A confissão de ‘vista grossa' na vistoria veicular feita por empresas terceirizadas pode não ser novidade para o (Departamento de Trânsito de Mato Grosso do Sul), já que além das eventuais irregularidades, agora sob investigação da corregedoria do órgão, o fato de o serviço ser prestado por credenciadas – e não exclusivamente por servidores de carreira do órgão – já foi alvo de ação questionando a legalidade do serviço, proposta pelo Sindetran (Sindicato dos Servidores do Detran).

O presidente do sindicato, Octacílio Sakai Júnior, garante que a entidade já alertou o Departamento por várias vezes, inclusive com ações judiciais, entretanto, o órgão permanece inerte diante das irregularidades.

“Sempre fomos contra esse serviço terceirizados e temos até ação judicial correndo, mas até hoje está parado”, lamenta o presidente do Sindetran.

A implementação da cobrança, segundo o presidente, já dava indícios de que o número de servidores do Detran-MS não seria suficiente para atender a demanda e que seria necessária a realização de um novo concurso público para contratação de assistentes de vistoria e identificação veicular, mas o órgão viu por certo ‘abrir' o serviço para empresas particulares.

“O servidor de carreira é o único apto a realizar a vistoria, mas o Detran-MS preferiu entregar o serviço nas mãos de empresários que visam unicamente o lucro. Deixaram os concursados de lado para atender interesses particulares. Isso abre margem para muita coisa errada. Vistoria é papel do Estado”, cobra.

Tempo de espera

Despachantes, por outro lado, apesar de reconhecer que nem sempre as terceirizadas têm o mesmo rigor na verificação da qualidade e segurança da frota, outrora realizada apenas por servidores do Detran, ainda veem um lado positivo em meio às inúmeras denúncias de irregularidades na prestação do serviço pelas credenciadas.

Para o presidente do Sindesp-MS (Presidente do Sindicato dos Despachantes), Márcio Barbosa de Carvalho, as terceirizadas deram uma opção aos usuários que tinham que enfrentar filas de até três horas para realizar a vistoria veicular.

“Antes lá [Detran] tinha fila de 3 km e até pouco tempo atrás demorava cerca de três horas para fazer uma vistoria”, disse. “Hoje já diminuiu bastante esse tempo justamente por que tem as terceirizadas, é o mesmo preço e você não vai andar 20 km para fazer algo que você pode fazer nos quatro cantos da cidade”, defendeu Carvalho.

Detran-MS promete investigar

Ao Jornal Midiamax, o diretor-presidente do órgão, Roberto Hashioka (PSDB), afirmou que uma investigação será instaurada na corregedoria do Departamento e garantiu que providências serão tomadas, caso as ditas falhas na prestação do servido sejam confirmadas.

Já mandei corregedoria abrir procedimento investigativo, vamos tomar providências que forem necessárias”, afirmou Hashioka.

Na avaliação do diretor, o caso flagrado pela reportagem, de um veículo sem motor obter um laudo de transferência na Focar Vistoria, é apenas um ‘caso isolado', e apesar de garantir que o Detran já fiscaliza as terceirizadas, prometeu uma ‘fiscalização mais pontual', principalmente em empresas envolvidas em denúncias de irregularidades.

Rumores

O Jornal Midiamax já registrou diversas vistorias em terceirizadas de veículos sem condições de trafegabilidade. Empresários do setor de vendas de veículos chegaram a denunciar que mesmo com validade de 30 dias, eram obrigados a pagar mais de uma vistoria para, por exemplo, transferir um carro popular.

Algumas denúncias dão conta que à época em que o governo estadual abriu o serviço para terceirização, ex-diretores do Detran-MS teriam aberto empresas de vistoria veicular em nome de familiares.

Mesmo com denúncias e flagrantes de irregularidades, o Conselho Superior do MP-MS (Ministério Público de Mato Grosso do Sul) decidiu arquivar um inquérito que investigou o serviço de terceirização de inspeção veicular do Detran-MS.

Vistoria falsa

No dia 30 de maio, a reportagem gravou em vídeo um automóvel com o motor fundido e sem bateria ser levado, na carroceria de um guincho, para ser vistoriado na Focar Vistorias, em Campo Grande. Os vistoriadores pediram ao motorista do caminhão para ‘descarregar' o veículo, um Peugeot 206, e sair do pátio da empresa enquanto a vistoria falsa era realizada.

Nesta sexta-feira (15), após confirmar que o veículo foi aprovado na suposta vistoria, mesmo sem ter nenhum dos equipamentos elétricos, como luzes de sinalização, funcionando, a reportagem foi até a empresa e falou com Antônio Gregório, o proprietário oficial da Focar, que está credenciada até 4 de novembro de 2019, segundo a Portaria T-467, do Detran-MS.

Inicialmente, Antônio, ou ‘Toninho', como é conhecido entre despachantes, tenta negar. “Tem que ver a parte elétrica, pneu, motor, chassi, ver se está tudo em ordem, se está funcionando, mas se ele não tiver funcionando não faz [vistoria]”, garante.

No entanto, diante das provas, o dono oficial da vistoriadora credenciada pelo Detran-MS acaba admitindo que o procedimento irregular foi feito e que não foi um caso isolado.

“Às vezes a gente até faz, como o carro é novo, o motor tá [sic] estragado, às vezes até isso aí. Não é um procedimento certo, mas às vezes acontece, admite”. “Às vezes a gente até faz uma vista grossa”, confirma.

(Colaborou Ludyney Moura)