#CG122: Berço da cultura de Campo Grande, Amambaí mantém charme com arquitetura de época e arborização

Sem ‘boom imobiliário’, moradores que herdaram imóveis decidiram manter a história do bairro

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Bairro preserva características arquitetônicas e arborização
Bairro preserva características arquitetônicas e arborização

Criado há cerca de um século, o bairro Amambaí é um dos mais antigos de Campo Grande e ainda hoje mantém seu charme com traços arquitetônicos característicos da época e muito verde. Ao passear pelas ruas do bairro, é possível perceber aspectos que não são encontrados em outras regiões da cidade, como a arquitetura inspirada em cidades italianas, as ruas diagonais e locais com o traçado de ‘pata de ganso’. Além disso, o bairro foi moradia de diversos artistas e berço do grupo Acaba, um dos mais tradicionais de Mato Grosso do Sul. 

A história do bairro Amambaí começa ainda nos anos 20, com terrenos adquiridos para atender os militares em Campo Grande. A planta do bairro foi feita na Seção de Engenharia da Intendência Municipal e o chefe era o engenheiro Camillo Boni. O bairro preserva até hoje características que foram determinadas em seu projeto. 

Bairro ainda tem casas características da época de sua criação. (Foto: Henrique Arakaki/Midiamax)

 

Entre elas, havia uma determinação de que os estabelecimentos comerciais deveriam ficar localizados nas esquinas do bairro. Além disso, uma norma determinava o plantio obrigatório de árvores em cada lote, as casas deveriam ficar ao centro do terreno. Devido à determinação, o bairro acabou se tornando um local bastante arborizado, desde sua criação. 

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Ruas diagonais são características do Amambaí. (Foto: Henrique Arakaki/Midiamax)

“O traçado original [do Amambaí] sofreu alterações, muitas áreas públicas não se consolidaram, mas ele é um bairro que já nasceu com a proposta de ser arborizado”, comenta o arquiteto da Planurb (Agência Municipal de Meio Ambiente e Planejamento Urbano), Bruno Ferreira.

O arquiteto e urbanista Ângelo Arruda explica que Camillo Boni e sua equipe projetaram o bairro Amambaí com um traçado barroco, de formato sinuoso e irregular. “A sinuosidade existente no traçado viário do Amambaí é condizente com a sua condição topográfica o que permite afirmar que há uma correta aplicação das curvas projetadas com as curvas naturais do terreno e, com isso, o sistema de drenagem construído nos anos 60 é bastante eficiente”, escreveu em um ensaio sobre a formação urbana do bairro. 

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Bairro conta com o traçado ‘pata de ganso’. (Foto: Maps)

Bruno Ferreira afirma que o bairro tem o traçado das ruas diagonais inspirado nas cidades italianas. “O que fica característico [do bairro] é esse tipo de desenho ‘pata de ganso’, que vai ser onde temos a praça na Salgado Filho com a Bandeirantes e a rua Iguaçu. Ali forma esse tipo de desenho que a gente chama de ‘pata de ganso’, sai de forma radial, é um tipo de desenho que nasce na França”. 

O arquiteto da Planurb ressalta que o bairro surge com a ocupação de militares de baixa patente em Campo Grande. Depois, o Amambaí também passou a ser habitado por militares de alta patente. 

Para o professor Ângelo Arruda, outra característica marcante do bairro Amambaí é a existência de praças. Acredita-se que a maior delas teria sido prevista para a área que hoje é a Igreja Perpétuo Socorro. Nos anos 50, foi construída a praça Cuiabá, ao lado do Mercado Antônio Valente. Em 1992, a área foi urbanizada e se transformou na Praça das Araras. 

A praça das Araras é uma das principais do bairro. (Foto: Henrique Arakaki/Midiamax)

 

Em ensaio sobre o bairro Amambaí, Arruda explica que a ocupação original deu-se através da construção residencial e de algumas casas comerciais ao longo da rua 26 de Agosto. A princípio, as casas eram bem simples. “Com programa de quatro cômodos — sala de visitas, dormitório, sala de jantar e cozinha —, o banheiro está localizado na parte externa”.

Amambaí também foi berço da música em Campo Grande

O grupo Acaba surgiu em uma escola do bairro Amambaí. (Foto: Arquivo/Grupo Acaba)

 

Além da arquitetura marcante, o bairro Amambaí também foi berço da cultura campo-grandense. Diversos artistas moraram no bairro, mas um fato importante é que foi ali que nasceu o grupo Acaba. Uma curiosidade é que o grupo leva o bairro Amambaí em sua essência desde o começo. O nome do grupo, inicialmente, era uma sigla: Associação dos Compositores Autônomos do Bairro Amambaí. 

Um dos integrantes, Moacir Saturnino de Lacerda, explica que o grupo nasceu em uma escola do bairro. “A escola abrigava pessoas do bairro e do centro da cidade. E aí juntou os amigos que eram ligados à cultura, tinham talento para música, teatro e literatura. Participávamos de festivais de músicas e tínhamos uma temática particular: o Pantanal”, relata. A formação do grupo foi oficializada em 1971, com quatro integrantes: Moacir Lacerda, Vera Gasparotto, Luiz Porfírio e Vandir Barreto. 

Moacir conta que a trajetória do grupo musical coincide com a história do bairro justamente porque o Amambaí tinha um cenário cultural muito rico. “Ali morava Delinha, Zé Corrêa, João Pacífico, Beto e Betinha, diversas pessoas da cena cultural. Dos bairros de Campo Grande, era o mais cultural, o mais musical”, relembra o músico. 

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Acaba veio da sigla Associação dos Compositores Autônomos do Bairro Amambaí. (Foto: Arquivo/Grupo Acaba).

O músico do grupo Acaba ressalta que ainda hoje o bairro Amambaí preserva características que o tornam único em Campo Grande. Ele explica que um dos fatores que contribuiu para isso é que muitos imóveis continuam na mesma família. 

“Ainda hoje continua sendo [um bairro] diferente, mantendo suas características antigas. Não houve um grande boom imobiliário, os herdeiros mantiveram os imóveis com suas características, o Amambaí manteve sua personalidade”.

Moacir morou por pelo menos 35 anos no Amambaí e opina que o bairro precisa fomentar o lazer e a cultura. O músico sugere envolver os jovens do bairro em atividades culturais, com lazer, teatro, biblioteca e uma concha acústica para apresentações musicais. “É um bairro que perdeu sua expressão cultural. Falta oportunidade para desenvolver a cultura, a música e os esportes”. 

Raio-x do Amambaí

Mas, afinal, quem são os moradores do bairro Amambaí? Dados divulgados pelo Perfil Socioeconômico de Campo Grande dão pistas sobre quem são os habitantes do bairro. 

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Cada casa tem, em média, dois moradores. (Foto: Henrique Arakaki/Midiamax)

Os dados foram divulgados com base em pesquisa do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística), mas é importante lembrar que o último censo tem informações de mais de uma década atrás. O censo é realizado a cada 10 anos. 

Conforme informações do perfil do bairro Amambaí, ao todo são 8.190 moradores. Os habitantes têm, em média, 38 anos e cada casa tem pelo menos dois moradores. Com relação à renda, cada domicílio tem uma renda mensal média de R$ 3,5 mil. A renda per capita no bairro Amambaí é de R$ 1.285,40.

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