Com cova feita pelo próprio filho, 1º indígena morto por coronavírus é enterrado em MS
Tão triste quanto o motivo da morte, o enterro de Evaristo Garcete, 59 anos, mostra a realidade dos povos indígenas no país ante a pandemia do coronavírus (covid-19). Sendo sepultado ao lado da esposa e do filho caçula, a cova de Evaristo foi cavada pelo filho mais velho dentro da Aldeia Bororó, em Dourados, a […]
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Tão triste quanto o motivo da morte, o enterro de Evaristo Garcete, 59 anos, mostra a realidade dos povos indígenas no país ante a pandemia do coronavírus (covid-19). Sendo sepultado ao lado da esposa e do filho caçula, a cova de Evaristo foi cavada pelo filho mais velho dentro da Aldeia Bororó, em Dourados, a 225 quilômetros de Campo Grande.
Diabético, Evaristo estava internado desde o dia 7 de junho no Hospital Evangélico e pertencia a etnia Guarani Kaiowá e a morte pela covid-19 foi confirmada nesta sexta-feira (19), sendo a 40ª vítima fatal da doença que já matou 41 em Mato Grosso do Sul.
No país, de acordo com a Apib (Articulação dos Povos Indígenas do Brasil), até esta sexta, 301 indígenas já haviam morrido pela covid1-9 e 6.352 foram infectados pelo coronavírus em 103 povos.
Homem trabalhador
Descrito pelo filho mais velho Everton Garcia Garcete como um homem trabalhador, Evaristo morreu sem conseguir se aposentar. “Ele ajudou no progresso do Brasil, trabalhando em usinas de álcool, em rodovias e o que ele ganhou com isso? Só o seu minguado salário e os seus direitos como ser humano? Como cidadão? Como brasileiro? Como indígena? Porque ele era indígena nato, guarani puro. Cadê? ”, desabafa.
Enquanto trabalha na cova onde será colocado o corpo do próprio pai, Everton se emociona ao lembrar que a morte é resultado de uma doença tão perigosa. “Morreu atacado por uma doença que não faz parte do cotidiano. Trabalhar, viver, lutar e morrer sem direito a nada? É triste. É muito triste”, diz Everton enquanto abre a vala onde será colocado o caixão de Evaristo.
“Eu cheguei a desacreditar da doença. Mas com o passar dos dias vimos as mudanças acontecendo e a gente viu que era sério, só que é difícil se manter isolado da cidade. Não é todo dia que a gente tem dinheiro para comprar um fardo de frango e ficar de quarentena”, detalha.
Segundo ele, o pai morava na reserva, porém assim como os outros indígenas precisava ir até a cidade. “É uma mistura que precisa buscar, ou algum outro assunto que só da para resolver na cidade. A gente respeita as orientações, mas a necessidade fala mais alto, a gente precisa comer e numa dessas a gente vai e nem sabe se a doença já grudou na nossa roupa”, explica.
Luta contra o invisível
Para o indígena a covid-19 precisa ser levada mais a sério porque, diferente da dengue, é uma luta contra o invisível. “Não dá para facilitar, quando a gente vê as informações percebe que não estamos lutando contra o mosquito da dengue que é visível, você entra no quintal elimina os focos. A gente está lutando contra uma coisa invisível, que você não sabe onde está. Na cidade tem concreto, piso, cerâmica. É fácil de limpar. Aqui na Aldeia é diferente não tem piso, não tem asfalto”, detalha.
“A gente precisa comer, a gente precisa da cidade, mesmo que a gente plante a gente precisa vender na cidade também para conseguir o dinheiro. Mas assim como a gente precisa da cidade, a cidade precisa da gente. Meu pai trabalhou muito pelo Brasil. Ele não tinha a fonte de renda adequada. Negaram a aposentadoria dele. Ele sofreu vários acidentes de trabalho, mas nunca foi indenizado. Meu pai me fez trabalhador.”, concluiu.
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