Gegê do Mangue, número 2 do PCC está solto e a polícia perdeu sua pista
Solto há duas semanas, Gegê não foi achado por oficiais de Justiça nem advogados de defesa
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Solto há duas semanas, Gegê não foi achado por oficiais de Justiça nem advogados de defesa
Solto há duas semanas, Gegê do Mangue, considerado o número 2 na hierarquia do Primeiro Comando da Capital (PCC), tem o paradeiro desconhecido. Está previsto para começar nesta segunda-feira (20) o julgamento dele, mas a defesa já informou à promotoria que não sabe onde ele está e poderá ser julgado à revelia.
Rogério Jeremias de Simone, nome de batismo de Gegê, deverá ser julgado no Fórum Criminal da Barra Funda, na zona oeste de São Paulo, acusado de ordenar um duplo assassinato no Rio Pequeno, também na zona oeste, em 2004. A suspeita é de que ele teria comandado as execuções por celular, de dentro do presídio. O objetivo seria vingar as mortes de traficantes ligados ao PCC.
Para garantir que o réu cumpra a pena em caso de eventual condenação, o Ministério Público Estadual (MPE) pedirá hoje que seja preso preventivamente. Por uma decisão da 3.ª Vara de Presidente Venceslau – onde o suspeito respondia a outro processo de homicídio, no qual acabou inocentado –, Gegê deixou a cadeia às vésperas do júri na capital.
Na outra ação, ele estava preso preventivamente desde 2007 e obteve, em 2014, habeas corpus do Supremo Tribunal Federal para responder ao processo em liberdade.
Agora, advogados de Gegê entraram em contato com MPE e confirmaram não saber onde achá-lo. Nas últimas semanas, duas tentativas de notificação por oficiais de Justiça fracassaram – no endereço que ele havia fornecido, no início do mês, quando saiu da cadeia.
Para o MPE, a gravidade do crime e o risco de ele se tornar foragido após eventual condenação justificam novo pedido de prisão. “Ele foi procurado em duas localidades e não foi encontrado. Então, para garantia da ordem pública e pela necessidade da aplicação da lei penal e em virtude do crime marcado pela perversidade e banditismo, a prisão será pedida”, explicou o promotor Rogério Zagallo, responsável pelo caso.
O MPE vai apresentar interceptações telefônicas em que mostram Gegê e comparsas discutindo o crime. A acusação sustenta ainda que, além da vingança, ele queria mostrar força da facção, “visando a amedrontar a sociedade e também os criminosos rivais”.
O julgamento de hoje representará a quinta tentativa de o júri popular analisar o caso, após sucessivos adiamentos obtidos com recursos em cortes superiores.
Gegê é o número dois na hierarquia do PCC, a maior facção criminosa do país, que controla os presídios do estado de São Paulo. Numa possível ausência do chefão, Marcos Willians Herbas Camacho, o Marcola, seria ele a assumir o posto principal, segundo a inteligência da Polícia Civil e o Ministério Público de São Paulo.
Gegê compõe a “sintonia final geral”, o grupo de líderes logo abaixo de Marcola. Descrito como violento, Gegê faz parte da segunda geração do PCC, ao contrário da primeira, essa é adepta do terrorismo como método de enfrentar o Estado. Por esses pontos, sua liberdade foi uma bomba entre os agentes da segurança pública. “Se tivessem soltado o Marcola, para nós seria menos prejudicial”, diz um delegado. “Esse sujeito [Gegê] já investiu contra policiais, é mais articulado e tem mais condições de administrar os setores de compra de armas e drogas.”
Acusação de mais um crime e soltura
Gegê foi passou por 15 penitênciárias diferentes, condenado a 14 anos, três meses e um dia de prisão por tráfico de drogas, homicídio, ameaça e associação criminosa. No dia 16 de julho de 2014 deveria ter saído da prisão, no entanto outro crime ocorreu dentro da cadeia.
Segundo investigação da Polícia Civil, por volta das 21h45 em novembro de 2013, detentos da Penitenciária 2 de Presidente Venceslau receberam um bilhete com ordem para executar um ex-integrante do PCC por uma dívida de R$ 110 mil. O alvo ocupava a mesma cela de seus algozes.
Um deles asfixiou com uma camiseta a vítima, enquanto outros quatro seguravam seu corpo. Colocaram cocaína em seu nariz, deram um banho no corpo e chamaram socorro. Sem provas concretas sobre o mandante, Carlos Cesar dos Santos Lima, o Zóio,se tornou a principal peça da investigação, que afirmou ter participado do assassinato e incriminou Gegê. Sua acusação manteve Gegê na cadeia.
No entanto, Zóio mudou sua versão várias vezes. No primeiro depoimento, ele relatou que a vítima tentou se suicidar. No segundo, já como réu protegido, afirmou que gegê teria dado a ordem para os presos da cela executarem o alvo. Diante da juíza pela primeira vez, no terceiro ele estava exaltado e negou qualquer participação. No dia 30 de janeiro de 2017 em seu último depoimento, Zóio mostrou-se calmo e respondeu todas as perguntas e disse que Gegê não tem culpa do assassinato, e que matou o preso por desavenças pessoas, e que tentou incriminar o número 2 da facção, por causa de um desentendimento. Afirmou que o bilhete e a camiseta nunca existiram e que matou a vítima apenas com uma mão e, assumiu a autoria de 17 crimes em outros presídios no passado.
Um novo inquérito foi aberto para descobrir por que Zóio mudava tanto em seus depoimentos. Segundo a investigação, as advogadas Alessandra Moller e Juliana Mirandola, financiadas pelo PCC, coagiram a família de Zóio e ofereceram dinheiro a sua defensora pessoal para que ela abandonasse o caso. A defesa de Gegê também tentou atestar a insanidade mental do Zóio para desqualificar sua acusação. Numa conversa gravada com autorização judicial na cadeia, Alessandra intimida Zóio: “Não, ninguém falou que não vai te matar. O Gegê não te matando… cai a moral dele. Isso ai eu to ligada, entendeu? O cara vai ficar desmoralizado. […] Desmoralizado ele não fica”.
No entanto, o inquérito foi arquivado pelo juiz Deyvison dos Reis, a pedido do promotor de justiça Ricardo Salvato. Os dois determinaram a soltura de Gegê no dia 10 de fevereiro. Segundo Salvato, “no conjunto probatório, a coação não ficou comprovada”.
A decisão de libertar Gegê foi fruto de um consenso incomum entre Ministério Público e Justiça em julgamentos tão complexos. O próprio Ministério Público, que em geral acusa, deu um parecer de soltura inequívoco. A Justiça concordou.
Além do ponto de vista, Salvato e Reis compartilham outras semelhanças. Ambos têm 35 anos, cerca de dez na carreira, trabalham no combate ao crime organizado e são categóricos ao afirmar que não foram ameaçados pelo crime organizado. “No decorrer das investigações, houve um enfraquecimento das provas em relação ao Rogério Jeremias [Gegê]. Não temos sequer um indicativo para levá-lo a julgamento”, afirma Salvato. O magistrado Reis complementa: “Fiz o meu trabalho, toquei o processo até onde deu. Na ausência de indício, não tinha outra decisão a ser adotada”.
Polícia tem pistas de Gegê na fronteira
Após deixar a penitenciária e chegar a São Paulo, Gegê não foi mais visto. A polícia tem pistas que ele está na frontei do Brasil com o Paraguai. Desde que o narcotraficante Jorge Rafaat Toumani foi executado na cidade de Pedro Juan Caballero em junho de 2006, o PCC se estrutura para dominar o tráfico na fronteira.
Interceptações telefônicas feitas em uma investigação levam a polícia a acreditar que Gegê assumiria o comando. Segundo um promotor que investiga o crime organizado, ainda na cadeia Gegê fora orientado pelos próprios bandidos a ficar uma ou duas semanas em São Paulo e, na sequência, migrar para o Paraguai. “A tendência é que ele reestruture o tráfico de entorpecentes e os negócios do PCC na rua, poupando de novas punições e isolamentos os integrantes da sintonia final [a cúpula] que estão presos”, afirma.
Na semana passada, a Justiça de São Paulo prorrogou a permanência de 11 integrantes da cúpula do PCC no Regime Disciplinar Diferenciado (RDD). Por 360 dias, eles ficarão confinados em celas individuais, sem acesso a jornais, televisão ou rádio – e com apenas duas horas de banho de sol por dia. É a primeira vez que todo o primeiro escalão fica isolado do mundo. Gegê é, de longe, o mais graduado criminoso do PCC solto e com envergadura para comandar os negócios.
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