Uma campanha que começou discreta, no boca a boca, e que viralizou após cair nas redes até pressionar autoridades municipais e estaduais por um posicionamento e promessa de solução. Assim caminhou a iniciativa popular que denunciou, nas últimas semanas, o assoreamento cada vez mais perceptível do lago do Parque das Nações Indígenas, onde um banco de areia formou-se após as fortes chuvas de fevereiro.
O caso foi encarado como retrato do descaso com equipamentos públicos, principalmente com áreas de lazer: somente após a grande repercussão é que o assoreamento do Parque das Nações Indígenas chegou aos olhos das autoridades – ou ao menos assim pareceu. Na última semana, Prefeitura de Campo Grande e Governo do Estado anunciaram a retirada do acúmulo de areia tão logo as chuvas diminuam.

A manifestação chama atenção à capacidade de mobilização popular diante de inércias do poder público. Cartão-postal da cidade, o Parque das Nações Indígenas é um vínculo afetivo do campo-grandense com o lugar em que se vive. E é um dos espaços mais democráticos da cidade, que reúne todas as tribos, de todas as regiões da Capital.
Talvez por esta relação de amor com o espaço a iniciativa do economista aposentado Alfredo Sulzer, de 71 anos, tenha ganhado tanta força quando caiu nas redes sociais. Ele não reivindica a autoria da campanha, mas destaca, conforme revelam suas redes sociais, que já há um tempo denuncia o assoreamento.
O trabalho de Alfredo começou de forma discreta, no boca a boca, mas encontrou outras vozes e viralizou quando foi parar na internet.
“Sou corredor de rua e frequento este parque desde que ele existe. E toda vez observava o crescimento do banco de areia. Era entristecedor, retrato de um descaso. E se não tivéssemos nos mobilizados? Será que teríamos recebido alguma satisfação?”, comenta o aposentado.
Do papel à internet
Refazer os passos da campanha não é difícil. Alfredo conta que, primeiramente, acionou pessoas próximas no próprio Parque da Nações. Depois, ele passou a distribuir panfletos denunciando o descaso no lago assoreado. Quando ele viu, a repercussão estava maior do que imaginava, foi parar em fanpages famosas, como a ‘Passeando em Campo Grande‘, que ajudou a redimensionar o pedido de socorro do Parque.

“Se tornou um movimento popular em defesa do Parque. Eu foquei inicialmente em quem frequentava lá, mas na internet a coisa cresceu. A imprensa abraçou a causa, as pessoas deram visibilidade. E já tem muita gente querendo aparecer. Fui procurado hoje por um vereador que perguntou o que ele poderia fazer. Fiquei feliz, claro, mas, veja só: por que ninguém, nenhum vereador, levantou o dedo antes da campanha crescer?”, questiona.
Neste domingo (17), o grupo do qual Alfredo é integrante quer reunir o maior número possível de pessoas para fazer um cordão humano que dê a volta no lago, simbolizando um abraço. O evento, que já é chamado de “Abração”, está sendo fortemente divulgado nas redes. Enquanto isso, Alfredo segue firme na distribuição diária de panfletos, impressos por ele mesmo.
“Acredito no contato olho a olho. Hoje cedo, às 5h, estava com minha família distribuindo os panfletos. Ficamos até umas 8h e vamos voltar no fim da tarde. Queremos a mobilização principalmente entre quem frequenta o Parque, porque quem ama, cuida”, aponta.
“Vamos ter uma surpresa na programação. Se todos os amantes do Parque comparecerem às 17h, vão ver o que é”, adianta. Um evento foi criado no Facebook.

Todo mundo pode
Da iniciativa, Alfredo traz uma grande lição. Para ele, ações semelhantes podem ser reproduzidas em outros equipamentos públicos não só de Campo Grande, mas de todo o Estado.
“Já conquistamos o olhar do poder público, falta a providência. Acho que existe um efeito educativo nisso tudo. Estamos mostrando às pessoas que somos capazes de nos defender, de lutar pelas nossas coisas e pelo que é público”, aponta.
Segundo ele, em Campo Grande há vários lugares abandonados, até em situação pior, que também precisam ser “abraçados”. “O Parque Sóter, o Airton Senna, todos esses lugares podem ter grupos em defesa deles. Essa pressão força o poder público a encontrar soluções, é isso que queremos”, finaliza.