Vereadora quer multa de R$ 280 para assédio em área pública
Combate ao assédio
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Combate ao assédio
Um projeto de lei protocolado na Câmara Municipal de Curitiba (CMC) nesta semana estabelece multa de R$ 280 a quem assediar pessoas nas ruas. A ideia é da vereadora recém-eleita Maria Letícia Fagundes (PV), que diz se inspirar na campanha “Chega de Fiu Fiu”, da ONG Think Olga, de combate ao assédio em espaços públicos.
Segundo a parlamentar, as chamadas “cantadas” não são elogios, e sim uma forma de violência que passa despercebida, por ser travestida de flerte. Apesar de não especificar gênero, ela lembra que os agressores são, em sua maioria, homens, enquanto as vítimas normalmente são mulheres.
“(O assunto) gera polêmica porque existe uma cultura de desrespeito, aceita com naturalidade. A gente discutiu não faz muito tempo a cultura do estupro. Mas o assédio também é criminoso”, argumentou. O texto considera atos verbais constantes, comentários e insinuações alusivas ao corpo ou ao ato sexual e gestos obscenos como comportamentos inadequados. Também seriam passíveis de punição abordagens intimidadoras, exibicionismo, masturbação, perseguição, uso de palavras impróprias, condutas lascivas, como contato corporal, ou agressivas, como agarrar, abraçar, beijar e tocar partes íntimas do corpo sem consentimento.
Caberia à Guarda Municipal identificar os suspeitos, inclusive com a utilização de filmagens de segurança. Além de pagar a multa, que corresponde a 30% do salário mínimo, o agressor precisaria passar por cursos de reeducação. Em caso de reincidência, o valor subiria para um salário mínimo (R$ 930).
Em 2014, pesquisa da Think Olga mostrou que das cerca de oito mil mulheres entrevistadas 99,6% já tinham sido assediadas e 48% dos assédios foram verbais. “Qualquer ato ou palavra que tenha cunho sexual se chama assédio e as pessoas têm de começar a compreender isso. Que mulher não ouviu desrespeitadamente um comentário sobre seu corpo numa via pública?”, questionou a vereadora.
Maria Letícia contou que vai defender a proposta com base em sua experiência como médica legista. Há um ano e meio, pressionada pela bancada evangélica, a Casa aprovou o plano municipal de educação com uma emenda suprimindo discussões sobre gênero nas escolas. Foram 33 votos a favor e apenas um contra, da vereadora Professora Josete (PT). “Conheci profundamente a violência em Curitiba. Está na hora de a Câmara colocar os preconceitos nas gavetas e não em cima da mesa (…) A gente tem de pensar no que é bom para o cidadão, sem preconceito. Tenho 57 anos de idade e o conservadorismo não cabe no meu perfil de vida”, completou.
Dos 33 vereadores da CMC hoje com mandato, apenas oito são do sexo feminino. A matéria só começa a tramitar oficialmente após a leitura no pequeno expediente de uma sessão plenária. Primeiro, ela receberá uma instrução técnica da Procuradoria Jurídica e depois seguirá para as comissões temáticas do Legislativo. Durante a análise dos colegiados, podem ser solicitados estudos adicionais, juntada de documentos faltantes, revisões no texto ou o posicionamento de outros órgãos públicos afetados. Na sequência, o PL segue para o plenário e, se aprovado, para sanção do prefeito Rafael Greca (PMN), antes de virar lei.
Repercussão
Representantes de movimentos de mulheres ouvidas pelo Terra elogiaram o fato de um tema como esse voltar à pauta da Câmara, entretanto, fizeram algumas observações. Para a bacharel em Direito Alessandra Calisto, integrante do Coletivo Alzira, a iniciativa é positiva. “Se eu fosse homem teria vergonha de ser preciso criar uma lei para punir. É no mínimo ultrajante para pessoas do sexo masculino. Mas se é necessário… Qualquer tipo de assédio tem de ser repudiado. Se a mulher não gostou do que aconteceu, se a conversa não acontece e se esse é um meio educativo que faça sentido, vale a pena fazer o teste”, avaliou. “É muito diferente você receber um elogio de receber um assédio. Para nós, mulheres, um gostosa na rua ou um assobio não vai nos fazer cair de amores por quem fez isso. É meio óbvio, mas tem gente que tem um pouco de dificuldade de se tocar”, acrescentou.
Pesquisadora da Comissão de Estudos sobre Violência de Gênero (CEVIGE) da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) no Paraná e membro do Coletivo de Jornalistas Feministas Nísia Floresta, Vanessa Prateano disse ser preciso focar também na prevenção e na educação. “O tema em si não é simples. Ele divide bastante o movimento feminista, uma vez que pode gerar a situação de se apostar todas as fichas na lei (…) É preciso também criar mecanismos para que as mulheres possam denunciar o ato, para que se sintam seguras para isso, que se criem protocolos de atendimento e acompanhamento desse atendimento, que se especifique o que configura um assédio de rua e quem fará a fiscalização, entre inúmeras outras medidas”, sugeriu.
Jussara Cardoso, da Marcha das Vadias, tem opinião semelhante. “Do jeito que está, o projeto não deve ser aprovado, porque prevê punição para exibicionismo, tocar pessoas, beijar a força… E isso já tem na lei. Acredito que com as discussões na comissão possa se chegar a uma solução – fazer um texto de educação mesmo, e não de criminalização”.
De qualquer forma, ela ponderou que a matéria deverá mudar paradigmas. “Enquanto não tem um projeto de conscientização nas escolas, o que eu posso fazer para colocar esse debate no Legislativo? É uma oportunidade de se voltar a discutir. Ela (vereadora) teve muita coragem de propor, e fez uma justificativa muito bem embasada”.
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