Comum na bacia do Rio Amazonas e nas planícies tropicais ao norte da América do Sul, a tracajá parece ter atravessado as morrarias da Serra do Amolar para fazer casa também em . Em registro inédito, pesquisadores encontraram um espécime da tartaruga em um pequeno tributário do Rio João, que liga o São Lourenço ao Rio , em .

A descoberta foi publicada pelo professor da UFRJ ( Federal do Rio de Janeiro) e decano do Museu Nacional da instituição, Ulisses Caramaschi, na última edição da revista Herpetologia Brasileira.

A tracajá, de 13,9 cm de altura por 10,9 cm de largura, foi capturada em fevereiro de 2019, em expedição propiciada pelo Instituto Serra do Amolar. O achado se deu por acaso, após uma puxada de rede que pretendia coletar raízes submersas de plantas aquáticas para estudo. O nível das águas dos rios e das regiões inundadas estava excepcionalmente baixo para o período, segundo indicaram habitantes locais aos pesquisadores.

Em registro inédito, pesquisadores encontram tartaruga da Amazônia na Serra do Amolar
Região de ocorrência da tracajá na América do Sul; estrela marca achado em Corumbá (Foto: Reprodução/HB)

O registro em Corumbá estende a região de ocorrência da tracajá em 850 quilômetros a sudeste do centro da Bolívia, e em 930 quilômetros a sudoeste de Goiás, regiões onde a tartaruga mais havia ido longe até agora.

“Como apenas um espécime foi encontrado e uma vez que está tão longe da conhecida faixa, é possível que não seja uma população nativa natural. No entanto, a região da Serra do Amolar é uma área intocada e preservada, com baixa densidade populacional humana. Os habitantes locais não capturam quelônios. Há um habitat aquático conectando a conhecida distribuição das espécies atualmente e a região do novo registro”, descreveu o pesquisador.

A tartaruga, uma jovem de gênero não identificado, foi levada para o Museu Nacional do Rio. Ulisses Caramaschi sugeriu novas expedições na região para rastrear as possíveis populações de tracajás no Pantanal.

Tracajá na Serra do Amolar alerta para conservação

O ICMBio (Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade) classifica a tracajá como uma espécie quase ameaçada de extinção. O bicho depende de ações de proteção, principalmente nas áreas de reprodução. A instalação de hidrelétricas nas bacias em que ela ocorre também oferecem riscos.

Em registro inédito, pesquisadores encontram tartaruga da Amazônia na Serra do Amolar
Tracajá encontrada em tributário do Rio Paraguai, na Serra do Amolar (Foto: Reprodução/HB)

Ângelo Rabelo, do Instituto Homem Pantaneiro, lembra que a Serra do Amolar marca uma zona de convergência entre o Cerrado boliviano, a Amazônia e o Pantanal. “É comum encontrar animais desses diferentes habitats nessa região”, disse.

Com dois terços esparramados em território sul-mato-grossense, o Pantanal teve, em 2020, seu pior ano desde 1998 em número de queimadas, com 22.116 focos detectados pelo monitoramento do Inpe (Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais). O recorde anterior pertencia a 2005, com 12.536 pontos de incêndios florestais.

Embora anterior ao cenário de devastação, Rabelo vê a descoberta da tracajá no Pantanal como um alerta para a conservação.

“Estamos saindo desse pós-fogo e talvez nunca vamos ter a verdadeira dimensão da perda. Essa descoberta é uma vitória super importante para essa expectativa de proteger a região, que é de alta prioridade para conservação da biodiversidade”, destacou.

Em registro inédito, pesquisadores encontram tartaruga da Amazônia na Serra do Amolar
Serra do Amolar, zona de convergência entre Pantanal, Cerrado e Amazônia (Foto: Divulgação/Glauco Oliveira)