Na noite do dia 13 de janeiro

A insegurança de Fortaleza já faz parte do cotidiano. Neste mês, um cearense de 24 passou por uma situação bizarra, que atesta a violência que a população vem sendo vítima. O jovem, que pede ao Tribuna do Ceará para não ser identificado, sofreu um minutos depois de registrar um Boletim de Ocorrência numa delegacia sobre outro assalto que havia sofrido.

Em entrevista, ele contou que todo o drama começou na noite do dia 13 de janeiro. O jovem de Fortaleza foi buscar sua namorada para ir a uma confraternização de amigos, quando foi surpreendido por um criminoso armado.

“Como de costume peço pra minha namorada ficar na portaria do prédio dela, então eu só paro, ela sai e entra no carro. Quando eu destravei o carro, um cara entrou no banco de trás e ficou ameaçando a gente com uma arma. Falou que estava fugindo de outro assalto e roubou tudo o que a gente tinha: carteira, relógio, dinheiro e até meu carro”, relatou.

Sem condições de continuar o momento de lazer, o jovem e sua companheira foram à delegacia registrar um Boletim de Ocorrência. Ao contar à polícia como tudo aconteceu, o jovem esqueceu de dizer que os documentos do veículo tinham sido roubados junto com o carro. Sem este dado no BO, seria impossível acionar o seguro do veículo.

“Depois disso, começou uma novela. Fui várias vezes ao 9º Distrito Policial tentar retificar o BO, mas só quem poderia fazer isso era a escrivã que fez o primeiro. Chegaram a me informar que ela estaria lá no domingo (15), cheguei e ela não estava. Fui na segunda (16) de manhã, falaram que ela estaria à noite. Finalmente na terça-feira (17) à noite, consegui encontrá-la para ela me dizer que não seria possível fazer a retificação do boletim”, detalha.

Insatisfeito com a burocracia, o rapaz e sua família decidiram retornar para casa e ir, no dia seguinte, à delegacia de Roubos e Furtos de Veículos, em Fortaleza, para qual o seu caso teria sido enviado. Foi quando tudo aconteceu novamente.

“Na volta, quando estávamos chegando em casa, quatro adolescentes armados pararam o carro no qual estavam eu, meus pais e minha namorada, e nos assaltaram novamente. Depois disso, retornamos à delegacia para os policiais informarem que não podiam fazer nada porque só tinha dois policiais na delegacia. Ou seja, fizemos outro BO somente para nossa coleção, porque ele não adianta de nada”, conta, perplexo.

“Boletim de Otário”

A insatisfação do jovem com a segurança pública aconteceu dias antes da vice presidente do Sindicato dos Policiais Civis do Estado do Ceará (Sinpol) desabafar sobre a atual situação da categoria no Estado. Em entrevista à TV Jangadeiro/SBT, Ana Paula Cavalcante destacou que o cidadão quando vai à delegacia registra, na verdade, um “Boletim de Otário”.

“Na década de 1980, nós tínhamos mais ou menos o dobro do efetivo. A população cearense era a metade e nós tínhamos o dobro. Hoje, lamentavelmente, é com muita vergonha que eu digo que o cidadão está certo quando ele diz que registra o Boletim de Otário, porque nós não temos efetivo para investigar a enorme quantidade de Boletins de Ocorrência. Na verdade, nós temos que escolher o que será investigado”, enfatizou. 

Ainda segundo a representante da categoria, a falta de estrutura para o exercício profissional dos policiais também é uma preocupação constante.

“Não restam dúvidas que boas turmas de policiais tenham sido formadas nos últimos anos, mas quando o policial civil vem vivenciar o cotidiano é difícil nós o segurarmos. Para você ter uma ideia, nós não recebemos sequer munição no ano de 2016. Além de tudo isso, ainda existe a questão da condição salarial, que é vexatória. O estado do Piauí, que é um dos piores PIBs do Brasil, paga o dobro do Ceará”, concluiu.

Na tarde desta quarta-feira (25), representantes do Sinpol foram recebidos pelo atual secretário de Segurança Pública, André Costa. A intenção do encontrou foi a de ouvir as demandas da categoria e informar às entidades os direcionamentos que a SSPDS deve seguir na atual gestão.

O secretário ressaltou que reconhece o papel fundamental da polícia judiciária para o Sistema de Segurança Pública. “Vim com a visão de valorizar a todos, de valorizar o pessoal mesmo antes da parte logística, que também é de suma importância”, frisou, completando que manterá o diálogo aberto com a categoria.

Ele acrescentou que, além do investimento logístico em materiais, focará no investimento humano para que haja uma mudança estrutural no Sistema de Segurança Pública. “O que posso prometer é trabalhar muito em prol dos servidores da segurança”, afirmou André Costa.

O secretário também adiantou para os representantes das entidades que criará uma comissão de acompanhamento das ocorrências em que servidores da segurança pública figurem como vítimas. “Essa comissão analisará caso a caso e terá representatividade de toda categoria, incluindo um inspetor ou escrivão”, explicou.