Nunca documentados em seu habitat, filhotes gêmeos de anta foram filmados na Reserva Particular do Patrimônio Natural (RPPN) Trápaga, em São Miguel Arcanjo (SP).

O registro intriga  e anima os pesquisadores do Programa Grandes Mamíferos da Serra do Mar, responsáveis pelo registro e identificação dos animais. A descoberta representa esperança para a espécie que está ameaçada de extinção na Mata Atlântica.

Para os pesquisadores, conseguir registrar um evento que desafia as leis da natureza é, no mínimo, motivo de espanto e contemplação. Esses foram os sentimentos do grupo de cinco estudiosos quando se depararam, em dezembro do ano passado, com um vídeo de antas gêmeas, registrado por um equipamento fotográfico instalado na reserva. Assista:

Na Mata Atlântica, bioma onde ocorreu o registro, é um grande desafio um filhote de anta resistir diante do ciclo da própria natureza, mas também por ser um bioma muito ameaçado pela atividade humana, onde, além do desmatamento, as antas enfrentam ameaças como a caça, atropelamento, perseguições de cães domésticos, entre outras.

A surpresa dos envolvidos é pela gestação de gêmeos, já que se trata de uma espécie com o corpo preparado para gerar apenas um filhote. E a animação é porque os filhotes já têm cerca de um ano e meio. A confirmação veio em janeiro deste ano, depois de outros registros em imagem e observação direta, ou seja, vendo os animais presencialmente.

Para ter certeza de que se tratava do primeiro registro desse tipo na natureza, Mariana Landis, pesquisadora do Instituto Manacá, associado ao Programa Grandes Mamíferos da Serra do Mar, conta que outros pesquisadores foram envolvidos. “Além da nossa equipe, a pesquisadora Patrícia Médici teve um papel fundamental na confirmação dessa descoberta e sua raridade, nos ajudando também com a busca por relatos de antas gêmeas no mundo. Como desconfiávamos, não tinha nenhum caso similar documentado. Ficamos surpresos”, completa.

Embora as antas da espécie Tapirus terrestris sejam os maiores mamíferos terrestres da fauna silvestre da América Latina, as fêmeas só geram um filhote por gestação, que nasce com cerca de seis quilos, após 13 meses. “No Brasil, existem dois registros de filhotes gêmeos de antas nascidos em cativeiro. Nestes locais, esses animais têm o suporte de profissionais para garantir o sucesso do nascimento e desenvolvimento dos filhotes. Ainda assim é desafiador, demanda cuidado especial para sobreviver. Na natureza, essa mãe e os filhotes estão sozinhos, e os fatores que podem garantir a sobrevivência envolvem, além da saúde da mãe para gerá-los e nutri-los, sua dedicação intensa para protegê-los e uma floresta saudável que, no caso da Mata Atlântica, é cada vez mais difícil”, explica Mariana.

Monitoramento

A descoberta é fruto do trabalho de monitoramento realizado na reserva, que visa promover a observação de antas na natureza, gerando a sensibilização com a espécie, sendo uma das frentes de atuação do Programa Grandes Mamíferos da Serra do Mar. O programa é um dos maiores monitoramentos de mamíferos de grande porte já feitos no bioma Mata Atlântica e o primeiro em larga escala realizado nessa região, com principal objetivo de gerar dados para subsidiar planos de conservação da anta (Tapirus terrestris), do queixada (Tayassu pecari) e da onça-pintada (Panthera onca).