fazer, a quem recorrer, como de fato agir para que o crime seja punido. Mas eu sabia que o que aconteceu era grave e precisava de punição“, conta ela, que enfrentou verdadeira peregrinação para levar o caso adiante.

Essa mãe fez valer o direito do seu filho de ser respeitado dentro do ambiente escolar. Mas afirma que “não é fácil”. Hoje, ela ainda luta e sofre sempre que uma notícia de racismo em escolas ganha repercussão. “Eu sofro, porque sei o que a família vai enfrentar e sei que é um desafio, mas não deixar de fazer“, afirma a mãe.

Educação atenta, mas com passos lentos

Há um esforço no âmbito da educação estadual de implementar o debate sobre o racismo nas escolas. Mas o movimento não é orgânico, exige boa vontade e interesse de e diretores de escolas em se inteirar sobre o assunto.

Fato é que o tema não é inerente ao ambiente escolar, mas está presente em muitas escolas devido a projetos, premiações e interesse dos professores no assunto. No que cabe ao Estado, são oferecidas capacitações constantes para quem quer aprender sobre educação no âmbito racial e de gênero.

Em , há o Pro-Erer/MS (Programa Raças e Etnias de MS – Educação para Relações Étnico-Raciais) e o Selo Erer/MS (Selo Educação para Relações Étnico-Raciais), iniciativas que visam fortalecer e reconhecer escolas que implementam ações pedagógicas e de gestão em torno da educação para as relações étnico-raciais.

Algumas escolas se destacam, outras nem tanto. Mas, na prática, ações de enfrentamento e de reação a casos de racismo nas escolas passam muito pela vontade pessoal dos agentes envolvidos. Além disso, a educação acredita na necessidade de responsabilidade, mas com orientação.

“Alunos são sujeitos em desenvolvimento, que precisam de orientação para além do crime. Escola não é juiz, o trabalho é de sensibilização para entender a ação, a prática criminosa e a necessidade de reação”, afirma Paola Lopes Evangelista, coordenadora de psicologia educacional e assistência social.

Ela explica que é comum a escola também ter de fazer o papel de ensinar o que é racismo para quem sofre. “Muitas vezes, é naturalizado ao ponto de que a escola precisa explicar que aquilo é errado, é crime, tem consequências”, destaca Paola.

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