“Menas” e “estrupo”: vocabulário da ABL tem erros de revisão
Esses e outros termos, considerados variações da norma culta, aparecem no dicionário Volp
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Esses e outros termos, considerados variações da norma culta, aparecem no dicionário Volp
A palavra “estrupo” está errada? E “cardaço”? Antes de responder, saiba que você pode encontrá-las no Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa (Volp), que está em sua quinta edição. Disponível para compra, em formato físico, e para consulta online, no site da Academia Brasileira de Letras (ABL), o Volp tem 381 mil palavras da norma culta, com suas classes gramaticais.
E desde quando “estrupo” é norma culta? – você deve estar se perguntando. Não é. Mas não necessariamente está errado. “Estrupo” é uma variação da norma culta “estupro”. De toda forma, não deveria estar no Volp, já que, desde sua quarta edição, lançada em 2004, a ABL decidiu que apenas verbetes da norma culta da língua portuguesa seriam listados – antigamente, faziam parte da lista as formas coloquiais ou populares, a famosa “língua falada”.
Após o contato da reportagem, o membro da Comissão de Lexicologia e Lexicografia da ABL Evanildo Bechara surpreendeu-se. “A equipe da Academia tirou as formas populares, mas, por um engano de revisão, ficou a palavra ‘cardaço’”, justificou. “Na quarta edição e principalmente na quinta, tiramos essa visão linguística e adotamos uma visão de registro apenas da língua padrão (ou norma culta). Quando o indivíduo abre o Volp, não é para saber quais são as formas existentes na língua, mas quais formas pode usar na língua padrão”.
Na entrevista concedida no último dia 26, Bechara afirmou ao Terra que ordenaria a retirada dos termos na versão online do Volp. Contudo, quatro dias depois, as versões coloquiais ainda estavam no site. Ao lado de “cardaço”, havia ainda “estrupo”, “menas” e “degote”. Em versões impressas da quinta edição, lá estão as mesmas variações populares: “cardaço” (página 162), “estrupo” (p. 352), “menas” (p. 540) e “degote” (p. 248).
O Volp teve sua primeira edição lançada em 1933, na qual estão registradas deliberadamente as formas “cardaço” e “estrupo”. Desde então, outras quatro edições foram editadas, e, a partir da terceira, em 1999, a publicação foi elaborada pela comissão de lexicografia e lexicologia da ABL.
A professora e linguista da Pontifícia Universidade Católica do Paraná (PUC-PR) Sandra Bozza explica a diferença entre norma culta e língua falada. “Há mais de 30 anos, [os linguistas] não consideram alguns falares errados. É uma perspectiva da língua como objeto vivo, que se constrói a partir do seu uso. Portanto, não podemos dizer que existem falares errados, são variações que não pertencem à norma culta”.
Sem conhecer a decisão da ABL de retirar as variações populares do Volp, a professora elogiava a posição da entidade por reconhecê-las.”O reconhecimento da Academia é uma abertura a essa concepção linguística em que todos os usos da língua são legítimos, porque todos são usados pelo povo brasileiro. É positivo, legítimo e adiantado”.
E se escrever no Enem?
Se você estudou para o Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) pelo Volp, tome cuidado. Para a redação, é considerada a norma culta. A palavra “estrupo” não está de acordo com a norma formal da língua, logo, será considerada incorreta na prova nacional. Uma das competências que o candidato deve desenvolver neste teste, segundo o Guia do Participante, é o domínio da modalidade escrita formal da Língua Portuguesa.
Ao incluir uma palavra que não pertence à norma culta, o candidato não cumpre uma das competências que a avaliação exige. A exceção acontece com palavras transcritas de outros contextos, conforme explica o professor Bechara. “Se em uma redação existe um diálogo entre um homem de pouca cultura e o aluno quiser transcrever na sua originalidade a pronúncia que o homem do povo usou, o professor não deve considerar erro, porque o aluno está colocando a palavra na boca de um personagem de sua história”.
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