Vazamento na JBS ocorre no mês de combate a acidentes de trabalho

Empresa também enfrenta crise da carne

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Empresa também enfrenta crise da carne

Envolta na maior crise institucional de sua história – implicada na operação Carne Fraca, da Polícia Federal – a JBS Foods teve nesta quinta-feira (6) mais um episódio que agrava a já desgastada imagem da companhia. O vazamento de amônia da Unidade II de Campo Grande, uma das maiores do Estado, encaminhou ao menos 10 trabalhadores para o Socorro Médico. O acidente, ironicamente, ocorre no mês em que o MPT-MS (Ministério Público do Trabalho em Mato Grosso do Sul) promove uma campanha pelas vítimas de acidentes de trabalho.

O vazamento ocorreu no setor de máquinas, uma tubulação de um registro teria se rompido por voltas das 13h. O local fica próximo a um alojamento de trabalhadores, de acordo com o delegado Cleverson Alves dos Santos, que acompanhou o trabalho da perícia da polícia civil.

Rapidamente, por conta da ventilação no local, o gás se espalhou e os alarme foi soado. Assustados, os trabalhadores deixaram a fábrica em meio à desmaios e pessoas vomitando. Sem saber o que fazer, eles foram parar na BR-060, na saída para Sidrolândia, onde foram direcionados para o Socorro por equipes da segurança no trabalho.

“Estava na hora do almoço, foi muita correria na hora do desespero. Algumas pessoas desmaiaram aqui na frente. O vento carregou o cheiro. Senti muita dor de cabeça. Um caminhão levou três colaboradores até o posto”, contou Pedro Luiz Santos, 46, que trabalha há 6 anos na desossa.

O movimento no local era intenso. Em meio à diversas viaturas que entraram e saiam, do Samu (Serviço móvel de urgência) e Corpo de Bombeiros, familiares dos trabalhadores começavam a chegar no local.

“Eu estava no curso na Estácio e fiquei sabendo o que tinha acontecido. Estou desesperada, não tenho informação nenhuma”, relatou uma aprendiz da empresa. A mãe dela trabalha há 2 anos na Unidade e estava na empresa no momento do vazamento.

As equipes de urgência fizeram a primeira triagem e encaminharam às vítimas para o socorro. Quase toda a equipe de urgência do Corpo de Bombeiros na Capital foi mobilizada, de acordo com o Tenente Falcão. Foram 6 unidades além de 5 do Samu – 2 avançadas e 3 básicas -, e 30 militares.

Duas viaturas da perícia da polícia civil chegaram por volta das 15h, e ficaram na JBS cerca de 1h. A análise dos peritos, ainda assim, foi preliminar, já que o local teve que ser fechado pelo excesso de gás. A PMA (Polícia Militar Ambiental) também irá analisar o caso, em razão da possível contaminação do meio ambiente.

O setor foi interditado, e todos os trabalhadores da Unidade II foram dispensados nesta quinta-feira. Por volta das 16h, alguns funcionários ainda chegavam ao local e mandados voltar embora.

Número de trabalhadores contaminados ainda é incerto

A Unidade II da JBS é uma das maiores das 22 presentes em 9 cidades de Mato Grosso do Sul. Emprega em média 1.200 trabalhadores. O acidente nesta tarde mobilizou a cidade. O número de vítimas divulgado pelo Corpo de Bombeiros no início da tarde – 10 trabalhadores – ainda é incerto, mas de acordo com a saúde municipal, pode chegar a 100.

Um força-tarefa foi montada  pelas autoridades de saúde em Campo Grande. Até o fechamento da matéria, 24 funcionários da empresa haviam sido levados para unidades da rede pública, de acordo com o coordenador de Urgências da Prefeitura, Yama Higa.

Segundo ele, logo que chegou a informação do acidente, e de que haviam mais de 400 pessoas trabalhando no local, foi acionado o chamado protocolo de múltiplas vítimas. Esse esquema definiu o envio de 5 equipes do Samu ao frigorífico, para fazer a triagem das pessoas atingidas pelo agente químico, e organizou os locais para onde elas seriam enviadas.

Abril Verde

Ironicamente, o acidente ocorre em meio à uma campanha do MPT-MS, dedicada às vítimas de acidentes de trabalho.

“Devemos cobrar a adoção de medidas preventivas, até porque não existe valor no mundo que possa reparar um trabalhador falecido, mutilado, física ou mentalmente, por condições de trabalho que não respeitaram as normas de saúde e segurança vigentes em nosso país”, lembrou o coordenador nacional de Defesa do Meio Ambiente do Trabalho, Leonardo Osório Mendonça.

A indústria da carne lidera o ranking de acidentes de trabalho em Mato Grosso do Sul. Os dados são da Superintendência Regional do Trabalho em Mato Grosso do Sul, ligada ao MTE (Ministério do Trabalho e Emprego.

Os setores ligados à Indústria, sejam eles de abate de bovinos, suínos e aves e processamento, registraram um total de 1453 acidentes trabalhistas em 2015 e 2016. Ao menos há 2 anos seguidos, a indústria do setor lidera o número, de acordo com o MTE. Em 2016 foram 771 acidentes em locais de abate e fabricação de produtos de carne, 13,2% do total de acidentes trabalhistas registrados no ano.

O número aumentou com relação a 2015, um aumento de mais de 13%. Foram 682 trabalhadores acidentados em 2015, 11,9% dos acidentes registrados naquele ano.

De acordo com a Procuradoria do Trabalho em Mato Grosso do Sul o mês de abril foi escolhido devido ao Dia Mundial da Saúde (7/4) e ao Dia Mundial em Memória das Vítimas de Acidentes e Doenças do Trabalho (28/4).

“Esta última data foi instituída por iniciativa de sindicatos canadenses e escolhida em virtude de uma explosão que matou 78 trabalhadores em uma mina no estado da Virgínia, nos Estados Unidos, em 1969. No Brasil, a Lei nº 11.121, que criou o Dia Nacional em Memória das Vítimas de Acidentes e Doenças do Trabalho, foi promulgada em maio de 2005. A ação faz parte das atividades da Coordenadoria Nacional de Defesa do Meio Ambiente de Trabalho (Codemat)”, explica. 

Crise na JBS

Na última semana, no dia 29, funcionários da JBS em três municípios de Mato Grosso do Sul souberam que terão 20 dias de férias coletivas. A empresa, emprega 12 mil pessoas em 9 cidades sul-mato-grossenses, e controla 85% do setor estadual. São funcionários das unidades de Naviraí, Nova Andradina e Anastácio, cerca de 2 mil trabalhadores empregados, segundo o presidente Stiaa/CG (Sindicato dos Trabalhadores nas Indústrias de Alimentação e Afins de Campo Grande), Rinaldo Salomão.

Deflagrada no dia 17 de março, a operação Carne Fraca é a maior da história da Polícia Federal, e investiga um esquema de venda ilegal de carne, de produtos vencidos até componentes proibidos na fabricação. Envolvendo diversos frigoríficos e políticos do alto escalão do governo federal, seis frigoríficos já foram interditados pelo Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (MAPA). Todos eles estão na lista dos 21 frigoríficos investigados na operação e que, por isso, receberam um “pente-fino” da fiscalização do Ministério da Agricultura.

A empresa informou, por meio de nota, que as atividades na unidade serão suspensas até que os bombeiros autorizem. Ainda de acordo com a JBS, o vazamento foi controlado e agora será investigado.

De acordo com a empresa, o problema foi “rapidamente controlado”. “Por precaução, a unidade foi imediatamente evacuada. Alguns colaboradores foram encaminhados aos postos de saúde locais e todos estão fora de risco”, prossegue a nota.

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