Portaria criou Grupo Técnico Especializado que pode dificultar demarcações

O MPF (Ministério Público Federal) irá pedir a revogação da portaria 68 do governo federal, que cria o GTE (Grupo Técnico Especializado) para demarcações de terras indígenas. A Procuradoria declarou que o documento é “ilegal, fere a Constituição e a Jurisprudência sobre o tema tratado pelo Supremo Tribunal Federal”. As informações são do jornal O Estado de São Paulo.

“Com a portaria, o Ministério da Justiça criou uma nova estrutura para acompanhar o processo de de terras. O que antes era uma atribuição técnica da Fundação Nacional do Índio (Funai), passa agora a ter que ser submetido ao crivo de um Grupo Técnico Especializado (GTE)”, afirma o Estadão. A Portaria tem sido interpretada como um instrumento que dificultaria os processos demarcatório.

Outra questão trazida no documento, é a “jurisprudência do STF” (Supremo Tribunal Federal). A portaria afirma que “se deve seguir a jurisprudência”, mas não especifica qual o entendimento da Corte. Parte das decisões no Supremo tem atrasado as demarcações, em razão do Marco Temporal, tese já consolidada, que defende a demarcação somente quando comprovada a presença dos índios no momento da promulgação da Constituição Federal, em 1988.

De acordo com o Estadão, quem contesta a portaria é o coordenador da 6ª Câmara de Coordenação e Revisão do MPF e subprocurador geral da República, Luciano Maris Maia, que esteve em reunião com o presidente da Funai, Antônio Fernandes Toninho Costa.

“Deixei clara a situação de flagrante ilegalidade dessa portaria. Vamos solicitar ao ministro Alexandre de Moraes a revogação dessa portaria”, declarou ele, ao Estado. “O que é mais assustador é que essa modificação no processo não indica sinais de melhoria, mas sim transparece o objetivo de que as demarcações não ocorram. O governo não quer aprimorar ou aperfeiçoar o processo de demarcação, quer paralisá-lo.”

Pela portaria 68, o grupo será composto por representantes da Funai, Consultoria Jurídica, Secretaria Especial de Direitos Humanos e Secretaria de Políticas de Promoção da Igualdade Racial. “O GTE avaliará os processos de demarcação de terra indígena submetidos à decisão, subsidiando o Ministro de Estado da Justiça e Cidadania”, diz o texto. “O GTE poderá recomendar a realização de diligências, a serem cumpridas no prazo de noventa dias.”

A jurisprudência do STF, para Luciano Maris Maia, indica que a definição de terras indígenas cabe exclusivamente ao corpo técnico da Funai. “Essa portaria coloca no caminho um agente formado por órgãos que não conhecem a causa indígena. É claramente ilegal é inconstitucional”, afirmou o coordenador da 6ª Câmara de Coordenação e Revisão do MPF, que trata especificamente dos temas relacionados aos grupos indígenas, quilombolas e comunidades extrativistas, entre outros.

De acordo com o Estado, “o novo presidente da Funai, Antônio Fernandes Toninho Costa, que está há apenas três dias no cargo, foi surpreendido com a publicação da portaria. Costa se comprometeu em pedir uma reunião com o ministro Alexandre de Moraes para tratar do assunto”.

“Organizações ligadas aos direitos dos povos indígenas, como o Instituto Socioambiental (ISA) e o Conselho Indigenista Missionário (Cimi) fizeram duras críticas ao teor da portaria, que reduz o papel decisório da Funai ao submeter seus relatórios a outro grupo formado por não especialistas”, explica a reportagem.

O subprocurador Luciano Maris Maia declarou ao Estadão que a decisão do Ministério da Justiça de publicar uma portaria sobre o assunto deve-se ao fato de o governo não ter conseguido avançar com o decreto presidencial que pretendia publicar no fim do ano passado. O inteiro teor do decreto foi revelado pelo Estado, no dia 12 de dezembro. “A divulgação antecipada do plano fez o governo abortar o projeto. O que Ministério da Justiça fez agora é tentar aproveitar parte daquele decreto presidencial para avançar no mesmo tema com uma portaria ministerial.”

O presidente Michel Temer defendeu, nesta quinta-feira, a mudança na regra de demarcação de terras indígenas e disse que criação do grupo de trabalho no Ministério da Justiça não enfraquece a Funai.